terça-feira, 4 de maio de 2010

A corda e o enforcado

É de longo alcance a decisão de não rever a Lei da Anistia, adotada por 7 a 2 pelos ministros do STF na semana passada.
A derrota da Arguição de Descumprimento de Preceito Constitucional (ADPF 153), proposta pela OAB, trouxe de volta velhos fantasmas, desses que permanecem bloqueando o caminho do Brasil rumo a um acerto de contas mais do que necessário.
Ao consagrar a existência de um suposto pacto, firmado em 1979, entre o regime de então e seus opositores para que a anistia fosse recíproca, a maioria da corte suprema chancelou uma mentira histórica e deu ma enorme contribuição para que o país continue sob risco de repetir as atrociodades do passado.
A anistia foi fruto de um duplo movimento, complexo, mas articulado. Por um lado, o regime fardado tentava dirigir uma transição sob seu controle, lenta, gradual e limitada, que, por exemplo, não levasse à libertação de militantes acusados de "crimes de sangue". Por outro, a oposição, tanto a parlamentar, mas sobretudo aquela que se movia a partir das lutas sociais emergentes (que logo abririam caminho para grandes jornadas de massa, como as do ABC paulista, por exemplo), exigia uma anistia "ampla, geral e irrestrita", isto é, que implicasse na libertação de todos os presos, sem exceção.
Jamais, àquela época, foi explicitado que também a anistia estaria livrando os agentes do Estado que praticaram crimes comuns, como o de estupro, sequestro e assassinato.
Aliás, os militares nem sequer admitiam que tais crimes tivessem sido praticados.
Supor que tenha havido o consentimento das vítimas para que seus algozes fossem também perdoados é uma falsificação somente explicada pelo caráter conservador e positivista que domina o ambiente no topo do Judiciário brasileiro, e não de agora, diga-se.
O voto indignado do ministro Carlos Ayres Britto, vocalizando uma repulsa que extrapola em muito os limites estreitos da Praça dos Três Poderes, deve ficar como um símbolo e um alento. Nem todos, felizmente, resolveram deixar imprimir em suas togas e em suas biografias a nódoa do sangue das vítimas que até hoje, passadas quase cinco décadas do golpe de 64, ainda clamam por Justiça.

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