quarta-feira, 30 de junho de 2010

De joelhos

Agora é para valer.
O diretório estadual do PT bateu o martelo, no final da manhã de hoje, 30, por amplíssima maioria: os cinco vereadores do partido em Belém estão obrigados a votar a favor do projeto da privatização do serviço de águas do município, a nebulosa Parceria Público Privada (PPP) que se tornou uma obsessão do prefeito Duciomar e de seu PTB.
Resta saber qual atitude tomará o vereador Otávio Pinheiro e seus companheiros de bancada que têm recusado dizer amém à imposição da cúpula partidária.

Que andam combinando no breu das tocas

O Ministério Público Federal (MPF) lançou o alerta: se o Congresso aprovar o relatório do neoagronegocista Aldo Rebelo (PCdoB-SP) ferindo de morte o Código Florestal as consequências serão devastadoras. E não se trata de pura retórica. As porteiras estarão escancaradas para um novo e mais violento ciclo de agressão socioambiental, amplificado e sob a cobertura de uma legislação tornada permissiva com o crime.

terça-feira, 29 de junho de 2010

O que está ruim sempre pode piorar

O PT está disposto a cortar na própria carne para quitar a fatura do acordo (re)eleitoral fechado com o PTB de Duciomar Costa. Cortar literalmente, diga-se.
Diante da rebeldia de pelo menos um integrante da bancada municipal que não admite a desmoralização de se ver obrigado a apoiar o projeto de privatização dos serviços de água e esgoto da capital, passou-se a sinalizar a concreta possibilidade de uma solução dramática. Exige-se que a executiva do Diretório de Belém, controlada em sua maioria por setores adversários da DS, tendência da governadora Ana Júlia, se reúna em caráter emergencial nesta manhã de quarta-feira, 30, e aprove o fechamento de questão sobre o tema. Tudo isso como forma de enquadrar estatutariamente o parlamentar insubmisso.
Caso insista na posição - aliás, posição histórica do PT e, imaginava-se, também do governo - o vereador Otávio Pinheiro pode ser expulso da legenda.
O clima na militância e em parte da direção do PT nunca esteve tão carregado.
Para alguns petistas históricos, que preferem o anonimato, o acordo com Duciomar ultrapassou todas as fronteiras. E pior: a fatura mais amarga está sendo transferida para a conta do partido, que passará à opinião pública um enorme recibo de ser parte de uma negociação nebulosa e marcada por fortes indícios de ser contrária ao interesse público.

O céu não é o limite

Até pouco tempo atrás seria uma sandice colocar nas mãos de grupos privados o desenvolvimento e operação de um satélite de uso militar.
Muito menos seria tida como séria uma proposta que dividisse responsabilidades e recursos com uma empresa de capital aberto, formalmente nacional, como é o caso do grupo Oi, controlado pela oligarquia dos Jereissati. De capital aberto, com ações negociadas na bolsa, ninguém pode efetivamente afirmar que lá entre suas múltiplas alianças societárias não estejam presentes tentáculos de grupos estrangeiros, sabe-se lá de que bandeira.
Mas o governo Lula parece não ver qualquer problema nesta aliança. Aliás, o novo satélite estaria entre uma das muitas condicionantes da aquisição da Brasil Telecon pela Oi, negócio bilionário realizado sob o calor do Planalto.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

Assalto ao trem pagador

O último vagão a se atrelar ao reluzente comboio da candidatura de Ana Júlia ao Governo do Estado, trazendo a bordo o PTB de Duciomar Costa, é um caso típico de degradação da política paraense.
Os termos pecuniários do acordo, vazados pela imprensa, revelam uma operação milionária - só da dívida do ICMS sequestrado pelos tucanos durante a gestão de Edmilson Rodrigues (hoje no PSOL), vai a R$ 180 milhões -, mas, evidentemente, tem muito mais.
Já não se faz questão de proteger o público dos detalhes sórdidos. Cargos e orçamentos são abertamente loteados, numa sem-cerimônia que revela apenas a certeza de que, resguardado o quinhão dos diligentes e bem relacionados advogados, tudo vai acabar bem. Para os espertalhões de sempre, é claro.

Jatene diz não ser empregado da Vale

Rompendo o silêncio de meses, o ex-governador Simão Jatene e candidato do PSDB ao governo do Estado declarou à jornalista Rita Soares, do Blog da Repórter, que não é empregado da Vale, desmentindo a acusação, várias vezes repetida, pelo ainda tucano Almir Gabriel.
Fica o registro, enquanto aguarda-se a réplica vociferante de Gabriel em seu estilo de homem-bomba instalado em pleno ninho dos defensores de Serra no Pará.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

A grande patroa

A opinião pública paraense está sob anestesia geral.
Nada, absolutamente nada, consegue abalar a sensação de catatonia reinante.
Vejamos este exemplo:
O ex-governador Almir Gabriel (PSDB) voltou a denunciar que seu ex-aliado, Simão Jatene, após sair do governo em 2006, aderiu de mala e cuia à poderosa mineradora Vale.
E não se tratou de adesão ideológica, essa, com certeza mais antiga e evidente.
Jatene teria passado a integrar a folha de pagamento da mega-empresa na confortável posição de consultor.
Consultor, certamente, muito bem pago.
É curioso que nenhum órgão de imprensa se preocupe em apurar esta notícia.
Será mesmo verdadeira?
Por que não se pergunta diretamente a Jatene?
Por que não se pergunta diretamente à Vale?
Como pessoa pública e, mais ainda, como candidato a governador, Jatene tem obrigação de esclarecer o assunto.
Em sendo verdadeira a informação, por que ele não dá publicidade ao suposto contrato, explicitando qual o objeto do trabalho e os valores recebidos?
O silêncio diante de uma acusação tão grave é quase uma confissão de culpa, uma demonstração de como a política paraense penetrou fundo no abismo da ética de conveniência.

domingo, 20 de junho de 2010

A vida (sempre) é bela

Arrancar humor do horror.
Desvelar a poesia nas coisas mais comezinhas.
Isso é possível?
Sim, é possível, basta cruzar com a genialidade de um Roberto Benigni e seu extraordinário A vida é bela (1997).
Esta aí uma dica para iniciar bem um domingo dedicado a repor energias e preparar o espírito para as batalhas que se avizinham.

sábado, 19 de junho de 2010

Cubo Mágico

Há quem acredite em lobisomem e em mula sem cabeça.
Há, também, os que se apegam a uma longa lista de crendices e superstições.
E, é verdade, são muitos os que têm certeza absoluta que a usina de Belo Monte será - se não for detida pela resistência indígena e popular - uma obra tocada pela chamada iniciativa privada.
Afinal, houve um leilão e sagrou-se vencedor um consórcio de empreiteiros e investidores privados em aliança com fundos de pensão e estatais do setor elétrico.
Mas é justamente aí que a porca torce o rabo.
O governo, direta ou indiretamente, não age como sócio menor do empreendimento.
Muito ao contrário, são os agentes públicos que dão todas as cartas, manipulando a partir de critérios pouco transparentes a modelagem desse negócio de R$ 30 bilhões.
Um detalhe para apimentar o assunto: a escolha de fornecedores, a entrada e saída de sócios, a incorporação dessa ou daquela empreiteira estaria sob o comando de altos dirigentes do governo federal, que agem escondidos trás do biombo de um pretenso consórcio privado.
Cabe, nessa altura do campeonato, lançar uma campanha em busca da desaparecida - e há muito desmoralizada - lei de licitações.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Ana e os lobos

Você pode ser derrotado.
Os inimigos são sempre impiedosos. Passam por cima, abrem feridas nas costas dos vencidos.
De toda forma, após a batalha, mesmo com o corpo sangrando, você pode sentir o gosto de pelo menos ter lutado.
Mas, há outros caminhos.
Sim, há outros e tortuosos caminhos.
Você pode, simplesmente, mudar de lado.
Passar de mala e cuia para a tropa agressora. Trocar de bandeira, virar a casaca.
Aparentemente, agindo dessa maneira, atinge-se o alvo, aprisiona-se a vitória tão esperada.
Pouco importa se o preço seja atirar no lixo décadas de luta, reduzidas a moeda de troca no submundo de uma política que parece desconhecer princípios.
A declaração da governadora Ana Júlia (PT) registrando indignação contra a campanha Carne Legal, movida pelos corajosos membros do Ministério Público Federal (MPF), é de escandalizar.
Para a governadora, falando ontem (17) a uma plateia de ruralistas, o Pará possui um tal "desenvolvimento sustentável" e a carne produzida em nosso território "tem qualidade e respeita o meio ambiente".
Como não é razoável atribuir uma manifestação como essa a simples ignorância, resta apenas uma outra e lamentável hipótese a considerar. Qual seja: a governadora resolveu se alinhar ao lado mais retrógrado e acintosamente anti-popular dos que não conseguem esconder nas digitais a nódoa da enorme responsabilidade pelo desmatamento, pelo trabalho escravo e pela grilagem de terras públicas.
Está na hora - se já não passou o tempo - de dar um basta.
Quem se habilita?


Tanto mar, tanto mar.

José Saramago partiu.
Enquanto dormia, partiu.
Quais teriam sido seus últimos sonhos, enquanto a morte - impiedosa e certeira - preparava seu golpe derradeiro?
Terá sonhado com um mundo livre dos grilhões de toda a maldade?
Terá sonhado com um mundo sem qualquer tipo de cerca e de muro a impedir a completa liberdade humana?
Terá, enfim, sentido o gosto de ter lutado - sem jamais perder a esperança - a boa e justa luta dos que tecem, por caminhos tão diversos, a complexa teia da revolução verdadeira?
Em meio à voragem de mares enlouquecidos, Saramago ainda está lá, firme, íntegro e amoroso a apontar o caminho.
Sua jangada, de pedra, não se deixa naufragar.
A favor dela sopram os ventos da história.
Quem de nós terá a coragem de assumir, com espírito renovado, o timão para prosseguir na eterna viagem em busca da outra margem?



quarta-feira, 16 de junho de 2010

Ao povo, as migalhas

E Lula não decepcionou.
Alguém imaginava que ele iria vetar os 7,7% para os aposentados em pleno ano eleitoral?
Trata-se de migalhas, nada além disso.
O debate acalorado ficou reduzido entre 6,14%, como queria a equipe econômica do governo, e os 7,7% como acabou definindo a maioria dos deputados e senadores, muitos dos quais integrantes convictos da base lulista, mas que não estavam dispostos a marchar para o sacrifício em nome da ortodoxia financeira.
Se a tesoura presidencial tivesse sido acionada, os parlamentares tenderiam a retornar com o reajuste, amplificando o desgaste às vésperas da eleição.
Esse foi o enredo verdadeiro.
O resto obedeceu a um plano para entregar alguns anéis baratos para preservar as jóias da coroa.
Enquanto a mídia se engasgava com esse mosquito, passava goela abaixo o veto naquilo que efetivamente interessava: manter intocado o sacrossanto fator previdenciário, essa garfada extraordinária nos direitos dos trabalhadores brasileiros.
Por trás da cortina de fumaça, Lula ainda pode pousar de "pai dos pobres".
Afinal, o "custo" do reajuste seria de apenas R$ 1,6 bi neste ano. Uma bagatela para quem, por exemplo, não se ruboriza em torrar, em 2009, algo como R$ 147 bi somente de prejuízo do Tesouro em decorrência da política de juros - os maiores do mundo - que o Brasil insiste em praticar para o regalo de um punhado de gulosos especuladores globais.

terça-feira, 15 de junho de 2010

Sob a névoa da guerra

Em quase uma década de invasão, os Estados Unidos e seus aliados já deixaram em solo afegão mais de 1800 soldados mortos.
As vítimas entre a população civil podem ser contadas em dezenas de milhares.
A ocupação militar aliada já se estende por um período superior ao que foi necessário para empurrar para fora daquelas montanhas e desfiladeiros as estropiadas tropas do império soviético em sua fase de quase esclerose.
Apesar de todos os bilhões investidos, esta guerra é um fracasso sob todos os ângulos.
Mas, então, por que ela se prolonga indefinidamente e com esse crescente e imoral custo humano?
Por que não se detém essa guerra que de tão brutal se parece cada vez mais com uma chacina sem sentido?
Mas o sentido existe e agora veio à luz: no Afeganistão, de povo tão pobre e massacrado, repousam enormes jazidas minerais de ferro, cobre, cobalto, nióbio, ouro e lítio, estimadas, por baixo, em US$ 1 trilhão.
É pela posse desse butim extraordinário e não por qualquer outra razão que se alegue, o sangue vai continuar a ser derramado.

domingo, 13 de junho de 2010

Dialética do homem em seu labirinto

"Escancarar as pálpebras e espelhos
recompor a visão
nascer de novo
trazer a mesma face vacilante
da mesma e antiga noite insatisfeita
bem quisera não mais sentir agora
a solidão
o peso dessas horas
de amargo tédio
para sempre cheias
(...)".


Ruy Barata (1920-1990), poeta paraense. Antilogia. Belém: RGB Editora, Secult, 2000, p. 54.


Uma ponte longe demais

Uma greve de fome inusitada.
Petistas históricos se insurgem contra a mão pesada de Lula e da maioria do diretório nacional que acabaram por impor ao PT maranhanse a submissão ao clã Sarney.
Domingos Dutra, deputado federal, e Manoel da Conceição, legendário líder camponês e um dos fundadores do partido, entraram em jejum como forma extrema de protesto.
A rebeldia não terá, infelizmente, maior eco nas fileiras partidárias.
Os grevistas ficarão isolados no gesto de resistência em nome de um programa e de uma bandeira que há muito já perderam o viço.
E a razão é simples: a luta interna no PT por posições mais à esquerda não possui qualquer possibilidade de êxito.
Na melhor das hipóteses essas demonstrações esporádicas de descontentamento servem para revelar a face de um partido transformado em gendarme da ordem ditada de cima para baixo.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Quem quer ser um milionário?

Melhor seria dizer: um bilionário, porque é disso mesmo que se trata.
Muitos bilhões em recursos públicos sendo distribuídos sem a menor cerimônia.
A lei de licitações, essa coleção de letras irremediavelmente mortas, parece que não serve para nada.
Enquanto o país está anestesiado pela Copa, a Eletronorte coordena uma ação entre muy amigos em nome da construção da malfada Belo Monte, essa verdadeira usina de escândalos.

Acelerador de partículas

O processo de rendição programática do PT e de seu líder máximo, Lula, precisou de quase duas décadas para se consolidar.
O marco dessa transição - por cima e à direita, como de resto são quase todas as transições por essas terras - teve na Carta aos Brasileiros, de 2002, seu ponto de inflexão mais visível.
Neste documento, que fez tabula rasa do programa aprovado pela base partidária, estavam consolidados os compromissos com os interesses da banca internacional e com os monopólios daqui e de fora de nossas fronteiras.
A candidatura de Marina Silva, do anêmico PV, não precisou nem de dez meses para fazer o mesmo caminho, radicalizando ainda sua opção pela política econômica vigente, vale dizer, aderindo ao mantra que advoga, como cláusulas pétreas, a salada composta pela política de juros estratosféricos, câmbio livre e de metas de inflação, que vigora desde os idos tempos de FHC.
Aliás, ao se apresentar como herdeira de tucanos e petistas, Marina se desnatura (desculpem o trocadilho algo infame) como candidata capaz de empunhar a bandeira da mudança.
Resta, apenas, a apelação em nome de seu passado de mulher negra e pobre.
Mas desse tipo de embuste o país, se quiser ter futuro, precisa se libertar o quanto antes.

quinta-feira, 10 de junho de 2010

O Código da desonra

Uma imagem que diz tudo: Aldo Rebelo, deputado que se auto-proclama comunista, sendo festejado pelos maiores expoentes da bancada ruralista, no Estadão, de hoje.
Qual a verdadeira razão da troca de afagos e de sorrisos?
Essa estranha aliança, fruto do amálgama do que há de mais rertrógrado na sociedade brasileira, está prestes a mutilar e ferir de morte um dos mais importantes pilares da legislação ambiental vigente nesse dilacerado país.
Se tiverem sucesso, a porteira da destruição socioambiental estará definitiva e tragicamente escancarada.

De barriga quebrada

A banca internacional é insaciável.
Quanto mais recebe, mais quer.
A drenagem de bilhões de dólares e de euros dos tesouros nacionais para aplacar a gula dos banqueiros, em nome da salvação de lucros e dividendos, não tem fim.
Agora, com a crise arrombando a porta de meia Europa, o cálculo do rombo bancário atinge, por baixo, 1,2 trilhão de euros. Uma fortuna, sem dúdiva, que acabará espetada nas costas dos de sempre - trabalhadores, aposentados e imigrantes.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Crime e Castigo

A sentença condenatória do ex-deputado Luiz Sefer (ex-DEM, atualmente filiado ao PP) - 21 anos por estupro de uma criança de 9 anos - vai ficar como exemplo.
Seu significado e repercussão não dependem do tempo - maior ou menor - que os céleres e bem articulados advogados do criminoso condenado gastarão para reverter, em caráter precário, a ordem de prisão que pesa sobre o médico e empresário.
A experiência mostra - à exaustão, diga-se - que posição social e dinheiro - não necessariamente nessa ordem - costumam operar milagres em casos semelhantes.
Não importa. O recado está definitivamente dado.
A lei deve valer para todos. Deve ser proporcional ao agravo praticado e, que ninguém esqueça, no caso específico, esteve permeado da mais cristalina monstruosidade.
As próximas horas vão confirmar se a corajosa decisão da juíza Maria das Graças Alfaia Fonseca significará o início de um novo tempo ou, abatida em pleno voo, restará apenas como um espasmo de retidão e dignidade num mar putrefato de pequenas e grandes covardias.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Casa arrombada, trancas na porta (?).

Até Lula já começa a roçar no assunto, na edição da Folha de São Paulo que está nas bancas.
"Esse é um problema que nós precisamos começar a discutir. Uma coisa é o cidadão vir e comprar uma usina, comprar fábrica. Outra coisa é ele comprar a terra da fábrica, a terra da soja, a terra do minério", afirmou ontem (7), durante o lançamento do Plano Safra, alertando para o fato notório de que estrangeiros têm abocanhado cada dia maiores parcelas do território nacional.
Por enquanto, frases vazias, providência nenhuma.
Quando o país achar que está na hora de fazer algo, seja lá o que for, talvez seja tarde demais. O estrago será irremediável.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Band-Aid em fratura exposta

O Datafolha expõe uma sociedade cindida em torno da necessária punição dos agentes do Estado que cometeram assassinatos e torturas durante o último regime militar (1964-1985).
Não deixa de ser um resultado eloquente diante da intensa campanha de boa parte da mídia a favor da tese do esquecimento e da consagração da impunidade.
Aliás, impunidade que malogradamente acabou reconhecida, por 7 a 2, no STF, dando cor constitucional a uma verdadeira ignomínia.

domingo, 6 de junho de 2010

Dialética do ofício de esculpir palavras

"Quero a experiência de uma falta de construção.
Embora este meu texto seja todo atravessado
de ponta a ponta por um difícil fio condudor -
qual? O do mergulho na matéria da palavra?
O da paixão?"


Clarice Lispector (1920-1977). Água viva. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980. p.27

A segunda morte de Rachel Corrie

A repetição de um crime, tornando-o contumaz, não retira a carga de crueldade que o caracteriza.
Alardear que o sequestro do navio "Rachel Corrie" pela marinha israelense foi realizado "sem violência" é um ultraje, uma deslavada vergonha.
Menos de cinco dias depois de ter patrocinado o massacre de ativistas do Mari Marmara, de bandeira turca, Israel esbofeteia a comunidade internacional em mais uma ação beligerante que somente reforça sua face de Estado fora da lei.
O bloqueio a faixa de Gaza é uma monstruosidade. Uma punição coletiva e um ato de terrorismo de Estado.
Esta é a verdade. Nua e crua.
A frota da Liberdade, cujos primeiros seis barcos foram vítimas do raid israelense no início da semana, deveria ter como nave-capitã o Rachel Corrie, em homenagem a uma jovem mártir de nacionalidade estadunidense.
Com apenas 24 anos ela foi esmagada por uma escaveira do exército de Israel em Rafah, em 16 de março de 2003, quando tentava impedir a demolição de uma casa palestina. Seu crime permanece até hoje impune, símbolo de uma barbárie que parece não ter fim.
Mas a pressão internacional ganhou novo fôlego.
Em toda parte, cresce a consciência de que algo de prático precisa ser feito para barrar o escandaloso processo de extermínio dos palestinos.
As palavras de um antigo provérbio, aliás, não por acaso herança da milenar cultura judaica - "Se não agora, quando?" - deve se tornar a divisa de todos os que não perderam a capacidade de exercitar a indignação diante de qualquer forma de injustiça.

sábado, 5 de junho de 2010

Pardos. São todos pardos.

A política paraense se move nas sombras.
É nos cantos escuros, protegidas pelo véu do silêncio, que as negociações se processam. Aliás, tratos de compra e venda.
Vasta prateleira onde produtos estão à mostra. E à venda.
Siglas e mais siglas, sopa de letrinhas, partidos que não se dão respeito.
Não está em jogo o tamanho de cada um.
Nem todos, evidentemente, valem quanto dizem pesar.
Mas o mercado voraz por tempo de TV e por cabos eleitorais não se detém por nada.
Tudo somado, a vala comum vai ganhando maior profundidade.
Ninguém, mais ninguém mesmo, tem ideia de quando se alcançará o fundo. Nem se chegará.

sexta-feira, 4 de junho de 2010

A escolha de Sofia

Por trás da usina de Belo Monte, essa obsessão do governo Lula, está se jogando o futuro da Amazônia.
Por que insistir tanto numa obra que não se sustenta nem econômica nem socioambientalmente?
Para o pesquisador Célio Bermann, da USP, o governo está apostando na política do fato consumado.
Após Belo Monte, que ninguém se engane, muitas outras virão. E não só no Vale do Xingu mas no Tapajós e em muitos outros rios da região.
A fronteira energética da Amazônia estará, finalmente, ocupada de forma intensiva. Aliás, a palavra-chave é exatamente essa: uso intensivo de energia para assegurar a permanência e a ampliação de plantas industriais sujas como é o caso da indústria do alumínio.

De quebra, ele desmistifica: "A energia hidrelétrica não é limpa, nem barata".
Leia a entrevista completa aqui.

quinta-feira, 3 de junho de 2010

Celeiro de bestas

Uma jovem, gestante de nove meses, brutal e friamente assassinada. Seu corpo arremessado nas água do rio Itacaiúnas, no sudeste do Pará.
Outra mulher, com idade estimada entre 19 e 25 anos, morta com várias facadas, teve seu corpo descoberto na periferia de Belém dentro de uma mala.
Dois exemplos que gritam.
Dois símbolos de que há algo de muito errado.
Mais: algo de doentio e de abjeto vicejando sob o olhar de todos.
A violência contra a mulher, expressão secular do patriarcalismo, é uma chaga aberta.
Os autores materiais de tais atrocidades já estão identificados. Tem rostos e identidades conhecidas, mas não estão sós.
Há, por tais dessas bestas-feras, um contexto que estimula e enaltece a violência e a coisificação extremada da mulher, reduzida a objeto de usufruto e de descarte, quando for o caso.
Há, e quase todo mundo absorve como normal, a excessiva e contundente erotização da figura feminina na propaganda e nos péssimos exemplos de produtos descartáveis da chamada cultura de massa.
Tudo às claras, criando o contexto que enquadra, em franco crescimento e disseminação, cenas de violência dentro e fora do lar, dos assédios tidos como mais inofensivos às cenas mais degradantes da barbárie criminosa.
Já passou da hora da sociedade acordar para essa manifestação doentia. E correr em busca de tratamento profilático antes que a metástase se instale de uma vez por todas.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Por que essa boca tão grande?

A Vale sabe muito bem, quando é de seu interesse, vestir a fantasia de cordeiro.
Ainda mais quando sua gula incontrolável vai semeando desconfianças por aí, em cinco continentes.
Para os chineses, seus principais clientes, a gigante da mineração lançou uma ofensiva de marketing.
Foi na Exposição Mundial de Xangai e Roger Agnelli não poupou elogios ao capitalismo à moda chinesa. "Na China tudo é previsível, o ambiente de negócios é ótimo e a economia de mercado funciona muito bem", disse o chairman de olho na péssima repercussão entre os tecnocratas da China da última arenga pela elevação do preço do ferro.
O difícil vai ser consolidar a pretendida imagem de bom moço enquanto trata de dar aceno com o chapéu alheio. No caso específico, com as milhões de toneladas de minério de ferro que saem, ano após ano, das entranhas do Pará em direção às siderúrgicas chinesas, a preço de banana.
Esse preço aviltado, bem entendido, vale apenas para o povo paraense, que assiste bestificado o dilapidar contínuo de seu enorme, mas finito, patrimônio mineral.

Dialética dos que não conhecem o medo

Para Georgina, em seu aniversário



"Poema

Encharcado de abelhas,
no vento assediado de vazio
vivo como um galho,
e no meio de inimigos sorridentes
minhas mãos tecem a lenda,
criam o mundo esplêndido,
esta vela aberta."


Julio Cortázar. Último Round (Tomo II, Civilização Brasileira, 2008, p.51)


terça-feira, 1 de junho de 2010

Vence na vida quem diz não

Leia com cuidadosamente a declaração a seguir:

"Hoje é dia de desgraça para o Estado de Israel. Dia de ansiedade, em que os israelenses descobrimos que nosso futuro está entregue a um bando de alucinados, todos de armas engatilhadas, atirando sem qualquer senso de responsabilidade. Hoje é dia de desgraça e loucura e estupidez sem limites. Dia em que o governo de Israel enlameou o nome do país ante todo o mundo, juntou mais provas, a comprovar que a imagem de uma Israel brutal, agressiva, não é invenção de propaganda. Hoje Israel dá um passo gigantesco afastando-se dos poucos amigos que nos restam no mundo."

Da boca de quem terá saído este enérgico ataque à política do Estado israelense?
Se você pensou em algum líder árabe do Hamas ou da Fatah pode tirar seu cavalo da chuva.
Quem teve a coragem de colocar o dedo na ferida é um cidadão de Israel, Uri Avnery, 77, veterano da guerra de independência, ex-deputado no Knesset e fundador do Bloco da Paz (Gush Shalom).
Para ler a íntegra, clique aqui.

Segredos de alcova

Não deveria causar surpresa a presença do senador tucano Mário Couto na articulação e no estímulo à candidatura do deputado Domingos Juvenil (PMDB) ao governo do Estado.
Ao suceder Couto no comando da Assembleia Legislativa, Juvenil teria firmado um pacto de não agressão.
A aliança entre os dois nascia como para garantia que a transição seria tranquila - e mais importante - totalmente sob controle, mantendo todos os esqueletos hermeticamente fechados nos armários da impunidade.
Agora, com a sociedade já testada ao longo de quase quatro anos, tratam de pensar no futuro. E em novos e maiores negócios.