quinta-feira, 30 de abril de 2009

Quem será o carbonário?

O repórter pergunta:

- Quem leva a sério o mercado?

O entrevistado, sem papas na língua, responde:

- O Banco Central, por exemplo.
Só o Banco Central. Aquilo é um processo incestuoso. Esse tal mercado controla o Banco Central. O Banco Central não controla coisa alguma. Essa história de que o Banco Central controla as expectativas inflacionárias é o maior blefe que nós temos hoje.

O autor dessa frase, absolutamente insuspeito de possuir relações com a esquerda, pode ter sua identidade descoberta aqui.

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Com a lança de Zumbi

Durante o tumultuado encontro em Genebra, na semana passada, para a revisão dos acordos da Conferência Mundial contra o Racismo (Durban, África do Sul, 2001), a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Quilombolas (Conaq), que representa cerca de 5.000 comunidades de remanescentes de quilombos do Brasil, aproveitou para abrir o verbo e denunciar o travamento do processo de titulação de suas terras, sob forte bombardeio dos ruralistas e empresas mineradoras, num ambiente de evidente retrocesso nas políticas desenvolvidas pelo governo Lula.
No Pará, das 401 comunidades quilombolas apenas 118 estão tituladas e com seus respectivos territórios legalmente reconhecidos pelo Instituto de Terras do Pará (Iterpa). Há, portanto, um largo, tortuoso e difícil caminho a percorrer.

Perigo nos Andes

Brasil e Peru assinam protocolo para viabilizar a construção de seis hidrelétricas em território peruano a um custo estimado em US$ 4 bilhões. O dinheiro viria dos cofres do BNDES para a alegria de empreiteiras e indústrias eletrointensivas.
Um detalhe - e que detalhe - é convenientemente esquecido na matéria de O Globo. Os megaprojetos do presidente direitista Alan Garcia pretendem violar uma região encravada na Amazônia peruana, na qual (ainda) sobrevive um inestimável patrimônio socioambiental. Povos indígenas de diversas etnias, inclusive tribos isoladas, lutam para não serem as próximas vítimas do avanço da fronteira da devastação.

Colheita de corpos

O Pará, mais uma vez, sobe ao primeiro lugar do podium macabro do assassinato de trabalhadores rurais. Contrariando a propaganda falaciosa do governo do Estado, entre 2007 e 2008, o número de trabalhadores rurais mortos em conflitos de terra deu um salto de 5 para 13. Os números constam do último relatório divulgado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT).

terça-feira, 28 de abril de 2009

O bom pastor

Quem, nestes tempos cinzentos, tem a coragem para apontar o dedo e denunciar o lento e cruel etnocídio a que estão submetidos tantos povos indígenas, como no caso dos Guarani Kaiowá , mantidos nos infectos guetos no Mato Grosso do Sul sob o império do agronegócio?
Quem, com a coragem de remar contra a maré do senso comum, mantém viva a crítica à lógica que sustenta o chamado PAC e suas, pelo menos, 48 grandes obras que impactam direta e negativamente as populações indígenas brasileiras?
São poucos, de certo, que estão nessa categoria especial de quem não trafica sob nenhuma hipótese com o decoro e a dignidade inerentes à luta do povo. Entre estes, para orgulho dos paraenses, está Dom Erwin Krautler, bispo do Xingu e presidente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI).
Em seu pronunciamento na reunião anual da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Itaici, São Paulo, cada palavra tem um peso, um significado e encerra uma promessa. Elas não são neutras, nem buscam a impossível conciliação entre os contrários, muito menos entre os antagônicos. Ao contrário: têm lado, tomam partido e escolhem a boa companhia dos que vivem - e sobrevivem penosamente - do suor de seu próprio rosto.
Suas palavras ardem como fogo - ao denunciar a iniquidade das injustiças, mas são bálsamo nas costas em carne viva dos pobres deste país. Que estas palavras honestas e radicais possam seguir germinando. E provocando a justa e imprescindível polêmica.

Um dia a casa cai

O furo da revista Época desta semana, ao denunciar o esquema fraudulento liderado pelo ex-diretor de Recursos Humanos do Senado José Carlos Zoghbi, chama atenção pela desfaçatez de se utilizar uma anciã de 83 anos, ex-babá de sua família, como testa de ferro numa empresa acusada de fraudes de, pelo menos, R$ 3 milhões em contratos suspeitos. É apenas um dos elos da gigantesca cadeia de malfeitorias que, há muito tempo, operava nos corredores daquela vetusta Casa.
Fica, porém, a pergunta sobre a cadeia de comando que permitiu que essas quadrilhas agissem de forma impune e por tanto tempo. Quando e se a investigação for realizada de forma séria e rigorosa, poderão emergir as digitais de gente grande, grandíssima, que coordenava e protegia, de cima, a existência de um milionário vertedouro de recursos públicos.

Em todo caso, as pegadas estão todas aí, fresquinhas, esperando alguém com disposição e coragem para investigá-las.

Bolso furado

Agora não são os ambientalistas que denunciam os malefícios da soja transgênica. A fonte do protesto não poderia ser mais insuspeita: são os próprios produtores rurais do Paraná, um dos mais ricos do país, que amargam grandes prejuízos com a contaminação da lavoura convencional pela poeira de grãos transgênicos. O resultado é a garfada de 2% a titulo de royalties para a onipotente Monsanto e, a piorar, a perda do bônus de R$ 2,00 por saca que o mercado oferece pela variedade tradicional de soja.

Baile sem máscaras

A prisão de dezoito integrantes da Via Campesina, fruto da ação policial realizada à mando da governadora Ana Júlia no amanhecer do último domingo, 26, em Tucuruí, sudeste do Pará, serve de emblema para se aquilatar até onde o PT e seus aliados estão dispostos a ir quando se trata de criminalizar os movimentso sociais. O elenco de crimes nos quais os ativistas estão indiciados - de sabotagem à extorsão e cárcere privado - revela a intenção intimidatória e o furor represssivo que só consegue ter paralelo no tratamento dispensado aos movimentos sociais nos anos mais sombrios do regime militar.
A diferença, visível e incontestável, é que os gendarmes da ditadura não perdiam seu tempo com a propagação incessante da lorota de que as algemas e o tacão de ferro do aparato repressivo estão, em verdade, a serviço de algum insondável projeto "democrático e popular". Eram mais sinceros. Ou menos cínicos.

segunda-feira, 27 de abril de 2009

Com o pé no freio

Compromissos profissionais impedem a atualização do Página Crítica nesta segunda-feira, 27. Amanhã, bem cedo, retornamos à rotina.

sábado, 25 de abril de 2009

Lição de mestre

De Saramago para Obama, sem escalas. Para crer é preciso ler.

Mais do mesmo

Em se tratando de governo Ana Júlia todo cuidado é pouco. Convém não emitir juízo apressado, ao sabor das primeiras informações. A chance de se confirmar o pior presságio é sempre enorme, colocando os otimistas - se é que ainda existem - em posição desconfortável.
Sob cerco do agrobanditismo e da mídia de aluguel, era de se esperar que o governo buscasse se amparar na mobilização social e na denúncia, contundente e bem fundamentada, do processo criminoso de grilagem que assola a terra paraense desde tempos remotos. Certo? Não, infelizmente o caminho escolhido - errático e vacilante - se revela incapaz de compor uma face que nem de longe lembra o que se costuma denominar de popular e de esquerda. Disposto a flanar por sobre interesses abertamente antagônicos, mas repetindo ad nauseam o discurso de não tolerar a ilegalidade e "nem excessos de quem quer que seja", o governo da mal alinhavada aliança PT/PMDB deu, ontem, sinais nítidos de que está muito pouco disposto a contrariar, de verdade, os desejos de quem possui o poder real e efetivo.
Primeiro, a "operação desarmamento", realizada com enorme e injustificável atraso, consegue apreender - pasmem - uma única arma, de fabricação caseira e usada para a caça, num dos muitos acampamentos do MST existentes na PA-150. Sobre o reluzente arsenal à disposição dos capangas a soldo dos prepostos de Daniel Dantas, nenhuma palavra. Decerto, a polícia deverá esperar mais algumas semanas até que algum juiz autorize a busca e apreensão nos limites da propriedade privada, grilada até o último centímetro, como o próprio Estado afirma em ações que se arrastam em instâncias e foros judiciais muito pouco ágeis quando precisa impor algum revés aos ocupantes do andar de cima.
E, segundo, para arrematar, veio esse ridículo indiciamento do coordenador do MST, Charles Trocate, acusado de incitamento à violência. Convenhamos, falta criatividade aos estrategistas da governadora. Essa ideia absurda tem o copyright da senadora Kátia Abreu e de seus asseclas, interessados, eles sim, no aprofundamento de um clima de violência generalizada contra os mais fracos.
Daí que as próximas semanas tendem a ser dramáticas no campo paraense, que felizmente ainda possui movimentos que não trocaram suas rubras bandeiras por reluzentes chapas brancas da cooptação. São essas forças vivas da luta do povo que saberão dar a resposta correta aos seus inimigos de classe e a todos os que, direta ou indiretamente, assumem o triste papel de vassalos de uma ordem iníqua e imoral.

Dialética do batismo de fogo

"Requerimiento

(...)

Se não o fizerdes (converterem-se à fé católica), ou nisto puserdes maliciosamente dilação, certifico-vos que com a ajuda de Deus eu entrarei poderosamente contra vós e vos farei guerra por todas as partes e maneira que puder, e vos sujeitarei ao jugo e obediência da Igreja e de Sua Majestade e tomarei vossas mulheres e filhos e vos farei escravos, e como tais vos venderei, e disporei de vós como Sua Majestade mandar, e tomarei vossos bens e vos farei todos os males e danos que puder...".


Segundo Eduardo Galeano, citando Daniel Vidart (Ideología y realidad de América, Montividéu, 1968), era mais ou menos nestes termos a proclama que os capitães da conquista, lá pelos idos de 1492, deveriam ler para os índios antes de se assenhorar, em nome da cruz e da espada, das magníficas riquezas naturais e humanas do novo mundo que estava nascendo. O anúncio solene era feito, com toda a pompa e circunstância, mas sem intérprete, para nações que jamais tinham ouvido qualquer palavra em espanhol.
Esta preciosa e sempre atual passagem foi incluída na parte 1 (A pobreza do homem como resultado da riqueza da terra) do indispensável best-seller de Galeano, As veias abertas da América Latina, cuja primeira edição data de 1976.
Páginas ácidas e radicais, como a própria vida em tempos cinzentos, podem agora repousar à cabeceira de Barack Obama, após o singelo regalo que recebeu de Hugo Chávez na recente Cúpula das Américas. Chávez, aliás, que afirma ter sido cortés com o colega norte-americano, sem contudo cultivar qualquer tipo de ilusão. Afinal, quem hoje desempenha o papel de senhor do mundo que no passado coube a Fernando de Aragão e Isabel de Castela, não deve possuir nem a mais pálida capacidade de conversão.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

A marcha da insensatez

Alfredo Nascimento, Dilma Rousseff e Lula - não necessariamente nessa ordem - seguem jogando pesado para tornar irreversível a pavimentação da BR-319 (Manaus-Porto Velho). A derrubada, em tempo recorde, de uma liminar que suspendia por 90 dias o processo de audiências públicas, apontado pelos procuradores federais como deficiente e pouco representativo, foi só mais um passo e não será o último. Pouco importa se o que está em jogo é a abertura e ampliação de uma enorme ferida no coração da floresta Amazônica.
A nova estrada, concebida como corredor de exportação para a soja do Centro-Oeste, servirá de alavanca de uma devastação socioambiental sem precedentes. Alguém ainda duvida?

Difíceis, sujos, perigosos e...descartáveis

Virou pesadelo o sonho de ganhar dinheiro no Japão para os mais de 300 mil trabalhadores migrantes brasileiros (dekasseguis). Atraídos por uma política mais flexível de imigração a partir dos anos 90, esses descendentes de japoneses passaram a ocupar os piores empregos, conhecidos por trabalhos três K (kitsui, kitanai, kiken — ou difíceis, sujos e perigosos).
Agora, com a violenta recessão que atinge a economia japonesa, o governo resolveu colocar em ação um plano anti-imigração de claro conteúdo xenófobo. Ao trabalhador e seus familiares são oferecidas vantagens (passagem aérea e US$ 2 mil por cada dependente) para que retornem ao seu país de origem (Brasil e Peru, fundamentalmente), desde que aceitem jamais retornar ao Japão. É uma espécie de degredo perpétuo, extensivo aos descendentes, inclusive.
Já está tardando em demasia uma resposta da chancelaria brasileira, com a altivez e firmeza que o caso requer, para protestar contra essas normas que são uma afronta às normas internacionais de proteção ao trabalho e, de forma flagrante, arrebentam com o princípio do tratamento isonômico que deve prevalecer entre os nacionais de ambos os países.

Causa e efeito

Ano passado, o governo Lula não titulou nenhuma nova área de comunidade remanescente de quilombo. Nenhuma sequer. Ao mesmo tempo, contrariando os interesses dos quilombolas, o do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) editou a Instrução Normativa 49, indrotuzindo mecanismos burocráticos para dificultar o reconhecimento legal dessas comunidades - hoje, no Brasil, são 96 territórios quilombolas e 159 comunidades com terras tituladas.
A cobiça do agronegócio e das mineradoras pelas terras reivindicadas por essas comunidades - pobres entre os mais pobres - está na raiz desse recuo.

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Cavando bem fundo

Familiares de mortos e desaparecidos do Araguaia voltam a tocar num tema delicado: por que o governo Lula insiste em descumprir a sentença judicial que manda o Exército abrir os arquivos da feroz repressão àquele movimento guerrilheiro dos anos 70?

A mãe de todas as batalhas

Enquanto ao povo é servido mais um naco da indigesta sucessão de escândalos na qual o parlamento federal está atolado, passa despercebido o indicador do maior de todos os saques: a formidável dívida pública que não para de crescer e já atinge a assombrosa cifra de R$ 1,398 trilhões.
Essa dívida não é neutra. Se o país perde, só de juros mais de R$ 10 bi no mês passado, alguém embolsou essa fortuna. E não se espere que esses felizes rentistas e especuladores venham espontaneamente mostrar a face. Estão muito bem, obrigado, assistindo o país pegar fogo, enquanto fecham as malas para uma rápida esticada a Nova York. É que a temporada de shows da Brodway está mesmo imperdível.

Com todas as letras

O ministro Joaquim Barbosa, o único negro do Supremo Tribunal Federal (STF), deu nome aos bois. Ou melhor, ao dono deles. Disse que Gilmar Mendes, presidente da mais importante corte de Justiça do país, está destruindo a credibilidade do judiciário brasileiro, e que ele não estava falando com um de seus "capangas" do Mato Grosso. É, de capangas e de vastidões sem-fim onde o latifúndio pontifica sobre gados e gentes Mendes é mesmo um especialista.
Afinal, ele se tornou, por iniciativa própria e em estreita articulação com a oposição demo-tucana, em uma espécie de porta-voz oficioso do que há de mais retrógrado na sociedade brasileira. Já era tempo de receber uma descompostura por um de seus pares. Ao vivo e em cores, para todo mundo ver.

Café pequeno

Descoberto esquema de fraudes na Prefeitura de Belém. O caso é sério, gravíssimo, mas até modesto frente a muitos outros que infestariam a administração municipal.
O esquema criminoso adulterava a planta de valores do IPTU, na Secretaria Municipal de Finanças (Sefin), sangrando os cofres municipais em mais de R$ 2,3 milhões.
Em todo caso, sempre é um começo. Um bom começo que pode abrir a temporada de caça a outras quadrilhas, muito mais especializadas e incrivelmente mais ambiciosas.

quarta-feira, 22 de abril de 2009

Sujeira à flor da pele

A fazenda Espírito Santo, em Xinguara, palco da quase chacina de oito sem-terra no último final de semana, é um dos casos mais notórios da gigantesca grilagem promovida pelo grupo Opportunity, do banqueiro Daniel Dantas, em conluio com aquelas oligarquias nativas que, há décadas, privatizaram extensas áreas do então polígono dos Castanhais. Tanto é assim, que o próprio Poder Judiciário, através da Vara Agrária de Redenção, mandou bloquear as matrículas de todos os seus títulos, ainda em 30 de janeiro passado, nos autos da Ação Civil Pública n. 2008.1.002166-4, na qual o Estado do Pará reivindica para si a legitima propriedade da área.
Apesar disso, os executivos do grileiro posam de gente de bem, enquanto continuam a espalhar o terror através de sua malta de pistoleiros fantasiados de segurança privada.

Bucaneiros high tech

Os fundos financeiros "agressivos" - abutres da alta especulação globalizada - estão voltando. Ou melhor, daqui nunca se afastaram completamente, favorecidos por um ambiente marcado pelas maiores taxas de juros do mundo.
São estes também que, neste momento, buscam refúgio na caderneta de poupança, de olho na isenção fiscal, mas criando uma bela dor de cabeça para o governo. Afinal, é de triste memória o último governo que resolveu tungar os rendimentos desta verdadeira instituição nacional e seus milhões de pequenos poupadores.

Verdades incômodas

O holocausto é uma verdade histórica irrefutável e o Estado de Israel pratica sim, desde 1947, uma política de limpeza étnica contra o povo palestino. Essas duas afirmações são complementares; colocá-las em oposição significa trabalhar contra a causa palestina, e reforçar o ambiente propício à reprodução de novos massacres como o que vitimou os judeus - e não somente eles - nos campos de extermínio erguidos pelos nazistas na Europa dos anos 40.
É por isso que a verborragia do presidente do Irã, Mahmud Ahmadinejad, é um gigantesco tiro no pé. Relativizar o holocausto - ou colocar sua existência em dúvida - apenas revive velhos e surrados preconceitos contra os árabes, como se eles em carne e osso estivessem de alguma forma vinculados às atrocidades de Birkenau e Auschwitz. Não, os horrores inomináveis dos lager na Polônia ocupada foram obra dos europeus e dos dirigentes alemãs em particular, justamente aqueles que julgavam ter alcançado o padrão mais elevado de civilização. Naquele momento, os árabes estavam sob ocupação colonial e assistiam sua luta de libertação ser afogada em sangue por tropas britânicas e francesas, e, sem dúvida, já sofriam na própria pele o terror disseminado pelos grupos armados sionistas do Irgun e do Stern na Palestina histórica.
Não custa, portanto, repetir que o sionismo, apresentado como a ideologia que justifica o massacre da nacionalidade palestina é efetivamente uma forma de racismo e de discriminação racial. E isso já foi afirmado pela ONU desde 1975 (depois, em 1991. revogada já no contexto do mundo unipolar).
Ao mesmo tempo, reverenciar as milhões de vítimas do holocausto (em especial judeus de todas as posições políticas e extrações sociais) é uma obrigação ética e histórica para que não se abra o espaço para a repetição, em pleno século XXI, de tragédias em tudo semelhantes àquelas perpetradas por Hitler e seus carrascos da SS.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Com o rabo preso

O decano Alberto Dines mostra, com todas as letras, que a relação carnal entre a Folha e o Sarney é mesmo um caso perdido.

As mãos invisíveis que manobram os cordéis

Unhas polidas, mãos delicadas, punhos de renda. Quem são as mãos invisíveis que comandam o projeto estratégico do governo Lula?
Uma análise de conjuntura, ácida e sem floreiros, está no comentário do economista e pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Guilherme Delgado.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Acredite se quiser

Os bancos estão com um enorme abacaxi para administrar. Se o Supremo Tribunal Federal (STF) continuar concedendo decisões favoráveis ao pagamento de resíduos referentes aos planos econômicos - Cruzado, Bresser, Verão, Collor I e Collor II - terão de desembolsar nada menos que R$ 180 bilhões.
O argumento que a poderosa Federação Brasileira dos Bancos (Febraban) fez chegar aos ministros do STF é risível, mas revela a mega-operação deflagrada, em todos os níveis e em todos os poderes, para livrar a banca da obrigação de ressarcir milhões de titulares de cadernetas de poupança e de contas de FGTS.
O difícil vai ser encontrar alguém - que não seja dono de banco - que acredite que as instituições financeiras não lucraram nada com os planos econômicos dos anos 80 e 90.

Faça o que eu não faço

O governo Obama se julga no direito de ditar regras à Cuba e a outros países do mundo em matéria de direitos humanos. O que a Casa Branca não consegue explicar é a gritante contradição entre intenção e gesto, afinal esse proselitismo se dá na mesma semana em que a Casa Branca confirma o seu boicote à conferência das Nações Unidas sobre Racismo em Genebra, para não melindrar os falcões que controlam o Estado de Israel, e - suprema vergonha - declara que não irá punir os agentes da CIA envolvidos em crimes de tortura durante a gestão de George W. Bush.

Em paz, só nos cemitérios

Para a governadora Ana Júlia (PT) o Pará vive clima de tranquilidade. O agudo conflito fundiário que a cada dia cobra novas vítimas, como demonstra o choque entre trabalhadores sem terra e pistoleiros em mais uma das muitas fazendas griladas por Daniel Dantas, não se enquadra nesse figurino esfarrado.
A alienação, pura e simples, não costuma ser boa companheira. Serve, quando muito, de matéria-prima para o bombardeio do marketing, mas não consegue ocultar o som, dramático e sangrento, dos disparos com munição real.

domingo, 19 de abril de 2009

Fora daqui (de dentro) com o FMI

César Benjamin, brilhante como sempre, decifra a esfinge do FMI, para demonstrar que, ao contrário do que sugere um determinado tipo de mistificação muito em voga, este tentáculo do poder do grandíssimo capital não está tão ultrapassado como pode parecer.

Recordar para lutar

19 de abril. Um dia dedicado ao índio americano. Dia de festa e de comemorações demagógicas, para alguns. Dia de manter viva a chama da vida das gerações chacinadas nos 500 anos de invasão, para os povos indígenas de nossa América e para os que com eles estão irmanados em solidariedade ativa.
Mais que isso: um dia para renovar, no fundo peito, a permanência, nos dias cinzentos que correm, da disposição de continuar caminhando em busca de uma terra sem males, que se desenha, como utopia, na dobra do firmamento.
Quais os principais dilemas da luta indígena hoje no Brasil? Como os povos originários tomam para si a tarefa organizar a resistência?

Crise e oportunidade

A Vale acaba de anunciar que atrasará em um ano o início da operação de sua planta de níquel - a Onça Puma - em Ourilândia do Norte, sudeste do Pará, prevendo agora o início efetivo dos trabalhos para janeiro de 2011.
Na justificativa do atraso a mineradora joga a culpa no suposto atraso na liberação do licenciamento ambiental, esquecendo de ressaltar que o desaquecimento da demanda mundial pelo produto é, sem dúvida, a principal pedra no caminho do projeto.
Minas no Canadá, localizadas em Ontário, também estão paralisadas.
Quem sabe se este tempo não pode servir para que o governo brasileiro intervenha no enclave da Vale e, finalmente, apure a ocorrência das diversas denúncias de grilagem da empresa sobre terras de pequenos agricultores.

sábado, 18 de abril de 2009

Dialética da entranhada violência na Terra Brasilis

"(...)

A Santa Inquisição tem um agente neste lugar que com a assistência do bispo e dos monges beneditinos agarra todos os suspeitos de judaísmo e hereges, formam seus processos e mandam seus corpos a Lisboa para serem queimados, suas almas para o Demônio e suas propriedades para a abençoada irmandade. Sorte que a maior parte desses criminosos são do tipo próspero.
Neste momento, mas de setenta pessoas de ambos os sexos e de todas as idades estão prontas para serem remetidas."


Joseph Collet, súdito do Império Britânico, em carta à East India Co., relatando sua estadia no Rio de Janeiro, em meados de 1711.

Citado por Alberto Dines. Vínculos do Fogo (Antônio José da Silva, o Judeu, e outras histórias da Inquisição em Portugal e no Brasil), p. 671.

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Sinais trocados

As vítimas, sob sete palmos, são as grandes culpadas por seu próprio martírio. A reforma agrária patina numa poça de sangue, mas são os sem terra os verdadeiros artífices do caos. O campo no Pará é uma praça de guerra - única assertiva com algum grau de verossimilhança - e novos conflitos armados estão prestes a explodir.
As afirmações que abrem este texto podem ser deduzidas da cobertura da grande imprensa paraense de hoje, marcada por um tipo de preconceito ideológico rasteiro e indecoroso.
Ao repercutir o factóide criado por uma comissão da Câmara de Deputados, controlada por um setor hardcore da bancada ruralista, erra de forma flagrante ao atribuir equilíbrio de forças entre as "partes" que se digladiam. Existe um único exército bem armado e este está a soldo dos fazendeiros, que ainda contam, quando se torna indispensável, com o apoio do aparato estatal para proteger seu sacrossanto direito a uma propriedade antagônica a qualquer função social.
Num 17 de abril, 13 anos após o massacre impune de Eldorado dos Carajás, serve para ninguém esquecer que as raízes mais profundas daquela tragédia permanecem mais vivas, atuantes e agressivas do que nunca.

Tambores de guerra

O Ministério das Minas e Energia trombeteia que até o final do ano a hidrelétrica de Belo Monte será licitada, mesmo sem contar ainda com o licenciamento ambiental do Ibama. Mero detalhe e questão de tempo, tendo em conta que o ministro Carlos Minc é desses que ladra muito, mas morde muito pouco.
Só que a construção da polêmica usina não depende apenas da vontade dos governantes e da avidez das empreiteiras, tendo à frente uma dupla do barulho, Carmargo Corrêa e Andrade Gutierrez; depende, também, da consulta às comunidades que serão atingidas pelos enormes impactos socioambientais, especialmente indígenas e ribeirinhos. Sem esquecer que o Ministério Público Federal e o Tribunal de Contas da União estão de olho aberto para as transações suspeitas que envolvem essa obra bilionária.
E é aí que o plano dos barrageiros pode fazer água, literalmente.

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Desprestígio federal

Apesar do ostensivo lobby contrário da governadora Ana Julia (PT), que não economizou viagens a Brasília nem conversas no pé-de-ouvido da toda-poderosa Dilma Rousseff, amanheceu hoje nas páginas do Diário Oficial da União o ato que formaliza o economista Carlos Guedes como coordenador do processo de regularização fundiária de terras ocupadas na Amazônia Legal.

Eles sabem o que fazem

É intensa a reação dos movimentos ambientalistas ao habeas corpus para devastação que o PT e sua base na Câmara dos Deputados introduziram na MP 452/2008, numa sessão que ficará na história como um dos momentos mais desastrosos na longa guerra contra a legislação ambiental brasileira.
A reação do Greenpeace alveja a mãe do PAC, relacionando a medida com a pavimentação da estrada que pretende levar Dilma Rousseff ao Planalto no próximo ano. E uma frente de entidades verdes registra que, se confirmado pelo Senado, o rito sumário na aprovação ambiental de obras de pavimentação e duplicação de rodovias - 40% das 140 previstas pelo PAC - , como no caso da polêmica BR- 319 (Manaus-Porto Velho), será uma tragédia de enormes proporções.

Alta rotatividade

Metade dos empregos formais no Brasil duram menos de 24 meses. É o que atesta um recente pesquisa do sociólogo e mestre em Sociologia pela Universidade de Brasília, Roberto Gonzalez. Os dados, é claro, refletem uma situação anterior à crise, o que revela a profundidade e a extensão da instabilidade do emprego no Brasil e, por outro lado, desmoraliza o argumento patronal do peso excessivo dos encargos na hora de demitir.

Agente 86

Em cada acampamento do MST, em cada fazenda ocupada nas intangíveis lonjuras do império de Daniel Dantas, já é fácil notar a indefectível presença de agentes policiais infiltrados. São policiais da P2, agentes da PF, espiões lotados na ABIN e, quem sabe, outros terceirizados, com a tarefa comum de bisbilhotar os rumos dos movimentos sociais. Tentam, em vão, é verdade, passar despercebidos, fantasiados de sem terra, maltrapilhos e com olhar desnutrido. Sem dúvida não são mestres em disfarce.

A emergência na calamidade

Talvez não faça qualquer diferença às centenas de pessoas que padecem de fome, sede e desabrigo na Altamira devastada que a situação do município seja declarada de "emergência" ou de "calamidade".
O fato é que a demora no atendimento às vítimas foi excessiva, escandalosa.
Esse é o ponto fundamental, muito embora, nas sombras, movimentem-se os interesses de sempre, ávidos pelo lucro fácil - político, financeiro, eleitoral, pouco importa - em meio à tragédia que se abateu sobre tantas famílias.

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Golpe de Mestre

O governo Duciomar Costa (PTB), volta e meia, está envolvido em negócios nebulosos. Escondido em um cantinho da página 4 do caderno Poder de O Liberal de ontem, 13, a Prefeitura mandou publicar, em letras microscópicas, um ofício dirigido à KPMG Structured Finance SA, através do qual "outorga autorização para realizar o Estudo Preliminar de Viabilidade" do "modelo de concessão comum ou de parceria público-privada, para a modernização e ampliação dos serviços de água e coleta de esgoto do município de Belém".
Os tais estudos, esclarece o ofício assinado pelo próprio prefeito, não custará nada para o município, mas "terão seus custos reembolsados pelo licitante vencedor". Bingo! As peças se encaixam para revelar mais uma daquelas operações onde mãos invisíveis atuam para favorecer uma meia dúzia de espertos.Trocando em miúdos: orquestra-se, à vista de todos, a privatização de um dos serviços públicos mais essenciais à vida e à saúde da população.
Como se estivessem certos da impunidade, não se importam em deixar pelo caminho uma fornida coleção de indícios de que nessa jogada tudo já nasce viciado.
Resta saber se haverá alguém - com poder e prerrogativa legal - disposto a enfiar a mão nesta cumbuca.

Contrabando devastador

Com todas as digitais do presidente Lula e da czarina Dilma Rousseff , a Câmara dos Deputados acaba de aprovar um duro golpe na legislação ambiental brasileira. Enfiada como contrabando no texto de uma MP que tratava do Fundo Soberano, o Executivo arrancou a autorização para tocar obras de construção ou reforma de obras rodoviárias sem a exigência de licenciamento prévio por parte do Ibama, bastando tão somente que façam parte do PAC. Nesse balaio, é claro, estão incluídas obras do porte do asfaltamento da BR-163 (Santarém-Cuiabá) e a abertura da polêmica BR-319 (Santarém-Porto Velho), vetores exponenciais de devastação da floresta Amazônica.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Rompendo trevas

O Plano Decenal de Expansão de Energia (2008-2017) do governo Lula é auto-explicável. Está aferrado à tarefa de manter e ampliar um modelo excludente e voltado a transferir as riquezas nacionais, a preços baixos e sob condições desvantajosas, para os centros neocoloniais.
As críticas, portanto, que este plano recebe à esquerda, são igualmente claras. Elas guardam coerência com a busca de um modelo alternativo capaz de romper com as amarras desse sistema onde potificam os interesses das grandes corporações e seu alegre mundo de mega-empreiteiras e insaciáveis oligopólios da indústria eletrointensiva.
Mas as armas do conhecimento e da crítica podem ser tornar um perigo quando sejam apropriadas pelas multidões que pagam, em última instância, o terrível preço pelas escolhas dos que manejam os cordões, do alto e, na maior parte das vezes, de fora.

Contracorrente

A grande mídia alinhada aos interesses estadunidenses dissemina seu lixo tóxico por todos os cantos do mundo ao anunciar uma suposta boa nova: Barack Obama, em um gesto majestático, estaria estendendo a mão ao povo cubano. Sua intenção, sem data para ser concretizada, de levantar de forma unilateral várias das medidas que compõe o odioso bloqueio àquela pequena nação caribenha há quase 50 anos, é saudada como a demonstração da vitalidade da democracia dos monopólios.
Jogada de marketing às vésperas da Cúpula das Américas, esconde muito mais do que revela acerca das verdadeiras intenções do império, servindo de plataforma para mais uma onda de ataques ao povo cubano. Felizmente, remando contra a maré do senso comum, ergue-se uma voz com autoridade para produzir uma
resposta à altura e colocar os pingos nos is.

A lógica da máfia

Não surpreende a recente ofensiva jurídica da famiglia Sefer contra o Quinta Emenda. É apenas a confirmação de que estamos ainda muito distantes do último capítulo desta história de crime e de terror.
A imposição do silêncio não se resume a uma simples estratégia de intimidação. Vai além e mais profundo. Trata de sinalizar para o que pode ainda vir - e virá, cedo ou tarde - na forma de outras violências, abertas ou dissimuladas.
Reagir a este ataque à liberdade de expressão é um ato de resistência tão vital como aquele que impulsiona o ser humano a continuar respirando e pensando, sem se deixar brutalizar por esta profusão de sicários cujas mãos são tão sujas quanto o dinheiro que as sustentam.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Dessa vez, não

Vejam que problemão: um político muito conhecido, atualmente ancorado numa das mais cobiçadas prefeituras paraenses, passou por uma situação constrangedora, no término do expediente de uma sexta-feira, diante de um gerente de banco, numa bem freqüentada agência da área nobre da capital. É que ele recebeu um sonoro não à sua proposta de que o banco fizesse o favor de guardar, sem os devidos registros contábeis, a quantia de R$ 5 milhões que tinha na pasta. É que ainda seriam necessários alguns dias para que a pequena (?) fortuna fosse convenientemente convertida em alguma moeda forte - dólar ou euro – para que seguisse o caminho da segurança de um paraíso fiscal qualquer.
Temeroso de que a operação - atípica para dizer o mínimo - pudesse ser descoberta, o até então prestimoso gerente não teve como tirar seu amigo do aperto.
As fontes do blog ainda não descobriram se a dinheirama migrou para outro banco ou se forrou, durante todo um final de semana, o colchão do tal político multimilionário.

Via Dolorosa

Belém mais pobre, patrimônio secular em pedaços. O desabamento da fachada de um dos casarões da ladeira do Castelo, no coração do centro histórico, compõe o rosário das notícias amargas do final de semana.
Pouco a pouco, como um câncer, vai avançando a destruição que não se detém por nada. Culpar o clima, com as fortes chuvas dos últimos meses, ou a incúria dos moradores, aliás uma família de 30 integrantes, de baixíssimos recursos, é malhar em ferro frio. O descaso oficial e o estato catatônico em que a sociedade está submetida são explicações bem mais plausíveis, porém que estão longe de atenuar a dor de quem vê, manietado, a feroz degradação que transforma em pó o que simplesmente não tem preço.

Desigual e combinado

Altíssimo uso de inovações tecnológicas convivendo, lado a lado, com com a brutal exploração da mão-de-obra, reduzida não raro à escravidão contemporânea, num contexto de permanência e reprodução de padrões indecentes de concentração da propriedade fundiária. Estas são algumas das características apontadas por um estudo que traçou o perfil da situação da terra no Brasil. Mais detalhes do Atlas da Questão Agrária Brasileira, tese de doutorado do geógrafo Eduardo Girardi, elaborada no Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária (Nera), da Universidade Estadual Paulista (Unesp), na edição de hoje do Estadão.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

Em boa companhia

Que tal um mergulho prolongado no oceano que nos legou Antônio Vieira? Nossa Pátria, nossa língua, a aventura inesgotável que só a leitura é capaz de proporcionar.
Nesses dias de feriado de Páscoa, façamos como José Saramago, um eterno navegante pelas muitas vezes turbulentas águas do grande rio da língua portuguesa.
Este espaço, pois, entra em recesso até a próxima segunda-feira, 13. Que as águas de "uma língua cheia de sabor e de ritmo" sirvam de alimento e de bálsamo para o corpo e para a alma de todos que aceitem o risco desse salto no imponderável.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Balão furado

Dissolveu em pleno ar o último balão de ensaio do governo Lula para reduzir direitos trabalhistas em plena crise econômica. A proposta, abortada ontem em reunião presidencial com os líderes das centrais sindicais, vinha emoldurada numa causa nobre: criar as condições para que as empresas parassem de demitir tendo em troca uma redução temporária dos encargos trabalhistas, com destaque para o corte do FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço).
Diante da grita geral, Lula mandou arquivar a ideia, determinando ao ministro Guido Mantega (Fazenda) que busque outras alternativas. O que se espera é que as novas sugestões não venham maculadas pelo pecado original de sempre: transferir o maior ônus da crise para os trabalhadores, que jamais são lembrados nos banquetes dos tempos de bonança, mas não escapam na hora de pagar a conta.

Araguaia, Araguaia: quem chora por ti?

Até quando o Estado brasileiro vai seguir compactuando com os crimes de guerra cometidos durante o regime militar? Quantas condenações internacionais serão necessárias para que venha à luz, de uma vez por todas, essa parte necrosada da longa noite de terror instalada pelos golpistas de 64?
A decisão história da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), órgão ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos), de abrir processo contra o Brasil pelos crimes de detenção arbitrária, tortura e desaparecimento forçado cometidos pelos militares no início da década de 70 contra dezenas de militantes do PCdoB e camponeses durante a feroz repressão à Guerrilha do Araguaia, deve ser encarada como uma oportunidade que não deve ser desperdiçada.
Mas, diante do histórico de pusilanimidade do governo Lula, poucos ainda devem crer em uma mudança de rumos. Para estar à altura desse desafio é preciso coragem e altivez, artigos que parecem estar em falta no Palácio do Planalto.

quarta-feira, 8 de abril de 2009

A arte de furtar

Bancos estrangeiros praticam no Brasil taxas inacreditavelmente maiores do que aquelas de seus países-sedes, beneficiando-se das condições de lucratividade máxima que lhes são asseguradas pelo Banco Central sob as bênçãos do governo Lula. O levantamento do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) traz os números do escândalo.

Reductio ad absurdum

O longo périplo turístico de 15 dias - bancado pelos cofres públicos - que prefeito Duciomar está fazendo pela Europa e Estados Unidos já seria um escárnio frente ao caos no qual a capital está mergulhada, se não houvesse um detalhe intrigante na justificativa utilizada pela Câmara Municipal ao aprovar a regalia. Sem ter mais o que argumentar, os vereadores governistas alegaram que a extensão do passeio até Washington se justificava pela necessidade do prefeito abrir uma conta bancária para receber, em solo estadunidense, os repasses do empréstimo do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), promessa que vem sendo ressuscitada há anos a fio, sem qualquer resultado prático até agora.
Ora, nunca na história deste país chegado a absurdos se ouviu falar numa bobagem desse quilate. O fato da existência da operação de crédito com o BID - premissa verdadeira - não obriga o mandatário municipal gastar uma pequena fortuna apenas para assinar um suposto cartão de autógrafo em território estrangeiro - conclusão despropositada.

Mais ainda: é uma agressão à lógica e uma cusparada sobre a face de uma cidadania reduzida à condição de indigência político-eleitoral.

O mundo de ponta cabeça

Os pobres da Terra financiam o luxo e o desperdício da minoria próspera. Até aí, alguma novidade? Mas nem por isso deixa de escandalizar saber que, entre 1980 e 2000, os países do chamado Terceiro Mundo pagaram a título da dívida e(x)terna a fábula de 3,45 trilhões dde dólares, ou, se preferirem, o equivalente a 43 Planos Marshall, pacote de empréstimos que os Estados Unidos concederam aos 16 países da Europa e que foi responsável pela reconstrução do velho continente destroçado pelo horror da II Grande Guerra.

terça-feira, 7 de abril de 2009

O costume que entorta a boca

Um chefe de Estado que faz uma visita surpresa a uma nação soberana? Isso, evidentemente, não existe. Mas é o que Obama acaba de fazer no Iraque ocupado, repetindo os péssimos passos de seu antecessor na Casa Branca.
Não demora muito para que sapatos voadores comecem a mirar seu rosto de bom rapaz. Quem viver, verá.

Aposta muita arriscada

A renúncia do deputado Luiz Sefer (eleito pelo DEM e atualmente afastado da legenda) não chegou a ser uma surpresa. Há semanas que o chão esfarelou sob seus pés e já perdera completamente as esperanças de convencer seus pares de sua alegada inocência do crime de abuso sexual contra uma menina, hoje com 13 anos, mas abusada sistematicamente desde os nove.
Ao renunciar, Sefer sabe que está assinando uma confissão de culpa, mas aposta numa dupla possibilidade de se safar. Primeiro, que a Justiça pode ser tanto mais lenta quanto mais eficiente seu batalhão de criminalistas mobilizados a peso de ouro para lançar mão de todos os recursos postergatórios que a legislação faculte. E, segundo, que no próximo ano uma parcela do eleitorado, mais afeita aos impactos do clientelismo e da manipulação eleitoral no sentido estrito, vá reconduzi-lo a uma cadeira na Assembleia Legislativa.
Um aposta muito arriscada, arriscadíssima.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

Aprendiz de feiticeiro

E o prefeito Duciomar saiu novamente de cena. Ocupou o centro do palco, nos últimos dias, o novo secretário municipal de saúde, o médico e vereador Antônio Vinagre, cujas entrevistas tem sido um primor de generalidades e de promessas que não se sustentam de pé. Falta-lhe o atributo básico para a missão: legitimidade. Ora, o secretário é do mesmo partido do prefeito e integra sua base de apoio na Câmara. Nesta condição, foi um dos coveiros da CPI da Saúde, em um dos mais lamentáveis episódios de sabujice política de que se têm notícias nos últimos tempos na capital.
Mas, sempre haverá algum repórter para brindá-lo com uma lista de perguntas que de tão ingênuas soam ridículas, como aquelas que embalaram a matéria "Novo secretário vai buscar parcerias", publicada na edição de ontem, 5, em O Liberal.

Suprema humildade

O ministro Carlos Ayres Britto, a cada dia que passa, vai se agigantando como a principal voz em defesa da Constituição e dos direitos do povo no Supremo Tribunal Federal (STF). Sua estatura ganha maior dimensão se comparada com a de alguns de seus colegas, pródigos tanto em arrogância quanto em um patológico desprezo frente aos sofrimentos e anseios daqueles que já perderam quase tudo, mas seguem palmilhando o agreste caminho da resistência cidadã.
O voto histórico que ele proferiu na condição de relator do processo de demarcação em terras contínuas da Reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima, foi um divisor de águas em meio à aguda polarização social que essa questão tem provocado no país. E é com o coração aberto e despido de quaisquer preconceitos que sergipano revela ao Correio Braziliense o muito que pode aprender em meio a essa batalha pelos direitos indígenas que ainda está bem longe do fim.

Guilhotina afiada

A indústria paulista dá sinais de que o pior da crise ainda está onge de ter passado. A conta, como sempre, será pendurada nas costas dos empregados. Pesquisa da Fiesp aponta que dois de cada cinco empresários de São Paulo pretendem demitir nos próximos meses, o que prova que o discurso otimista do governo não enche a barriga de ninguém.

sábado, 4 de abril de 2009

Dialética dos que acreditam no porvir

E do amor gritou-se o escândalo
Do medo criou-se o trágico
No rosto pintou-se o pálido
E não rolou uma lágrima
Nem uma lástima para socorrer
E na gente deu o hábito
De caminhar entre as trevas
De murmurar entre as pregas
De tirar leite das pedras
De ver o tempo correr
Mas sob o sono dos séculos
Amanheceu o espetáculo
Como uma chuva de pétalas
Como se o céu vendo as penas
Morresse de pena
E chovesse o perdão
E a prudência dos sábios
Nem ousou conter nos lábios
O sorriso e a paixão
Pois transbordando de flores
A calma dos lagos zangou-se
A rosa-dos-ventos danou-se
O leito do rio fartou-se
E inundou de água doce
A amargura do mar
Numa enchente amazônica
Numa explosão atlântica
A multidão vendo em pânico
A multidão vendo atônita
Ainda que tarde o seu despertar


Chico Buarque. "Rosa-dos-Ventos" (imortalizada na voz de Maria Bethânia).

Caçadores de índios

Após o revés no STF que reconheceu, após longa e penosa disputa, que as Terras Indígenas devem ser demarcadas de forma contínua, os modernos caçadores de índios com assento no Congresso Nacional dão novo impulso à sua guerra imoral e injusta contra os povos originários. Querem retirar do Executivo a prerrogativa de demarcar as áreas de reservas, apostando no controle que as bancadas conservadoras julgam possuir na Câmara e no Senado.
Quase ao mesmo tempo em que o ex-presidente da Câmara, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) joga a história de seu partido no lixo ao patrocinar um projeto claramente inconstitucional e abertamente contrário aos direitos indígenas, no Senado são retomadas as manobras lideradas pelo capitão do mato Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR), um dos mais raivosos inimigos da integridade da Reserva Raposa Serra do Sol, que lança mão de sua antiga proposta - a PEC 38/99 -, contando com um parecer favorável do senador Valter Pereira (PMDB-MS), ativo integrante da sempre belicosa bancada ruralista.
Diante do risco iminente de que a proposta seja votada já na próxima semana diversas organizações ambientalistas e de defesa da causa indígena iniciaram uma mobilização nacional. Veja mais detalhes no site do Instituto Socioambiental.

sexta-feira, 3 de abril de 2009

Sem plumas nem paetês

Rompendo o cerco ao discurso laudatório que a grande mídia imprimiu à cobertura da última reunião do G20, onde o figurino da primeira dama dos Estados Unidos teve maior espaço que as vigorosas manifestações de rua em Londres, surge uma excelente análise de e pela esquerda. Com a palavra, Eric Tousssaint e Damien Millet, pesquisadores do CADTM Bélgica (Comitê para a Anulação da Dívida do Terceiro Mundo, www.cadtm.org).

É só o começo

A saúde de Belém amanheceu sob intervenção federal. É um alento em meio a um quadro que desde muito atingiu níveis inaceitáveis de degradação. Ocorre como culminância de um processo de desrespeito sistemático à Justiça, que se arrastou por anos a fio e era emblema de impunidade e de desprezo diante do sofrimento humano.
Mais importante que a histórica sentença do juiz Antônio Campelo, titular da 5a Vara da Justiça Federal no Pará, serão seus desdobramentos práticos e sua capacidade de impor um novo padrão de enfrentamento daqueles que insistem em fazer da transgressão, da burla desavergonhada e da malandragem oficial suas marcas distintivas.

Piada sem graça

Desta vez Lula se superou. Fazer blague com o suposto empréstimo do Brasil ao FMI - "Você não acha chique o Brasil emprestar dinheiro para o FMI? Não é uma coisa soberana?", declarou embevecido e com um sorriso que não cabia na face.
Não, presidente, soberania é outra coisa muito diferente. Se ocorrer, porque ainda não possui sequer a definição técnica de como esse aporte poderia ser feito, a transferência de recursos para o FMI será mais uma jogada de marketing, um truque que simula tirar coelhos de uma cartola furada.
Afinal, o Brasil continua mais endividado e dependente do que nunca. Mas sempre há incautos para cair nesse tipo de manipulação grosseira, enquanto o povo a tudo assiste como num transe hipnótico.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

Todo pecado será castigado?

Emerge da algaravia gerada pela Operação Castelo de Areia um dado que por si só deveria polarizar o noticiário, mas, ao contrário, está sendo tratado como um indício banal: o propinoduto da Camargo Corrêa, que pode envolver R$ 500 milhões em transações ilegais, tinha um tentáculo no Tribunal de Contas da União (TCU), paraíso de políticos em fim de carreira. Como se sabe, ter feito carreira em uma das legendas mais à direita no espectro político nacional é uma espécie de pré-requisito para a maioria dos ministros desse poderoso órgão fiscalizador.
A pontinha do iceberg aqui e aqui.

Conexão Internacional

Do outro lado do Atlântico, no velho continente, vem a notícia-bomba que pode implodir, de uma vez por todas, a cada vez mais esfarrapada alegação de inocência de um dos mais ilustres investigados pela CPI da Pedofilia da Assembléia Legislativa.
A PF, especialista na investigação do crime de tráfico de seres humanos, já está no caso.

Por trás da queda

Teria partido do Palácio dos Despachos - dizem da própria governadora Ana Júlia (PT) - o empurrão definitivo que levou ao chão a secretária municipal de saúde de Belém, Rejane Jatene, irmã do ex-governador tucano, Simão Jatene.
A cabeça da ex-secretária teria sido pedida como pré-condição para que Duciomar pudesse receber uma mãozinha providencial do o governo do Estado em meio ao caos da saúde.
Subjacente ao toma lá, dá cá as sempre renovadas esperanças de um acerto eleitoral em 2010, muito embora esteja próximo de zero o índice de credibilidade dos interlocutores envolvidos na costura desse esquisito e heterogêneo palanque.

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Baile da Saudade

Alguns dos 200 militares que se reuniram para homenagear, com flores e placas comemorativas, a passagem dos 45 anos do golpe de 64 ainda envergam fardas e comandam tropas, tanques e mísseis. Estão na ativa e supostamente obedecem à hierarquia e à disciplina sob os mandamentos da Constituição. Entre eles, escândalo dentro do escândalo, o general Rui Catão, chefe do Comando Militar do Leste, o mais importante do país.
A presença do general da ativa é um ato simbólico. Confere um ar de sedição e de conspirata à cerimônia que, em tese, poderia até ser vista como um deleite, perverso e indigno é verdade, mas ainda assim uma espécie de tertúlia animada por um grupo de saudosos tiranetes aposentados. A maioria deles enverga lustrosos pijamas e, quando muito, impõem seu rigor militar às enfadonhas assembléias de condôminos de Copacabana.
Mas que ninguém se iluda: carregam sim, sem disfarces, o germe do fascismo e chocam, à vista de todos, o medonho ovo de serpente que tantas vezes já deixou sua marca cruel nas lanhadas costas do povo brasileiro.