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sábado, 31 de maio de 2008
Lomba gigante
O acordo assinado pela governadora com a Intersindical, no início da noite de ontem, não tem nada a ver com Sintepp, que representa os professores e servidores das escolas estaduais e, portanto, não encerra a paralisação que já ultrapassou os 36 dias.
Põe na conta
Foi a quarta renegociação das dívidas do setor rural brasileiro 12 anos e a maior de toda a história. Um presente autorizado pelo governo Lula, estimado em R$ 9 bilhões, beneficiando como sempre, os grandes fazendeiros e empresários do agronegócio. Dos R$ 76 bilhões renegociados, nada menos de R$ 66 bilhões pertencem a produtores empresariais, acostumados a dar calotes seguidos nos bancos públicos, acreditando que não demora o governo - qualquer governo, diga-se - vai abrir os cofres e assimilar o prejuízo.
Para dourar um pouco a pílula, desta vez foram também incluídos na boquinha cerca de 1,8 milhão de agricultores familiares e assentados da reforma agrária. Porém, as dívidas dos pequenos não ultrapassam R$ 10 bilhões, comprovando que a dinheirama vai mesmo irrigar a lavoura de 400 mil grandes e médios proprietários que, como era de se esperar, ainda acharam tímido o pacote. Querem muito mais e estão dispostos a usar o poder de fogo da bancada ruralista, espécie de jagunços de paletó, gravata e senha no painel eletrônico.
Um carrasco no banco dos réus
sexta-feira, 30 de maio de 2008
Na geral, em clima de vale tudo
Sob o olhar irritado do presidente Lula, que a tudo assistiu sem ter o que fazer, as claques organizadas pelo PT e PTB se estranharam bastante durante os discursos que marcaram a assinatura de convênios para as obras do PAC, no final da manhã de hoje, no Hangar, em Belém. As vaias foram tantas e tão democraticamente distribuídas, que ficou difícil saber o que exatamente disseram o prefeito Duciomar e a governadora Ana Julia, de longe os mais hostilizados pelas torcidas rivais. No final, ambos tiveram que ouvir o puxão de orelhas que o presidente, sempre com a cara amarrada, fez questão de dar, recorrendo ao conhecido exemplo de que em Parintins, no vizinho Amazonas, os apoiadores dos bois Garantido e Caprichoso são implacáveis na disputa, mas costumam respeitar a apresentação do rival. Isso lá pode ser verdade, mas está longe de inspirar os belicosos integrantes da base de apoio presidencial no Pará.
Não é brincadeira
Rastejantes, mas docemente deslumbrados
Deve ter sido hilária a disputa por alguns centímetros ao lado do todo-poderoso chaiman, apenas pelo tempo suficiente para que fosse feito o registro fotográfico que depois viria a entulhar páginas e páginas dos dois principais jornais paraenses, ambos, desta feita, unidos na saudável disputa para ver quem arremata o troféu da cobertura mais escancaradamente invertebrada.
Tratado como um senhor visitando uma de suas senzalas, Agnelli estava feliz da vida e à vontade para disparar asneiras do tipo: “temos certeza que a mineração é uma atividade altamente amigável para com o meio ambiente”. Vai ver que a platéia, embevecida e ávida por recolher alguma migalha que por ventura escorregue do prato farto e transbordante da megaempresa, explodiu em entusiásticos aplausos. Pano rápido.
Como ninguém deve ter tido coragem de perguntar, o novo comendador do empresariado paraense também não se dispôs a esclarecer qual fim terá tomado a promessa de construir uma siderúrgica no Pará. Preferiu, como sempre, reforçar sua auto-imagem de executivo bem-sucedido, alheio a esses entediantes e aborrecidos problemas terrenos, representados por sem-terra e garimpeiros. Do alto de seu Olimpo, ele ainda fez um gesto de desprendimento ao agradecer, de público, o apoio da governadora Ana Julia e de sua Secretaria de Segurança Pública nas ações de controle dos movimentos sociais que, repetiu didaticamente, “não têm nada a ver” com a Vale. Aparentemente selou um armistício com o governo do Estado, se é que efetivamente houve mesmo um abalo sério no relacionamento com as autoridades paraenses. A ausência da governadora Ana Julia na concorrida cerimônia, ao que parece, não deve ser mal interpretada. Uma nota da Secretaria de Comunicação do governo do Estado sob o singelo título “Governo fortalece diálogo com a Vale”, não deixa margem a dúvidas acerca do atual estágio da celebrada “parceria”. Aquela mesma parceria que se estabelece entre o lobo e o cordeiro.
Maior abandonado
A enorme e sólida rejeição do eleitorado da capital ao político petebista deve ter causado arrepios numa turma que pode ser acusada de tudo, menos de não ter senso de sobrevivência.
quinta-feira, 29 de maio de 2008
Péssima companhia
Troféu cara-de-pau
Espelho partido
quarta-feira, 28 de maio de 2008
Forças ocultas
Balança, balança. Mas não cai?
Banco de leite
A grita do chamado "setor produtivo" e de seus porta-vozes políticos que vão do PT ao PSDB, apenas revela o escandaloso fato de que navegavam em águas da ilegalidade a grande maioria dos empreendimentos incentivados pela Sudam e pelos bancos oficiais, acostumados há décadas a sorver, com avidez, as fartas e gotejantes tetas do tesouro nacional. Nunca foi tão fácil ser capitalista e ainda vociferar contra o tamanho do Estado brasileiro.
Vilões na boca do mundo
terça-feira, 27 de maio de 2008
Por trás do sotaque, velhas ameaças
Vindo de qualquer cidadão esse tipo de baboseira já traria o travo rançoso voltado a legitimar o etnocídio que acompanha a construção da sociedade brasileira desde seu nascedouro. Mas sendo verbalizado por um ministro de Estado, a coisa se revela muito mais dramática e ameaçadora.
Que não fique sem resposta, por parte da sociedade civil e dos democratas sinceros, mais esta brutal agressão contra os direitos de nossos povos originários. E que seja já, antes que o retrocesso se consolide definitivamente.
Cartão vermelho
Se confirmada a demissão, ficará a certeza de que terá decorrido em função das notórias qualidades técnicas de Ortega, que há meses tenta impedir a contaminação de certo tipo de política - com "p" minúsculo - na análise dos processos ambientais. Ao que tudo indica, sua batalha poderá ter sido em vão.
Piada sem graça
Enquanto a platéia fica entretida com uma polêmica que sempre esteve mais próxima da anedota que de alguma ameaça verídica, uma "invasão" silenciosa ocorre e se aprofunda, sem que o governo insinue a menor reação. Segundo dados do Incra, estrangeiros detém 33.228 imóveis no país, equivalendo a 0,64%do total, abocanhando 5,6 milhões de hectares. Só na cobiçada Amazônia Legal são 3,1 milhões, uma boa parte adquiridos por empresas transnacionais interessadas em produzir agrocombustíveis.
Para o crime não compensar
Enquanto isso, por aqui ainda se mantém a surrada versão de que a lei da anistia de 1979 teria sido "recíproca", ou seja, beneficiaria também os criminosos fardados ou não que torturaram e mataram a sangue frio centenas de brasileiros.
segunda-feira, 26 de maio de 2008
A corte é uma festa
A perda do senso (seja de responsabilidade, seja do ridículo) pontificou em duas peças publicitárias alusivas à festança, publicadas na imprensa neste domingo e que serão, certamente, muito bem pagas com recursos públicos.
Custa crer que as duas páginas em policromia, no caderno Negócios, do Diário do Pará, com direito a dezenas de fotos de cortesãos de todos os quilates, possam levar a assinatura da Secretaria de Estado de Cultura. As decadentes colunas sociais que ainda porejam na imprensa local devem estar se contorcendo de ciúmes.
Mas o golpe de misericórdia veio à noite, em horário nobre, com o insert veiculado nas TVs. Sobrou até alguns poucos frames para o virtual candidato a prefeito de Belém, o petista Mário Cardoso, que andava meio sumido do noticiário.
Nos dois casos, uma interessante matéria-prima para um inadiável trabalho de investigação do Ministério Público.
É fantástico!
Apesar de formatada para reforçar o estigma contra as populações indígenas – apresentadas como tendo praticado “ato de selvageria”- a matéria deu, pela primeira vez, voz aos próprios índios Kayapós, com um de seus caciques podendo expressar argumentos contra a construção da usina. Fechando a matéria de Patrícia Poeta, uma entrevista com o engenheiro da Eletrobrás, envergando, desta feita, um bem ensaiado figurino de moderação e de bom senso (tudo que teria faltado à sua intervenção dias atrás em Altamira).
Favores cruzados
domingo, 25 de maio de 2008
A narcopolítica e a idolatria da morte
Por tudo isso, não se deve estranhar que o governo colombiano comemore a suposta morte do líder máximo das Farc, Manuel Marulanda, vítima de um ataque cardíaco no final de março em plena selva, segundo afirmam fontes anônimas, mas “confiáveis”, pelo menos para os propósitos propagandísticos de Uribe e seus generais. O eventual desaparecimento do velho guerrilheiro de quase 80 anos é apresentado como um troféu, símbolo de que a estratégia de guerra total aos insurgentes estaria dando certo. Tudo, porém, pode não passar de uma eficiente cortina de fumaça.
Vejamos: Marulanda pode mesmo ter falecido. Sua saúde dava sinais de fragilidade há muitos meses, agravada pela impossibilidade, dada as condições difíceis do ponto de vista militar, que ele recebesse tratamento adequado. Mas também é verdade que, desde um bom tempo, o comando das forças guerrilheiras passou a ser exercido por uma junta de vários comandantes, que na prática substituíram “Tirofijo” (tiro certeiro, em tradução literal) em suas funções de mando. Sua eventual morte não altera o cenário da guerra, antes, pelo contrário. Cada vez mais isolada, a guerrilha tende a endurecer suas ações, retardando uma solução humanitária à crise dos reféns e prolongando indefinidamente a situação de beligerância.
Uribe sabe muito bem disso. Não tem esperanças de uma vitória militar retumbante. O que quer, neste momento, é colher frutos em outra seara, a da política interna. Mergulhado em uma desgastante crise ética, com parte de sua base parlamentar – cerca de 50 congressistas – investigada por envolvimento em crimes variados relacionados aos paramilitares – interessa ao governo desviar as atenções e continuar fustigando a guerrilha, de forma intermitente. Por outro lado, renasce no meio político colombiano a proposta de alterar a Constituição para que Uribe possa concorrer a um terceiro mandato consecutivo, uma re-reeleição (como são pouco originais os governantes dessa parte do planeta!).
Só o tempo dirá se Marulanda de fato faleceu nas circunstâncias alegadas pelo governo e quais as conseqüências deste fato para o futuro imediato da Colômbia. Até agora, as Farc têm dado declarações dúbias. A Agência de Notícias Nova Colômbia (veja link entre os Preferidos deste Blog), apontada como porta-voz extra-oficial da guerrilha, acaba de emitir um comunicado dúbio. Ressalvando que até o momento o Secretariado Nacional das Farc não se pronunciou sobre o tema, “única fonte verdadeira”, a nota relembra que pela lei da vida, o trânsito de todos pela terra é circunstancial. A diferença, afirma, é saber o que se fez e em benefício de quem, sendo que a vida de Manuel Marulanda é “rica em lutas e êxitos”. Em seguida, praticamente admitindo a morte do legendário guerrilheiro, dá conta que “se morreu, sua passagem não foi estéril pela pátria de Bolívar, diferentemente de muitos que não serão recordados ou simplesmente receberão o desprezo das gerações futuras”, conclui o despacho emitido na noite de ontem, 24.
Foi o próprio Marulanda (Pedro Antonio Marin em sua certidão de batismo), fundador das Farc em 1964 e participante da luta armada desde 1948, ainda com 19 anos, quem disse certa vez que as autoridades governamentais teriam anunciado sua morte umas “1200 vezes” nos últimos anos. Involuntariamente, teriam contribuído para reforçar o mito que existe em torno de sua militância. Tudo indica, entretanto, que desta feita podem ter acertado o alvo.
Atualizada em 14h45,
Agora é oficial. A rede Telesur, com sede em Caracas, acaba de noticiar que o Secretariado das Farc emitiu nota confirmando que Manuel Maralunda "morreu no último dia 26 de março, de infarto, nos braços de sua companheira e acompanhado de sua guarda pessoal". O mesmo comunicado informa que assume o lugar de Marulanda, como comandante máximo da guerrilha, o advogado Afonso Cano (cujo nome verdadeiro é Guillermo León Sáenz Vargas), há vários anos integrando os escalões superiores da organização colombiana.
sábado, 24 de maio de 2008
Odor de naftalina
Com o gesto, que significa uma evidente concessão ao poderoso lobby da extrema-direita cubano-americana, Obama demonstra o quanto sutis podem ser as diferenças entre democratas e republicanos, protagonistas de um baile de máscaras dominado pelos interesses do sacrossanto mercado.
Dialética de uma discriminação odiosa e secular
Charles Wagley (1913-1991), "Uma comunidade amazônica" (1957, p.290)
Preconceito escrito à bala
No dia 5 de maio, na aldeia Anajá, foi assassinada com um tiro na cabeça a menina Maria dos Anjos, de apenas seis anos, em mais um episódio de violência contra esta etnia que sofre forte pressão de grileiros, madeireiros e colonos interessados na exploração predatória das terras indígenas.
sexta-feira, 23 de maio de 2008
Presente de grego
O estranho é que a esquálida SEEL seja agora apresentada como moeda de troca para a repactuação com a tendência política do deputado federal Paulo Rocha, líder do outrora poderoso campo majoritário do PT.
Ritos de passagem
Para os povos indígenas, a dor é um fato da vida. Se provamos do doce, também temos de provar do amargo. A vida é assim. Por isso, cedo os índios se familiarizam com a dor. Como os Kayapó, por exemplo, que, para marcar a passagem para a vida adulta, se escarificam usando a mandíbula afiada do peixe cachorra. São cortes profundos ao longo dos braços, que sangram muito. Para quê? Para lembrar ao indivíduo que ele não é melhor, nem pior que os outros, que assim como ele pode fazer mal aos outros, eles também podem lhe fazer o mesmo. A nossa sociedade é muito mal acostumada, com a sua mania de "estágio evolutivo avançado", de renegar elementos naturais dos quais nunca vai se desvencilhar. O cheiro corporal, a violência, a dor. A Eletronorte, expressão de um desenvolvimento social que busca nos distanciar do mundo desconfortável onde se dorme no escuro, onde a comida tem que ser consumida toda no mesmo dia, onde não se assiste TV, essa Eletronorte no fundo não liga a mesmo para o povo da região que lhe dá o nome. E um golpe de terçado no braço do engenheiro da Eletronorte representa, simbolicamente falando, menos que uma agressão inconseqüente, de bar de periferia, representa aquele lembrete básico: a Eletronorte está nos trazendo uma dor como esta, só que multiplicada milhares de vezes. Que não poderá ser tratada à base de rifamicina, e que talvez nem vá cicatrizar. A dor do engenheiro Francisco Rezende, tomara que lhe sirva de ponto de partida para um profundo questionamento pessoal, em que a lembrança da sua própria fagilidade mostre também a fragilidade da Amazônia, diante dos barrageiros e assemelhados.
De barriga cheia, mas insaciável
Apesar disso, prossegue a manobra para a recriação por vias tão transversas quanto inseguras da "nova" CPMF, com a base aliada dançando o patético minueto que pretende esconder as evidentes digitais do Planalto.
O governo corre contra o relógio. Dentre de poucas semanas, o mais tardar no final de junho, o Congresso entrará em recesso branco devido às eleições municipais. A partir daí, nem pajelança brava será capaz de arrancar qualquer aprovação de deputados e senadores. Muito menos a impopular criação de novos impostos.
quinta-feira, 22 de maio de 2008
Sócios em fantasmagorias
Polêmica à parte, resta a certeza que Flexa e Duciomar possuem antiga intimidade com a face algo esotérica do mundo da política e dos negócios. Não será por outra razão que parentes do político do PSDB paraense são vistos com freqüência no gabinete do prefeito, tratando de assuntos de interesse da construtora Leal Jr, que serve de cavalo de Tróia aos negócios da família.
Bagdá, abril de 2003: repórteres na linha de fogo
Testemunho de Adrienne Kinne, uma ex-sargento do Exército dos Estados Unidos, dá conta de que o Hotel Palestine, no centro da capital iraquiana, no qual se abrigavam as poucas equipes de jornalistas ocidentais que insistiram em permanecer na cidade nos dias iniciais da ocupação militar, era mesmo um alvo dos ataques ordenados pelo alto comando do exército. Ela afirma ter tido acesso a documentos secretos que comprovam a determinação de bombardear o local, mesmo sabendo que lá havia apenas civis.
A Federação Internacional dos Jornalistas (FIJ) cobra que o governo de George W. Bush declare “toda a verdade” sobre essas mortes, no momento em que vários militares norte-americanos escapam de condenação em um tribunal espanhol justamente por “insuficiência de provas” que possa vinculá-los às mortes de Protssyuk e Couso.
O episódio do Palestine foi narrado, em detalhes, pelo premiado jornalista norte-americano, Jon Lee Anderson, em seu “A queda de Bagdá” (Objetiva, 2004, 387p.), uma obra que deveria ser leitura obrigatória nos cursos de comunicação em nosso país. Ainda mais nestes tempos em que jornalismo se confunde com subordinação cega às ordens dos senhores da informação mercantilizada.
Livres para lutar
A libertação de Wagner da Silva Cruz, Fábio dos Santos Bezerra e Eurivaldo Martins Carvalho, o Totô, todos dirigentes estaduais do MST, e de Etevaldo da Cruz Arantes e Eugênio Viana Barbosa, coordenadores do MTM, decorreu de decisão do juiz da Comarca de Curionópolis que não viu caracterizados os requisitos para manter a prisão em flagrante. De fato, ao promover a desocupação violenta do prédio da Coomigasp, a PM agiu como milícia privada, apoiando abertamente uma das facções em conflito. Sobre o atual presidente da entidade, Waldemar Falcão, pesa a suspeita de ser o mandante do assassinato, no dia 8 de maio, em Marabá, de Josimar Barbosa, que presidiu a cooperativa até recentemente. Só isso já seria suficiente para que o governo adotasse uma posição de maior cautela. Mas parece que a mão invisível de poderosos interesses continuam a dar as cartas, manobrando com habilidade os cordéis nos quais se enovelam governantes cuja estatura não pára de diminuir a cada uma de suas cada vez mais freqüentes decisões marcadas por insensata truculência.
quarta-feira, 21 de maio de 2008
A verdadeira face da selvageria
Ainda é cedo para se saber ao certo o que detonou a reação dos integrantes das diversas etnias que se encontram reunidos em Altamira, reeditando, 19 anos depois, o histórico encontro de povos indígenas do Xingu. Talvez uma frase mal-colocada – “Nós iremos à guerra para defender o Xingu” - cujo sentido abstrato pode não ter sido apreendido corretamente pelos indígenas. Ou, quem sabe, a explosão decorreu de um lento acúmulo de frustrações e humilhações que esses povos enfrentam há décadas. Porém, as causas mais profundas são de amplo conhecimento e resultam de cinco séculos de cruel e sistemático etnocídio, realizado sempre em nome dos valores do progresso e civilização.
Para os que imaginam que o facão dos Kayapó teria inaugurado a violência, nunca é demais recordar as palavras do barão Johann Jakob von Tschudi, diplomata e naturalista suíço que percorreu o interior do Brasil na segunda metade do século XIX: "Os portugueses adotaram os meios mais infames para atingir esse objetivo. [...] Nenhuma nação européia se rebaixou tanto para manchar seu nome e sua honra como Portugal (...) Nos últimos tempos, apesar de já existir uma Constituição brasileira, que, infelizmente, tem sido implementada de forma muito precária, a guerra de destruição contra os índios na província de Minas Gerais ainda continua".
Por trás do acesso de cólera
Bem-vindo ao ano de 2122
Vale anuncia nova siderúrgica
Sob domínio da dinastia Al Sa'id há mais de 250 anos, Omã possui um regime de monarquia absoluta, praticamente sem liberdade política, sindical ou de imprensa, o que parece se encaixar perfeitamente no modelo de ambiente propício aos investimentos dos acionistas da Vale.
terça-feira, 20 de maio de 2008
Legião Estrangeira
Que tal uma grande multinacional belgo-francesa controlando uma das maiores e mais importantes usinas hidrelétricas do país, no coração da Amazônia? É exatamente isso que vai acontecer depois que a Suez Energy venceu o leilão para construir e explorar a hidrelétrica de Jirau, a segunda usina do Complexo do Rio Madeira, em Rondônia. Ela possui 50,1% do consórcio também formado pela Camargo Corrêa, Eletrosul e Chesf.
Explica-se, assim, a brutal pressão exercida pelo Planalto sobre a ex-ministra Marina Silva para forçar a liberação das licenças ambientais para as duas usinas - a primeira, a de Santo Antônio, está nas mãos de outro poderoso consórcio liderado pela construtora Odebrecht. Sob o argumento de que se tratava de obra fundamental para o país, pavimentou-se o caminho para assestar esse duro golpe na soberania nacional.
Para quem não conhece, o grupo Suez é um dos gigantes mundiais na área industrial e de serviços, espalhando seus tentáculos nos setores de produção de eletricidade, gás natural, abastecimento de água e gestão de resíduos. Possui 149 mil empregados e mais de 200 milhões de clientes individuais em todo o mundo. Porém, sua passagem pela América do Sul deixou um rastro de escândalos. Não foi sem motivo que o governo de Evo Morales, na Bolívia, negociou a saída do grupo de seu território, cancelando sua concessão de abastecimento de água e tratamento de esgoto em La Paz e El Alto (enorme bairro popular contíguo à capital), depois de decretar a nacionalização desse setor estratégico.
Para quem não se recorda, a Suez Environment foi a causa principal da explosão popular de 11 de janeiro de 2005, que incendiou por três dias o altiplano boliviano, numa greve geral contra a permanência da multinacional naquele país. Somente depois da eleição de um governo de esquerda foi possível dar fim a este conflito que perdurava desde 1997 quando uma onda de privatização selvagem arrasou a frágil economia boliviana.
O Brasil, cuja importância mundial não permite qualquer paralelo de comparação com aquele que é o segundo mais pobre país do continente, parece ter optado pelo caminho inverso: abre, para o capital estrangeiro, o que há de mais precioso: seus recursos naturais e energéticos. Para piorar, ainda utiliza recursos públicos para financiar o lucro privado. A usina de Jirau está projetada para custar R$ 8,7 milhões, dos quais 70% deverão ser financiados pelo BNDES, uma verdadeira mãe para o grande capital sem fronteiras.
O facão de Tuíra se levanta
Desta vez, Antônio Muniz, atual presidente da Eletrobrás, não estará presente e, portanto, não correrá o risco de enxergar de perto o facão de Tuíra. Logo após, ingressaram os parentes Parakatejê, Assurini,Araweté, Panará, Kararaô,Mbengokrê, Kokraimoro, Arara, Juruna, Xipaya,Curuaya, Krahô, Apinagé e Parakanã. Povos da floresta, punhos, arcos e flechas cortando o ar.
Mas, para seu desgosto, os gritos e as canções indígenas repercutirão muito além dos limites do ginásio em que o evento se realiza. Ganharão o mundo, erguendo novas barricadas contra o polêmico projeto de geração de energia a partir da construção de barragens (no plural mesmo, já que Belo Monte é só a cabeça de ponte de uma estratégia que para se viabilizar economicamente não poderá prescindir de erguer mais duas ou três usinas na grande volta do rio Xingu).
Não há dúvida de que Altamira é, a partir de agora, o coração da resistência dos povos da Amazônia contra o modelo depredador.
É sintomático e, ao mesmo tempo elucidativo, que nenhuma autoridade dos governos federal ou estadual, participe dos debates. Estão com agenda lotada, com certeza. Lula às voltas com seu boquirroto ministro do Meio Ambiente, um verdadeiro rifle de repetição de factóides (de duração efêmera, é verdade). E Ana Julia, bem, nossa governadora gasta seu precioso tempo coordenando seu aparato policial-midiático contra professores em greve, garimpeiros e sem-terra.
Prisão de líderes do MST é política. E é só o começo
segunda-feira, 19 de maio de 2008
Realismo fantástico
Procura-se
Mendigo de black-tie?
Alguns dirão que se trata, como sempre, de uma escolha política do governo Lula em favor do mercado, já que o fundo soberano será utilizado para alavancar empresas brasileiras no exterior. Para outros, entretanto, tudo se resume à escassez de um outro produto. Vergonha na cara, em português claro.
Credibilidade zero
Terra de senzala
Com a iminente entrada em pauta, na Câmara Federal, da PEC 438, que prevê o confisco das terras onde for comprovada a prática de trabalho escravo, o país poderá dar um passo adiante para extirpar esse câncer. Falta apenas combinar com a bancada ruralista, que há anos impõe um virtual embargo de gaveta ao projeto desde sua aprovação em primeiro turno em 2003.
sábado, 17 de maio de 2008
Acertando os ponteiros
Dialética da dúvida que se faz palavra
Italo Calvino (1923-1985). "Se um viajante numa noite de inverno", p.67
sexta-feira, 16 de maio de 2008
Mãe do PAC. Madrinha da motosserra?
De bem com a vida
Mesmo em relação aos bancos norte-americanos - cuja rentabilidade está em queda - os magnatas da avenida Paulista ostentam números invejáveis. A Rentabilidade sobre o Patrimônio Líquido dos 18 bancos nacionais bateu em 21,94%, quase o dobro do alcançado por 94 instituições financeiras estadunidenses no mesmo período, que não ultrapassaram os 9,72%.
Cega, lenta e parcial
Junto com Quartiero, também foram soltos seis homens apresentados como "funcionários" da fazenda, além de seu filho, que no mês passado sofreu ferimentos ao tentar lançar uma bomba caseira sobre as tropas da Força Nacional de Segurança. Aliás, armamentos pesados e explosivos parecem ser uma das especialidades desta família de grileiros. Não foi por acaso que a PF apreendeu na fazenda Depósito, onde o atentado contra os indígenas foi praticado, 149 tubos contendo substâncias explosivas. As armas, que aparecem claramente na fita de vídeo de documenta o quase massacre, já haviam sido convenientemente retiradas de lá, mas é de conhecimento público que partiu de Quartiero a iniciativa de constituir uma verdadeira milícia de pistoleiros, alguns até vindos da vizinha Venezuela.
Todos esses elementos não foram suficientes para convencer os ilustres magistrados, que resolveram relaxar a prisão dos acusados, contrariando o pedido do Ministério Público Federal (MPF).
Resultado: o conflito tende a se agravar, conferindo cores ainda mais dramáticas a este cenário de tragédia anunciada.
quinta-feira, 15 de maio de 2008
Um poço de desigualdade
Quando a pressa é inimiga
Por isso, chega a ser aterrador o dado revelado hoje pela Folha de São Paulo. O novo ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, em apenas 17 meses à frente da órgão ambiental do Estado do Rio, emitir o mesmo número de licenças que nos três anos anteriores. Mau presságio, sinalização ameaçadora para a Amazônia e seus agressivos projetos à espera de licenças ambientais. Hora de colocar as barbas de molho.
quarta-feira, 14 de maio de 2008
Com a cara de Lula
Diga-se, entretanto, que o que se esvaiu foi a possibilidade de alterar os rumos, de dentro para fora, de um governo que já havia consolidado uma férrea opção pelo modelo de desenvolvimento a qualquer custo, para o qual o respeito e a proteção das questões socioambientais viraram apenas entraves irritantes, esquisitices de alguns defensores de bagres, micos-leões e, por mais que não se assuma publicamente, de uma legião de seres anacrônicos, como índios, quilombolas e ribeirinhos.
Marina será bem-vinda na planície. Muito embora não se concorde com todas as suas concepções e projetos - alguns desastrosos como é o caso da privatista Lei de Concessão das Florestas - é necessário reconhecer que se trata de uma militante sincera e obstinada das causas da Amazônia e de seus povos. Ela reassume sua cadeira no Senado e da tribuna continuará a defender seus ideais.
Já o governo Lula seguirá adiante, cada vez com a face dele próprio, sem poder contar com intermediações cosméticas, que serviam para amenizar sua imagem aqui e lá fora, como se fosse possível conciliar a feroz busca pelo lucro dos grandes monopólios nacionais e internacionais com a desconstrução, mesmo que pontual, do modelo de exploração predatória do meio ambiente.
O tacão de ferro
A lembrança do terror que se apossa das elites quando os de baixo desatam suas mobilizações - de fundo econômico, mas sempre portadoras do germe de contestação do establishment, vem bem a calhar diante do profundamente reacionário despacho judicial que ontem, 13, decidiu pela abusividade da greve dos servidores da educação pública do Pará. Na prática, a decisão do juiz José Torquato Alencar significa extinguir o direito de greve para os servidores públicos, na esteira de um entendimento de corte conservador que, de algum tempo para cá, vem se firmando em sentenças de diferentes tribunais. É como se o dispositivo constitucional não passasse de uma declaração de intenções, a ser confirmada ou não por uma lei complementar que jamais foi editada. Logo, a greve, tal qual London observara nos idos de 1900, deve ser tratada como uma anomalia social, uma transgressão a ser combatida, alternada ou cumulativamente, pela política e pelos rigores do Judiciário.
O registro que deve ficar gravado de todo esse episódio - cujo desfecho ainda permanecerá em aberto por algum tempo - é o fato dessa iniciativa tipicamente de direita ter partido, pela primeira vez na história recente do Pará, de um governo que se autoproclama popular. Isso prova como as palavras podem, desgraçadamente, ser transformadas em infelizes caricaturas de si mesmas.
Carne fatiada
terça-feira, 13 de maio de 2008
Conspiração S.A
Tudo indica que Mário Cardoso pode, em breve, acumular mais um "ex" em seu currículo.
Dialética do trabalho e de suas múltiplas formas de resistência
José Maria Bezerra Neto. Histórias urbanas de liberdade: escravos em fuga na cidade de Belém, 1860-1888. Revista Afro-Ásia, 28 (2002), p. 221-250.
Inventem outra
Propina a la carte
Se resolverem abrir a caixa preta da Alston muitos pilares da República sofrerão fortes abalos. Dizem, de muitos graus na escala Richter.
segunda-feira, 12 de maio de 2008
No país da indiferença
Haverá espaço na imprensa para mais uma menina de seis anos assassinada, mesmo estando este terrível e cruento crime dentro de um contexto grave de terror e agressão ao povo guajajara, diferente da paulista Isabella, cuja morte serve de combustível para a audiência das emissoras e do linchamento dos acusados?Será que dói menos nas pessoas, pelo fato de se tratar de uma indígena lá nos confins do Maranhão? Se assim for, é tão monstruoso quanto trucidar uma inocente. Será possível que os brasileiros se igualarão apenas na violência e na indiferença???
Uma questão de respeito
O resto é discurso que reproduz a velha prática dos governos conservadores. Eram esses governos, de direita sem máscaras, que buscavam deslegitimar os movimentos grevistas como fruto de supostas manipulações político-partidárias. A paralisação é fruto da luta salarial e por melhores condições de trabalho de uma categoria que fez greve em todos os últimos governos, do fim da ditadura, sob Alacid Nunes, até hoje, sem exceção.
Afinal, política está em todo lugar. Até mesmo na decisão insensata de jogar uma tropa de meganhas para espancar educadores em plena via pública.
Réquiem para a pequena Maria dos Anjos
Os criminosos, provavelmente vindos do município de Arame, bem próximo da reserva, segundo os indígenas, foram os mesmos que no início de 2007 assassinaram Timóteo Guajajara. O ataque faz parte de uma estratégia de espalhar o terror sobre a comunidade, forçando que a tribo abandone suas terras, deixando-a livre para a ação de madeireiros e pecuaristas.
A Polícia Federal abriu inquérito e enviou uma equipe de policiais para a reserva. Talvez os autores materiais dessa tragédia sejam presos. Talvez.
Mas Maria dos Anjos Paulino Guajajara, de apenas seis anos, índia e brasileira, está morta, abatida cruelmente. Seu sangue inocente irrigou a terra de seus ancestrais e virou estandarte da luta de resistência dos povos indígenas à barbárie e à intolerância.
Que sua memória seja preservada e que viva - para sempre - dando forças para os que não deixam de lutar e construir o caminho para a terra sem males.
Por trás de tudo, a velha grilagem
Resolver o caos fundiário que impera na Amazônia é a mãe de todas as batalhas. Este é o câncer a ser combatido. Fora disso, corre-se o risco de montar apenas aparatos cenográficos enquanto a floresta não pára de arder.
domingo, 11 de maio de 2008
La Dolce Vita dos mandantes
É o caso do juiz aposentado João Batista de Castro Neto, um dos ativos participantes do consórcio que planejou e financiou o crime. Duas décadas depois, ele sequer foi ouvido no processo, fugindo, por meio de variados recursos jurídicos, às citações expedidas pela 1a Vara Criminal de Imperatriz, onde tramita, por todo esse tempo, a Ação Penal no. 7252/2000. Vários dos implicados já faleceram ao longo deste período e o pistoleiro Geraldo Rodrigues da Costa, autor dos disparos fatais, chegou a ser preso e condenado a 18 anos e 6 meses de reclusão, mas conseguiu fugir por três vezes da penitenciária, estando hoje foragido. Há informações, entretanto, de que possa ter sido morto após um assalto frustrado a um banco em Guaraí, Tocantins.
Ao lado da prisão ou eliminação de alguns assassinos de aluguel - que compõem o elo mais frágil da cadeia de crimes de encomenda - sobressai a incrível impunidade dos mandantes, que têm em Vitalmiro Bastos, o Bida, seu mais vistoso patrono.
Supremo risco
sábado, 10 de maio de 2008
Brucunóquio, esquisito e perigoso
A quem apelar?
Que pena que o TRE-PA só tenha olhos para Belém. No interior os prefeitos malas deitam e rolam com sob a vista grossa de magistrados e do MP. Em Paragominas o "prefeito prêmio" Adnan consegue a proeza de aparecer simultaneamente nos intervalos de em 3 canais. Você liga em canal tá lá as tais "ações premiadas", muda pra outro canal, adivinha: mais prêmio, muda pra outro canal e quem aparece de novo? Ganha um prêmio quem acertar? Adnan, isso mesmo. Aqui em Paragominas nem o controle remoto ajuda o cidadão a se livrar da cara do "prefeito mais premiado do Brasil". A quem apelar?
Os ponteiros da morte
PAS, PAC, PAC
Decisão correta, mas incrivelmente tardia
sexta-feira, 9 de maio de 2008
Brucutus em ação
A categoria completa hoje 17 dias de paralisação por melhores salários e já enfrentava a intransigência da administração do PT, que resolveu dispersar a manifestação através da violência.
Atualização em 12h20
O trânsito segue tumultuado em frente ao Palácio dos Despachos, mas os manifestantes que bloqueavam a via foram dispersos com violência pela PM. Há vários servidores com ferimentos por tiros de balas de borracha. Eles farão exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal, e em seguida deverão registrar ocorrência na Polícia Civil contra os policiais militares envolvidos na repressão à greve. Há, pelo menos, um manifestante preso.
Encontro marcado
História circular, prisioneira de um labirinto trágico, será testemunha de um esforço desesperado para deter, em condições mais adversas que há duas décadas, as engrenagens do mesmo projeto, que da ditadura militar ao atual regime de supremacia do sacrossanto mercado, tem fincado suas garras coloniais sobre a Amazônia e seus povos. Povos, no plural. Expressão da diversidade e da unidade possível para celebrar, aqui e agora, a promessa de um futuro com as marcas de reencontro do homem com seu destino de felicidade. Alguns dirão: sonho impossível. Mas, tal qual revelaram os muros na Paris de 1968, é cada dia mais atual a consígna "Criemos comitês de sonhos", aproveitando o tempo que ainda nos resta.
Números que envergonham
Além de Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, livre após um tão polêmico quanto suspeito segundo julgamento, dois outros aguardam julgamento em liberdade. Para fechar a conta da impunidade, um morreu de causas naturais, um recebeu perdão judicial e o último está foragido. Terra de direitos violados, portanto.
O papel aceita tudo
Miragem em 3D
quinta-feira, 8 de maio de 2008
Operação Brucutu
Já está convocada para amanhã uma grande marcha, engrossada por dezenas de caravanas do interior. O destino da passeata será o Palácio dos Despachos. Um ótimo momento para que se comprove, na prática, se o Pará pode mesmo ser considerado uma "Terra de Direitos".
Para maiores detalhes, basta fazer uma consulta on-line no site do Tribunal de Justiça do Estado (http://www.tj.pa.gov.br/), processo 200810531134.
Aos porta-vozes da barbárie
Ouvir essas sandices de remanescentes da ditadura - reciclados ou não - já se tornou lugar comum. O triste é ver que jovens, com menos de 30 anos, e que portanto não viveram o regime do terror - possam reproduzir, acriticamente, postulados que não fariam corar Hitler ou Mussolini.
Os ataques à memória de Dorothy são uma espécie de segunda morte. Esses pistoleiros virtuais se equiparam - mesmo sem saber - aos sicários que apertaram o gatilho a fim de receber o soldo ao fim do "trabalho". Inscrevem seus nomezinhos na história, lá no compartimento escuro onde dormitam os que cometeram os mais atrozes crimes contra a humanidade.
Merecem pena, somente.
O bonde do Obelix
Um detalhe, porém, liga o escândalo aos nossos impolutos tucanos paulistas. É a suspeita pagamento de US$ 6,8 milhões pela Alston por um contrato de US$ 45 milhões na obras do metrô, em 2000, quando Mário Covas ainda governava São Paulo. Três anos depois, já sob o governo de Geraldo Alckmin, novo contrato para fornecimento de equipamentos para a Linha 4 (Via Amarela), garantiu à empresa francesa, em conjunto com as notórias OAS, Queiróz Galvão e CBPO, um faturamento de US$ 1,8 bilhão. Todos agora sob irremediável suspeita.
Um chacal muito atrapalhado
Agripino Maia, o estridente líder dos democratas no Senado, deve ainda hoje ter sonhos (ou pesadelos) com o tempo em que militava, sem qualquer remorso, nas hostes da Arena e, lá fora, o pau cantava impunemente. Pessoas eram seqüestradas e torturadas todos os dias. Seus corpos, mutilados com sadismo, eram enterrados em valas comuns ou simplesmente desintegrados. Nada disso, entretanto, àquela época, tirava o sono do então governador potiguar. Ele tinha outras ocupações, como bajular os ditadores de plantão e surfar sobre as ondas douradas do milagre brasileiro.
De toda forma, Agripino, bem no início da sessão destinada a ouvir ontem, 7, a ministra Dilma Rousseff, sobre o PAC e, de contrabando, trazer à tona o insuportável tema do dossiê de gastos "secretos" de FHC e familiares, resolveu encenar uma esquete que julgava o primor da sagacidade política: leu trechos de uma antiga entrevista da ministra ao jornalista Luiz Maklouf Carvalho onde ela confessa ter mentido sob tortura, em 1970, nos anos de chumbo da ditadura. Com a lembrança, o político do DEM insinuou que Dilma poderia fazer o mesmo naquela sessão do Senado já que a prática de vazar dossiês era um ato que lembrava o regime de exceção. Do alto de uma justa indignação, a ministra contra-atacou: esteve presa aos 19 anos e foi barbaramente torturada. Tinha orgulho de ter mentido sob tortura, porque só quem tem dignidade por fazer isso e para salvar seus companheiros de guerrilha. E, ademais, naquele momento ela e o senador estavam em campos opostos. Ponto final.
Impagável a expressão desolada do ilustre senador, em cujas veias corre o sangue oligarca de uma mais tradicionais famílias nordestinas. A partir deste momento e até o final das longas nove horas de inquirição - que em certos trechos mais parecia uma quermesse eleitoral onde cada um quer puxar uma obrinha do PAC para seu terreiro - a oposição estava nas cordas e o governo colhia os frutos de uma inusitada vitória política.
Com a dupla Agripino Maia-Artur Virgílio no comando da oposição, que mais parece integrar uma das células da Al-Quaeda, o governo Lula realmente não tem por que se preocupar. Pode navegar em águas tranqüilas. Pelo menos até que a tsunami que se gesta nas entranhas do capitalismo de papel dê suas caras por aqui. Mais cedo, ou mais tarde.
quarta-feira, 7 de maio de 2008
Dialética da palavra que denuncia a crueldade
Cristóvão de Lisboa, frei capuchinho, citado pelo jesuíta Antônio Vieira, como testemunho da sangrenta guerra de extermínio que os conquistadores portugueses executaram contra os milhões de indígenas na Amazônia colonial.
Crime sem castigo
A absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, conhecido como Bida, cobre o judiciário paraense de vergonha e voltar a expor o Pará, em nível mundial, como terra sem lei. Ele, aliás, era até a noite de ontem o único mandante, dos mais de 800 assassinatos por questões agrárias no estado, durante os últimos 36 anos, que cumpria pena na cadeia. Agora, todos estão soltos, como prova de que o crime, quando cometido pelos de cima, pode compensar.
Não terá sido mera coincidência que a libertação de Bida, que já havia sido condenado no primeiro julgamento a 30 anos de reclusão, tenha ocorrido no mesmo dia em que bispos católicos denunciassem a existência de uma lista com 300 pessoas marcadas para morrer no interior paraense. O combustível das tragédias mais que anunciadas segue sendo sempre o mesmo: a impunidade que o "julgamento" de ontem confirma com ineludível eloqüência.
Até que enfim
Na sede da fazenda foi encontrado farto material para a preparação de bombas caseiras. Esses artefatos já vinham sendo utilizados pela quadrilha, que chegou a dinamitar pontes de acesso à reserva e a tentar explodir um posto da PF.
A mobilização das forças policiais e a própria presença do ministro da Justiça, Tarso Genro, na área de conflito podem expressar uma tomada de posição importante por parte do governo. Por caminhos tortuosos e após a quase ocorrência de um massacre, foi rompida a equivocada interpretação que enxergava a liminar do Supremo como uma espécie de habeas corpus para o banditismo liderado pelos arrozeiros, mas com amplo apoio político e midiático dentro e fora de Roraima.
Enquanto cresce a mobilização dos 18 mil indígenas que vivem na Raposa/Serra do Sol, aguarda-se que o STF não consagre, no iminente julgamento das mais de 30 ações movidas contra a demarcação, um recuo que pode ser responsável pelo desmonte da política indigenista que o país tem desenvolvido, com reconhecidos êxitos, nas últimas décadas.
terça-feira, 6 de maio de 2008
Contra a ruína, o peso da lei
Exemplar, para dizer o mínimo, a sentença da Justiça Federal obrigando a Prefeitura de Belém e o próprio prefeito Duciomar Costa (PTB), sob pena de multa de R$ 1 milhão de reais, a retomar e concluir as obras de restauração do Palacete Pinho, um dos mais representativos exemplares da riqueza arquitetônica da Belém da Belle Époque que ainda resiste à ação do tempo e à incúria de seguidas administrações.
Com os trabalhos praticamente concluídos no final da gestão anterior, coordenada pelo prefeito Edmilson Rodrigues (à época no PT e hoje no PSOL), o Palacete Pinho permaneceu abandonado pela Prefeitura ao longo de mais de três anos, colocando em risco todo o investimento que já havia sido realizado, tanto para soerguer o prédio que ficara anos em ruínas, quanto para devolver-lhe os belos traços originais.
A mão que tira
Para refrescar a memória dos que estão embevecidos com a era Lula de prosperidade: o salário mínimo ideal, calculado pelo Dieese com base no que dispõe a Constituição, deveria ser de R$ 1.918,12, quatro vezes o mínimo atual.
Tropas de resgate do século XXI
Marco Aurélio Mello, ministro do Supremo Tribunal Federal, primo do ex-presidente afastado e atual senador alagoano Fernando Collor de Melo, por ele indicado para a mais alta Corte do país, está muito de bem com a vida. Não parece enxergar a gravidade da situação em Roraima, nem percebe o incêndio social que se alastra na área da Terra Indígena Raposa/Serra do Sol. Diante da notícia do baleamento, por pistoleiros encapuzados, de dez indígenas macuxis, que "retomaram" um pedaço de uma das fazendas que violam acintosa e escandalosamente suas terras ancestrais, o ministro saiu com uma blague desconcertante: "Ora, daqui a pouco teremos de devolver a cidade maravilhosa aos índios". Tal afirmação, mesmo em forma de piada de péssimo gosto, saiu da boca de um dos onze ministros do Supremo na qual tramitam 33 ações que questionam a demarcação em terras contínuas em Roraima, que se aprovadas abrirão uma feroz temporada de caça e (novo) extermínio às nações indígenas que já possuem terras demarcadas. É muito sério e demarcam os tempos cinzentos para a luta pela sobrevivência dos povos indígenas no Brasil.
Paulo César Quartiero (DEM), prefeito de Pacaraima e suposto proprietário da fazenda "invadida", é um dos seis grandes rizicultores que sustentam a resistência contra o decreto presidencial, de 2005, que homologou os 1,7 mil hectares da Raposa/Serra do Sol. A tropa de pistoleiros que fuzilou a manifestação indígena é parte da legião de mercenários que foi mobilizada para bloquear o acesso dos policiais da PF e da Força Nacional de Segurança, através de ações típicas de guerrilha, com a queima de pontes e ataques com bombas incendiárias aos postos de controle do governo federal. Nada disso, porém, merece destaque na mídia, mais preocupada em inflar a tese ridícula de uma suposta conspiração que pretende "internacionalizar" a Amazônia e esquartejar porções significativas do território nacional.
Um ministro do Supremo se sentir à vontade para disparar uma frase tão carregada de ignorância e de indisfarçável sentimento anti-indígena revela a extensão e profundidade da atual onda conservadora que se afirma na sociedade, sob um nada discreto estímulo da grande mídia. Se não for detida, estaremos diante de um retrocesso histórico de amplíssimas e tremendamente graves conseqüências. Tropas de resgate high tech se preparam para fazer, em pleno século XXI, a limpeza étnica que de 1500 em diante lavrou com sangue indígena o terreno no qual um Brasil - país tão rico quanto violentamente desigual - foi construído. Ainda há tempo para erguer as barricadas da resistência. Mãos à obra.
segunda-feira, 5 de maio de 2008
Muralhas da soberania
A exceção fica por conta da Raposa/Serra do Sol, em Roraima, que tem apenas 13% de área de floresta, vítima de décadas de avanço de empreendimentos econômicos ligados ao agronegócio. Entre os devastadores, aqueles famosos seis grandes rizicultores - grandes produtores de arroz - que colocaram de joelhos uma tropa de 500 agentes da Polícia Federal, sob o olhar complacente de ministros do Supremo Tribunal Federal.
Arquivo vivo
Com esta medida, estaria em xeque a versão dos militares sobre a suposta destruição de todos os documentos internos relativos à repressão do movimento armado que o PCdoB organizou entre os anos de 1972 e 1974, com um saldo de quase uma centena de mortos.
Curió, como se sabe, permaneceu ao longo de mais de três décadas na região e hoje é prefeito afastado de Curionópolis, sudeste do Pará. Ele permanece no cargo mesmo após ter sido condenado pelo TRE por compra de votos nas últimas eleições municipais, amparado por uma liminar (decisão provisória) da Justiça.
A secessão boliviana
Apesar dos festejos da direita crucenha (de Santa Cruz), encastelada no governo departamental, a vitória do "sim" acabou maculada pela soma da majoritária abstenção (400 mil eleitores não compareceram às urnas, 40% do total de inscritos) com os votos contrários ao estatuto de autonomia (uma virtual secessão, com o reconhecimento de direitos soberanos sobre as terras e riquezas minerais, por exemplo).
Em meio a rumores de golpe de Estado e a um agravamento dos conflitos políticos, inflados pela mídia de dentro e de fora, é de se esperar tempos de maior turbulência sobre o governo Evo Morales e sua gigantesca tarefa de resgatar a Bolívia e seu povo, majoritariamente indígena, de séculos de servidão.
sexta-feira, 2 de maio de 2008
Au revoir, mes amis!
Na segunda-feira, bem cedo, o Página Crítica volta ao batente. Até lá.
Dialética da esperança militante
Jean Paul Sartre, 1963. Prefácio de "Os Condenados da Terra", de Frantz Fanon.
Ilusões em oferta
O petróleo, riqueza que está na raiz de tantas guerras e desgraças, também já não é mais problema. "Somos auto-suficientes", explode a euforia verde-amarela, impulsionada pelas novas descobertas do megacampo de Tupi, com reservas tidas como gigantescas.
E, para arrematar a pintura de um cenário dourado, coube a Lula anunciar à nação, nesta semana, que o país acabara de receber da agência de classificação de risco Standard & Poor's o investment grade, que qualificou como o reconhecimento da comunidade internacional da solidez e seriedadade da política econômica de seu governo. No rastro da entusiástica fala presidencial, a Bovespa dispara e os comentaristas econômicos da grande mídia, em discurso quase unânime, exultam com o esperado ingresso de mais dólares na economia brasileira e, segundo prevêem, os positivos reflexos em termos da geração de renda e emprego.
Tudo uma maravilha, não fosse a mais descarada manipulação. O que é bom para o mercado - vale dizer, para a gigantesca nuvem de capital parasitário que envolve o globo - é necessariamente o pior dos mundos para os que vivem de seu próprio suor. E isso é verdadeiro em qualquer latitude e sob qualquer regime político. As demonstrações de incontida alegria só têm cabimento para os setores que se beneficiam do cassino especulativo no qual o Brasil foi transformado ao longo das últimas duas décadas, com uma economia desregulamentada e de porteiras abertas ao livre trânsito de capitais que se beneficiam das maiores taxas de juros reais do planeta. Com a mesma facilidade que entram, podem sair também quando esta for uma opção conveniente à realização de seus fabulosos lucros. Isso, aliás, já vem ocorrendo, quando as multinacionais e grandes especuladores procuram repatriar seus ganhos e cobrir, ao menos em parte, os pesados prejuízos da grave crise financeira da economia norte-americana.
Descontada a bazófia de alguns e o agressivo merchandising dos idólatras da atual bolha especulativa, todo esse manancial aparentemente inesgotável de bons presságios pode se desmanchar no ar. No exato momento em que a crise deste sistema intrinsecamente desequilibrado e instável começar a bater em nossa porta.
Marrom por fora. Amarelo por dentro
As digitais tucanas são tão evidentes que até prescindiriam da longa (e, de resto, hilária) entrevista de duas páginas com o senador Mário Couto (PSDB-PA). Mesmo um panfleto partidário deve manter alguma compostura.
Faca amolada?
Como uma "organização" com esse perfil de comando poderia ter atuado, anos a fio, com enorme desenvoltura, cometendo toda sorte de crimes, agindo impunemente por dentro da estrutura policial, sem que outros escalões estivessem envolvidos? Quem lhes dava cobertura e, sobretudo, quem contratava os serviços do grupo?
Para reforçar a sensação de permanecem submersas importantes peças do quebra-cabeça, também não se ouvir mais falar no envolvimento do juiz Alan Meireles, para quem o cabo PM Rosevan Almeida prestava serviços de "segurança".
Diante da promessa do Segurança Pública, Geraldo Araújo, de que outras "Navalha na Carne" virão, espera-se que desta feita a lâmina possa estar um tanto mais amolada e em codições de cortar mais profundamente nas áreas necrosadas do aparato policial paraense.