segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Poder paralelo

Um crime de sangue, mais um dentre tantos que mancham o final de semana na Grande Belém, deveria chamar despertar maior interesse das autoridades policiais. Há muito que negócios supeitos e ligações perigosas se entrecruzam na guerra surda pelo controle do lucrativo mercado do transporte clandestino na capital.
A execução a sangue frio do vice-presidente de uma cooperativa de vans que atua em Outeiro por ser apenas um sinal. Um perigosíssimo sinal de alerta. Resta saber que existe alguém que tenha interesse legítimo de colocar a mão nessa cumbuca envenenada.

domingo, 29 de novembro de 2009

Homem ao mar

A cúpula dos Democratas se prepara, sem a menor cerimônia, para desembarcar de qualquer tentativa de defender o único governador do partido, o mais que enrolado José Roberto Arruda, aquele flagrado em filmetes de corrupção explícita. Os "esclarecimentos convincentes" que os cardeais do DEM dizem querer obter não virão. Aliás, o risco, o grande risco, aliás, é que haja uma contaminação de outras seções do partido pela nem um pouco modesta máquina de fazer dinheiro montada às custas dos cofres do Distrito Federal.

Uma voz que se levanta

Surfando na forte pressão dos ruralistas e da mídia conservadora, prossegue a ocupação militar em vastas áreas do sul e sudeste paraense. Com a cobertura quem vem de cima, as tropas sentem que estão de mãos livres para agir. Isto significa apenas uma coisa: os sem terra, inclusive mulheres, idosos e crianças, já estão sentindo na própria carne o peso da chibata que age para recordar a quem serve verdadeiramente o aparato repressivo do Estado.
Mas nem todos pactuam com o silêncio que chancela a barbárie. Frei Henry des Roziers, advogado da Comissão Pastoral da Terra (CPT) naquela conflagrada região, não dá qualquer sinal de que pretenda abandonar sua trincheira profética em defesa dos humilhados da terra.
A denúncia que faz das últimas ações criminosas de policiais (e de jagunços, simbioticamente reunidos sob a bandeira do latifúndio e do agronegócio) deveria cobrir de vergonha executores e mandantes desta razia contra a legião de párias brasileiros.

Dialética dos profissionais da morte

"(...)

A noite naquela banda do Camacã é de treva nas trevas. Os jagunços dariam o alvo com a fogueira que acenderiam. Vendo a claridade, aproximaram-se e não tardaram a verificar que enterravam os mortos. A morte, no instante, voltou a matar na descarga de seus rifles. Seis ou nove caíram e o pânico, nos nervos exaustos, provocou a confusão. Atirando e movendo-se, protegidos pelos troncos das árvores, tornaram a fogueira inútil. Sem guias, não sabendo quem visar, vendo homens caídos e escutando os gemidos e as pragas, os jagunços debandaram em desordem. Internavam-se no Camacã para ser devorados pelos cães danados."

Adonias Filho, jornalista e escritor brasileiro (1915-1990). Corpo Vivo (Civilização Brasileira, Quarta edição, 1971, p.46).

sábado, 28 de novembro de 2009

Balão furado

Na defesa do indefensável é preciso agregar uma boa dose de ardil, sem falar na inesgotável capacidade de criar incidentes para levar ao limite extremo todas as brechas no labirinto jurídico. Diga-se, entretanto, que esse privilégio está sempre reservado aos que podem pagar - e pagar muito bem - ótimos advogados criminalistas.
Parece ser esse o caso do ex-deputado Luiz Afonso Sefer, eleito pelo DEM e atualmente filiado ao PP, processado pelo crime de abuso sexual contra uma criança de apenas 9 anos.
Mas nem sempre a esperteza processual resulta em ganhos duradouros. O tiro, muitas vezes, sai pela culatra e não serve para nada, ou, na melhor das hipóteses, serve apenas para adiar o inevitável.
A defesa de Sefer na audiência judicial realizada ontem (27), em Belém, buscou mudar os rumos da investigação trazendo uma suposta testemunha-bomba. Trata-se da irmã da adolescente violentada, ela própria vítima de abusos por parte do pai, com quem tem um filho fruto de incesto . A jovem de 17 anos insinuou que "talvez" sua irmã também tivesse sido vítima de abusos paternos. A intenção era clara: trazer para os autos um novo acusado, retirando o foco do médico e ex-parlamentar, aliás que encontra-se em plena e acintosa campanha para reconquistar uma cadeira na Assembleia Legislativa no próximo ano.
A manobra foi prontamente rechaçada pela juíza da Vara de Crimes contra Crianças e Adolescentes de Belém, Maria das Graças Alfaia Fonseca, para quem o único réu no processo é mesmo Luiz Sefer, que não terá qualquer desculpa para não comparecer em juízo e prestar depoimento no próximo dia 7 de dezembro.
Após o recesso forense, lá pelo início de fevereiro, sairá a sentença. Espera-se que, sem choro nem vela, a decisão sirva para transmitir à sociedade que o uso e o abuso do poder econômico e político não deve ser mais instrumento de impunidade para quem quer que seja.

sexta-feira, 27 de novembro de 2009

Nas margens de Aqueronte

O governador do DF, José Roberto Arruda (DEM), sentiu hoje o calor das primeiras labaredas de um incêndio político de enormes e imprevisíveis consequências.
Na busca de uma delação premiada, um secretário do governo demo resolveu abrir o bico e denunciar um suposto esquema de distribuição de propina.
As buscas e apreensões promovidas pelos agentes da PF, inclusive na casa do governador, só antecipam o que pode ser o 1º círculo do inferno, onde se localiza Aqueronte, o rio do infortúnio.
O que vai passar por baixo da ponte, com um provável odor de patifarias em série, pode atingir em cheio - e de forma fatal - a ascendente carreira de Arruda que pleiteia a reeleição. Ou não, já que é cada vez menor o grupo dos que podem atirar a primeira pedra.

Flagrante delito

O discurso da tão proclamada sustentabilidade da siderurgia paraense não resiste à mínima fiscalização. Mais uma vez usinas instaladas em Marabá são flagradas alimentando seus fornos com carvão vegetal de origem ilegal.
Deveria ser motivo de escândalo tanto a recorrência no método sabidamente predatório quanto a desfaçatez que impregna a propaganda institucional custeada pela Cosipar e por outras tantas indústrias igualmente sujas. Sujas, sem dúvida, mas muito bem lavadas e enxaguadas pela sempre bem paga boa vontade dos grandes veículos da mídia paroara.

O avô do mensalão

Pouco a pouco vai aparecendo mais uma ossada no interminável pântano representado pelo esquema ilegal de financiamento de políticos no Brasil. Como sempre, surge a digital de uma grande empreiteira, no caso a Camargo Correa, flagrada pela PF durante a Operação Castelo de Areia.
Suspeitíssimas planilhas (correspondentes ao propinoduto que funcionou entre 1995 e 1998) apreendidas durante a investigação deixam em maus lençóis a tucanagem paulista, além de citar a alcunha de outro beneficiário da mamata, identificado apenas por "Turco".
Definitivamente, os executivos da Camargo Correa não podem ser acusados de excesso de criatividade. Isso não.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A voz da razão

Bernard-Henri Lévy é uma verdadeira legenda. Sua voz não se levanta por qualquer causa, nem costuma se dispersar em torno de situações duvidosas.
O engajamento do filósofo francês (nascido na Argélia) pela causa da libertação do escritor e ex-ativista italiano Cesare Battisti remonta às melhores tradições do humanismo que tanto marcou a vida e a luta generosa de gerações de homens e mulheres durante o curto (e trágico) século 20.
Sua carta ao presidente Lula, publicada na edição de hoje da Folha de São Paulo, apelando pela não extradição de Battisti, merece ser lida, sobretudo por aqueles que ainda permanecem contaminados pela odiosa (e insidiosa) campanha que quer ver o italiano terminar seus dias no fundo de um cárcere de evidente inspiração fascista.

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Rassenkampf

Após o holocausto da II Guerra Mundial, sob o impacto do extermínio de milhões e milhões de judeus, ciganos, comunistas, eslavos e outros tantos indesejáveis para o 3º Reich, a indignação e o pavor que percorreu todo o planeta deixou como herança a Declaração Universal dos Direitos Humanos, há quase 61 anos.
A guerra racial (rassenkampf) de Hitler, paradoxalmente, havia servido para despertar a mais profunda repulsa diante de quaisquer atrocidades cometidas sob a imunda bandeira da faxina étnica.
É claro que isso não foi suficiente para varrer os massacres e pogroms, que continuaram a acontecer em todas as latitudes e sob os mais diversos disfarces e álibis. Mas, agora, essas práticas odiosas ficaram para sempre marcadas como crimes de lesa humanidade.
Pois bem. No Brasil, nas vastas terras do Mato Grosso do Sul, há décadas se pratica um etnocídio contra os Guarani-Kaiová. Guerra surda, silenciosa, mas mortífera e eficiente.
Lá, naquelas imensidões hoje cercadas pelo gado e pela soja, mata-se pela fome e pelo aço disparado pela pistolagem. E a resposta das autoridades permanece sendo um olhar aparvalhado, como se nada disso nos dissesse respeito.
O último massacre - o sequestro e assassinato de dois jovens educadores indígenas - deveria causar um escândalo nacional. Deveria - mas não vai, fiquem certos - mobilizar os altos escalões, nem desembarcará naquele Estado onde impera a máfia do agronegócio e da grilagem, nenhum contingente da Força Nacional com suas boinas vermelhas.
Não, o que se verá, infeliz e tragicamente, é a repetição do silêncio. O silêncio dos cúmplices.

domingo, 22 de novembro de 2009

Uma canção para a hora de acordar

O Brasil sob a mordaça das 11 oligarquias que controlam o bilionário mercado da comunicação é o mesmo que, nos últimos cinco anos, fechou, com requintes de crueldade policial, 6.716 rádios comunitárias, abrindo 3.118 processos judiciais contra essa nova categoria de insurgentes midiáticos.
Diante disso, falar em liberdade de expressão, como tanto se faz nos editoriais da grande imprensa, chega a ser uma indecência e mais um bom motivo para conhecer o excelente e oportuno Levante sua voz, do cineasta Pedro Ekman, produzido pelo Intervozes Coletivo Brasil de Comunicação Social com apoio da Fundação Friedrich Ebert Stiftung.

Crepúsculo

O mundo dá mesmo muitas e intrincadas voltas. Só isso para explicar que o Diário do Pará, órgão oficial dos interesses comerciais e políticos do clã Barbalho, abra neste domingo manchete de primeira página (Jatene: "tenho apoio do PSDB e do povo"), com o inequívoco objetivo de inflar o balão do virtual (e auto-proclamado) candidato tucano ao governo do Estado em 2010.
Que ninguém se engane: não se trata de uma recaída de objetividade na editoria política do jornal. Antes, muitíssimo pelo contrário. A entrevista de página inteira serve mesmo para mandar um poderoso recado sobre as múltiplas possibilidades de movimentação do PMDB no próximo ano. É uma forma nada delicada de aproximar uma faca bem afiada para mais próximo da jugular do petismo encastelado no Palácio dos Despachos e cada dia mais refém do vale-tudo em que voluntariamente se enredou.

sábado, 21 de novembro de 2009

Dialética dos levantados do chão

"Do destino dos deserdados, em tais brenhas, fale por nós a história de Antônio Conselheiro. Não tinha terra, gado, riqueza de espécie alguma, nem sequer mulher. Foi degolado. Lampião tinha mulher e dinheiro, mas não tinha uma beirada de terra onde descansar a cabeça. Foi degolado.
O santo e o bandido, cada um a seu modo, foram uma reação à prepotência do meio. Porque a terra era, de fato, o exílio insuportável, o morto bem-aventurado sempre."

Nertan Macedo (1929), escritor cearense. Capitão Virgulino Ferreira: Lampião (1959, p. 35).

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

Mentiras que parecem verdade

O fascismo está morte e enterrado. Está? Ou será que perambula por aí, como um morto-vivo, às vezes demonstrando uma vitalidade que muitos julgavam extinta?
O caso Cesare Battisti e suas apaixonadas repercussões - aqui e no velho continente - deve servir de sinal de alerta.
Ninguém melhor do que Umberto Eco para expor a profundidade dessa ferida italiana.

A dança do cisne

O STF acolheu mais uma denúncia contra o Wladimir Costa (PMDB-PA). É a terceira ação penal aberta para investigar possíveis crimes cometidos pelo radialista, dançarino e íntérprete de brega music, proprietário de uma emergente rede de rádios espalhadas pelo interior paraense e, nas horas vagas, obscuro frequentador do plenário e das comissões da Câmara dos Deputados.
A investigação é por peculato, um pecadilho, digamos assim, diante do que pode ser descoberto se o parlamentar for efetivamente submetido a uma investigação séria e profunda.
De qualquer forma, pode ser um começo. O demônio, é sempre bom recordar, adora mesmo é se abrigar nos detalhes.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

Cheiro de queimado

Um acordão entre o governo e os ruralistas para revisar o Código Florestal. Adivinhem quem vai pagar a conta.

Na marca do pênalti

Agora está nas mãos do presidente Lula. A ele, e somente a ele, cabe decidir os destinos do escritor e ex-ativista italiano, Cesare Battisti.
A sessão de ontem (18) do Supremo Tribunal ederal (STF) foi uma das mais tensas e disputadas dos últimos anos. O ardor e o quase destempero dos ministros que defendiam a extradição a qualquer custo deu a dimensão exata da paixão político-ideológica que dominou todo esse tumultuado julgamento.
O ministro-presidente Gilmar Mendes, com seu estilo de capataz enfezado, ainda tentou manobrar e, num golpe de mão, subverter a nova maioria formada para afirmar que a decisão da extradir o italiano não era impositiva ao presidente da República. Bola fora. Gol de mão, todos sabem, não vale. Mas é prorrogação ou quem sabe nos pênaltis que essa partida será decidida.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Você me prende vivo, eu escapo morto

21 de janeiro de 1971. O ex-deputado Rubens Paiva foi arrancado de sua casa por homens de metralhadora em punho e submergido nas trevas do aparato repressivo do regime militar. Até hoje, quase 40 anos depois, permanece como desaparecido. Seu corpo jamais foi encontrado.
O véu de mentiras e de silêncio começa a ser rompido. Um ex-agente do nefasto DOI-Codi resolveu abrir o bico. Marival Chaves, à época sargento do Exército e analista de informações do Doi-Codi em São Paulo, em depoimento ao cineasta Jorge Oliveira para o filme "Perdão, Mister Fiel", admite saber os nomes dos torturadores que mataram Paiva e depois esquartejaram seu corpo. Havia, segundo ele, uma espécie de disputa macabra entre as diversas equipes para saber quem conseguia reduzir as vítimas em um menor número de pedaços.
Estas e outras histórias terríveis devem vir à tona, bastando que alguém - no Judiciário ou no Parlamento - chame para si a inadiável tarefa de lançar um facho de luz neste canto pavoroso do passado recente de nosso país.

O nome do fracasso

No último ano, com o agravamento da crise econômica global, o número de famintos pulou de 850 milhões para mais de um bilhão de pessoas. A agência da ONU para a Agricultura e Alimentação (FAO) reconheceu o fracasso na última Cúpula realizada em Roma: a meta de reduzir pela metade a fome no mundo até 2015 está definitivamente prejudicada. O motivo é simples: os países ricos (e os tais emergentes) arrombaram os cofres para salvar bancos e grandes indústrias - no mínimo 10 trilhões de dólares até o final de 2009 -, enquanto não se conseguiu amealhar os US$ 44 bilhões que seriam necessários para erradicar definitivamente a pobreza no planeta.
A Via Campesina, articulação internacional de movimentos de pequenos agricultores, coloca o dedo na ferida. As transnacionais, lideradas pela poderosa Nestlé com suas 276 fábricas em 86 países nos cinco continentes, que controlam o lucrativo mercado global de alimentos têm enorme responsabilidade no agravamento deste quadro. E não adianta cobrir a política de rapina que promovem com o brilhante verniz da "sustentabilidade" e do pretenso compromisso com os chamados "Objetivos do milênio".

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Minha casa, meu pesadelo

Israel não se detém por nada. Acaba de anunciar a construção de mais 900 casas para colonos judeus em pleno território ocupado da Cisjordânia. É a continuidade de um projeto neocolonial que retroalimenta a violência e o derramamento de sangue.
Os protestos internacionais - sinceros ou apenas protocolares - serão mais uma vez inúteis.

A alma do (mau) negócio

Que ninguém critique o governo Ana Júlia pela falta de ineditismo. Isso, não, por favor.
Afinal, qual o governo que utiliza seu caro espaço de mídia paga na TV para propagandear - ora, vejam - mais de uma centenas ações de despejo de famílias sem terra e sem teto. Ou, se quiserem dourar a pílula amarga, "reintegrações de posse" realizadas de forma supostamente pacífica e sem violência.
Sem violência? Querem apenas dizer que não há mortos estirados no chão. Encontrou-se um método mais asséptico e quem sabe mais eficiente para que a "limpeza étnica" siga o seu caminho.
Não se fala, até porque seria mentir demais, no oferecimento de qualquer alternativa de sobrevivência às famílias despejadas. Elas não foram, porém, desintegradas pura e simplesmente. Estão por aí, famintas, maltrapilhas, com os olhos injetados de dor, decepção e revolta, passando sol, chuva e fome na beira das estradas. Sob lonas pretas, aguardam. Até o próximo confronto ou a próxima tragédia, não se sabe.


segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Depois das horas

Com Cesare Battisti em greve de fome e o mais que provável desempate no Supremo Tribunal Federal (STF) em favor da extradição, com o voto de minerva do ministro Gilmar Mendes, resta ao presidente Lula escolher entre adotar uma postura que salvaguarde a soberania e o decoro do Estado brasileiro, mantendo o refúgio concedido legalmente, ou se vergar às pressões da direita de todas as latitudes, agindo como um moderno Poncius Pilatos.
Mas existe uma última esperança: se for confirmado o entendimento que a palavra final nestes casos cabe mesmo ao Poder Executivo, com a decisão do STF funcionando como um mero indicativo, Lula poderá se sentir em condições de contrariar a maré montante do conservadorismo da mídia e do Judiciário. Resta torcer para que ele tenha tutano para isso.

O milho da discórdia

No próximo ano, a maior parte da safra de milho no Brasil será transgênica, um crescimento vertiginoso.
Monsanto, DuPunt/Dow e Syngenta dominam tudo, sob as bençãos da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). E pensar que a porteira foi aberta há apenas dois anos , quando as primeiras variedades comerciais foram aprovadas por interferência direta do Palácio do Planalto, leia-se, Lula e Dilma, os maiores responsáveis por esta operação bilionária.

domingo, 15 de novembro de 2009

Mestres de luminosas manhãs

A publicação, pela Universidade do Estado do Pará (UEPA), de Primeira Manhã, obra magistral de Dalcídio Jurandir em pleno ano do centenário do nascimento do grande escritor paraense, merece registro e elogio. É uma contribuição efetiva à cultura nacional, sem dúvida. Mas ainda é pouco diante da grandeza da obra deste marajoara ímpar, homem que soube viver na coerência de ser ele e as circunstâncias de seu tempo. Por décadas a fio rememorizou o Marajó e suas gentes, com a sensibilidade que só se encontra nos melhores poetas e naqueles que dedicam a existência à busca de uma terra sem amos.
E é justamente deste livro, cuja primeira edição data do distante 1968, que Benedicto Monteiro, outro grande escritor paroara morto no ano passado, realizou uma de suas mais interessantes incursões pelas sendas da poesia. Em O Cancioneiro de Dalcídio (Falângola/PLG Comunicação, 1985, 135 páginas, esgotado), a prosa dalcidiana se transforma em peças de poesia, lapidadas por um ourives igualmente genial.
Enquanto esta manhã de domingo já vai alta, uma breve degustação para atiçar o gosto pela leitura do que há de melhor na literatura brasileira produzida nesta terra grávida de tantas belezas:

De Dalcídio Jurandir (Primeira Manhã, p. 17):

(...)
professor, dissolvidos no rosto de um peixe azulado de gelo e barba, a lição escorria. Os óculos faiscavam, refletindo velhas águas do chalé, o rio no sol das duas da tarde; antigos olhos de menino pela beira da dágua: a lição distância a se. Terá visto uma vez o reflexo de um raio no rio, a água clareando pelo fundo, a canarana, um peixe-boi boiou encadeado. Que estou fazendo aqui, quem marcou este encontro entre estas criaturas e aquele gelado peixe de óculos? Que entendimento a de sair deste ouvir de muitos e daquele falar de um só. Que está fazendo aqui, lhe disse a mãe ao apanhá-lo conversando com a Eunice, em Muaná. De novo o vago gesto de tédio e impaciência do peixe em seu aquário, riscando o quadro negro. Alfredo tentava compreender. Palavras brancas cobriam-no de cinza e perplexidade. Cinza nas cabeças, ombros, perfis, silêncios, nucas, o lápis da branquinha desenha a própria distração, tocou a corneta dos bombeiros. Sobre este raio que lhe queima o peito, jorre então a mangueira dágua. Esponja no quadro, giz na ponta do dedo como a própria unha, o...

De Benedicto Monteiro (O Cancioneiro de Dalcídio, p.59):

A aula na escola da várzea

Os óculos faiscavam
refletindo velhas águas
o sol no rio
e os olhos de menino.

Terá o professor
visto uma vez
o reflexo de um raio
a água lariando
e o peixe-boi boiando
encandeado?

Quem marcou este encontro
entre crianças
e este peixe azul
de gelo e óculos
riscando neste quadro?

Que entendimento
há de sair deste ouvir
de muitos
e daquele falar e falar
de um só?

As algemas da barbárie

A prioridade máxima da da Polícia Civil paraense, desde a semana passada, é atuar como extensão das milícias mantidas pelo latifúndio, pela grilagem e pelo agronegócio no sudeste e sul do Estado. É para lá que consideráveis recursos humanos e materiais são canalizados, além das tais ações de "inteligência", que revelam o recrudescimento de métodos de controle e intimidação dos movimentos sociais só equiparáveis aos tristes tempos da ditadura militar.
Por isso, é pouco provável que chefes e chefetes de vários escalões estejam atentos para o que está ocorrendo bem debaixo de seus arrogantes narizes. Violência, tortura, corrupção, tudo em escala cada vez mais acintosa, enodoando a instituição que deveria ser uma retaguarda segura para os direitos dos cidadãos ameaçados pela espiral de criminalidade.
O flagelo a que foram submetidos dois homens suspeitos de furto nas mãos de policiais civis da região do Salgado deve servir de alerta para a iminente falência de todo o sistema estadual de segurança. Alguém ainda duvida? Então veja os detalhes de uma história de terror que está longe, muito longe, de ser apenas um caso isolado.

"It's the economy, stupid"

Antes de sair por aí soltando fogos de alegria e virando figurante no filmete publicitário patrocinado pelo governo federal, é bom ler, aqui e aqui, algumas das hipóteses que explicam a brusca queda no desmatamento na Amazônia.
E se é verdade que o principal vetor da destruição segue sendo a pata do boi, convém mesmo colocar as barbas de molho. Lula já teria batido o martelo numa nova - e mais indecente - prorrogação do prazo para que os ruralistas comecem a pagar pelos crimes ambientais cometidos nos últimos anos contra a reserva legal de suas propriedades. A decisão, se confirmada, pavimenta o caminho para o apoio - ou, quando menos, para a relativa neutralidade, na corrida eleitoral de 2010, de um bom punhado de políticos cujos mandatos sua pura extensão dos currais e das cocheiras do agronegócio verde e amarelo.

sábado, 14 de novembro de 2009

O embargo mata. Impunemente.

A voz insuspeita da Anistia Internacional se levanta contra o bloqueio contra Cuba. E cobra, com todas as letras, que Barack Obama passe da retórica - limita e insuficiente - para a indispensável ação.

O carteiro e o poeta

A nota do PT paraense declarando solidariedade ao MST e criticando a prisão de lideranças que lutam pela reforma agrária tangencia uma questão fundamental: o pedido de prisão dos ativistas partiu de ordem direta da governadora do Estado, Ana Júlia, filiada ao partido. A Justiça, sempre obsequiosa quando se trata de defender o sacrossanto direito à propriedade, apenas acatou a solicitação, com a celeridade característica só havida diante de acusados que trazem na face a marca da pobreza.
Sobre este fato, de resto incontestável, nenhuma linha sequer. Um silêncio que, no mínimo, põe em dúvida as supostas boas intenções dos signatários da nota.
Enquanto isso, a polícia da governadora segue diligenciando por assentamentos, estradas e ramais no conflagrado sudeste do Pará. Buscam prender Charles Trocate, Maria Raimunda e outros líderes do movimento, reduzidos de repente à condição de "foragidos" da Justiça.
Onde estiver, Trocate, um poeta de mão cheia, deve estar refletindo sobre os tortuosos caminhos que as cercas da injustiça percorrem para impor o terror e o medo.
Lá longe, seus olhos devem poder ver, no lusco-fusco deste entardecer amargo, que apesar de tudo, já vem se insinuando os primeiros sinais do alvorecer. Mas não é uma luz qualquer aquela que se prenuncia carregada da sublime força do sorriso de crianças insubmissas.

Dialética dos limites da criação

"A máquina literária. Como é recorrente o desejo de uma criação absoluta, sem a possibilidade de erro, o acordo entre a ideia e seu juízo, entre um sentimento e sua imagem, entre uma vontade e sua projeção e sua práxis. O literário resulta da combinação de heterogeneidades em potencial com heterogeneidades em ação. Uma só dessas duas operações já está acima das possibilidades do homem. É por isso, talvez, que o escritor continua."

Julio Cortázar (1914-1984). "Diário de Andrés Fava" (1997, José Olympio, p.36)

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Garrote vil

Placar empatado e o voto final - de minerva - na mão de Gilmar Mendes. Não poderia mesmo haver pior dos mundos para o ativista Cesare Battisti, virtualmente condenado pelo STF a retornar aos cárceres nada democráticos do cléptopolítico Sílvio Berlusconi. Lá, sob holofotes hidrófobos, a cela do revanchismo lhe aguarda para que seja cumprida a polêmica pena de prisão perpétua por crimes cuja autoria jamais foi definitiva e limpamente comprovada.
Só os ventos conservadores dominantes, em ambiente quase irrespirável onde pontifica soberana a clivagem ideológica macaqueada de solene imparcialidade, podem explicar como e por que a mais alta corte do país resolve, pela maioria de seus membros, vergar a espinha em gesto de indecente vassalagem às pressões ostensivas dos camisas negras italianos e de seus congêneres nacionais.
Triste quadro de um tempo que faz lembrar outro julgamento famoso, nos estertores do franquismo, quando um jovem revolucionário catalão, Salvador Puig, conheceu, na sua agonia final, como funcionava a maquinaria do terror, made in Spain.
Qualquer semelhança entre o destino trágico de Puig, no corredor da morte naquele 2 de março de 1974, e o de seu contemporâneo italiano, irmãos das loucas jornadas daqueles anos de chumbo, não terá sido, infelizmente, mera coincidência.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

The Flash

Quem foi que disse que a Justiça é lenta?
A cassação supersônica da liminar que suspendia o licenciamento de Belo Monte prova o contrário. Os interesses que estão em jogo, aberta ou veladamente, explicam a impressionante agilidade.

Isso você não verá na TV

Sob o governo Uribe mais de 500 sindicalistas foram assassinados na Colômbia. Desde 1991, 2500 lideranças pereceram sob as balas dos esquadrões da morte.
Frei Betto desvela a face cruel do regime de terror implantado e sustentado pelos dólares dos Estados Unidos.

O dia depois de amanhã

A catástrofe do desemprego assola a Europa, devastando milhões de lares, arremessando seres humanos à abjeta situação de indigentes.
Esta é a crise capitalista em toda sua feição pornográfica que, aliás, não respeita fronteiras, esmagando o mundo inteiro, de cima abaixo.
Os mesmos "especialistas" que produziram a desgraça, do alto de sua arrogância congênita, são os que prescrevem o suposto remédio. É claro que não vai dar certo. Pelo menos, não dará certo para a grande maioria que vive de seu próprio trabalho, reduzida a estoque de reserva que força o valor do salário para um subsolo cada vez mais profundo.
Mas há os que se levantam. E gritam. E protestam erguendo antigas - e sempre atuais - bandeiras.
José Saramago, do alto de seus 87 anos, mais jovem e ainda mais radicalmente rebelde, não deixa pedra sobre pedra. Confira.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Efeito Ofélia

O delegado geral de Polícia Civil do Pará, Raimundo Benassully Neto, é uma pessoa que só abre a boca quando tem certeza.

Há quase dois anos, em plena Comissão de Direitos Humanos do Senado, ele teve o desplante de insinuar uma suposta "debilidade mental" da adolescente que havia sido brutalizada, por intermináveis 20 dias, por dezenas de detentos numa delegacia no município de Abaetetuba. Diante da imediata e bombástica repercussão da, digamos assim, incontinência verbal e intelectual do delegado, restou a ele apenas o caminho da entrega do cargo, antes que o escândalo assumisse proporções incontroláveis.

O mundo deu suas costumeiras voltas, e um belo dia o delegado Benassully é reconduzido ao seu antigo posto. Como policial, não há dúvida, que ele tem se mostrado um exímio porta-voz do governo Ana Júlia, talvez um tanto desastrado, mas, de toda forma, demonstrando uma sinceridade enternecedora.

É por isso que não deve causar estranheza a performance do delegado geral neste último - e quase fatídico - incidente envolvendo centenas de trabalhadores sem terra, na muito emblemática Curva do S, em Eldorado dos Carajás. Por pouco, mas por muito pouco, não ocorria mais um massacre e a responsabilidade direta seria creditada a ele e mais acima para quem teve a brilhante ideia de designá-lo para a missão de desbloquear - ao que tudo indica "a qualquer custo" - a rodovia PA-150. Esse "a qualquer custo", que ninguém esqueça, esteve na gênese da carnificina de 17 de abril de 1996. O tempo passa, os personagens se alternam, mas a grosseria e o despreparo parecem se impregnar em poderosas cadeiras de determinados salões palacianos.

A tomar por verdadeiros os argumentos esgrimidos por Benassully em resposta à indignada nota da CPT de Marabá, temos um cenário de "guerra contra o terror", uma espécie de estrada para Kandahar às margens do rio Tocantins. O advogado da CPT, José Batista Afonso, é pintado como um tipo interessado em provocar uma "nova tragédia na curva do S" e para tanto capaz de utilizar crianças como "escudos humanos" e os demais trabalhadores como "bucha de canhão". Faltou dizer que a CPT se transformou numa célula da Al Qaeda.

Antes que seja tarde é preciso que apareça alguém capaz de determinar que o prestimoso delegado abandone, o mais rápido possível, esse esquisito papel de bombeiro que tenta apagar as chamas do conflito despejando gasolina.

As pernas curtas da mentira

Uma manchete nunca é inocente. Vejam esta aqui na primeira página de O Liberal de hoje: "Belo Monte para. E seis estados ficam no escuro.". Muito bem. Quer dizer que a paralisação do licenciamento de Belo Monte, decidida ontem (10) pela Justiça Federal em Altamira deu (ou pode dar) causa a um apagão nacional. O conectivo "e" entre as duas frases induz a um erro cavalar. Ou melhor: relaciona dois fatos que não possuem qualquer conexão entre si. De fato, joga-se, sutilmente, mais um grão de areia na construção de uma falácia, que serve de verniz ideológico para justificar um dos maiores ataques contra a socio-biodiversidade amazônica.
Para os incautos, anote-se: no projeto atual de Belo Monte não há previsão para que a energia a ser gerada (?) após o estupro da Volta Grande do Xingu seja interligada ao sistema nacional. Esses linhões sequer foram orçados, mas já se sabe que, se um dia vierem a ser construídos, terão um custo astronômico. A pouca energia firme, produzida durante os meses de cheia do rio, irá diretamente abastecer, em sua grande parte, as plantas do complexo do alumínio, para a alegria da Vale, Alcoa et caterva.
Quanto ao apagão de ontem todo mundo é livre para abraçar qualquer uma das teorias que começam a circular. Desde a simples falha técnica em Itaipu - a mais provável - até o mirabolante ciber-terrorismo, como alertou nestes dias um comunicado da Casa Branca.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

Contra todos os muros

Enquanto os donos do poder se deleitavam no convescote alusivo ao 20º aniversário do muro de Berlin, na Palestina um oportuno e corajoso protesto chamava a atenção mundial para um dos mais indecentes escândalos do atual século: o muro de mais de 700 quilômetros que Israel constrói em pleno território palestino ocupado para consolidar sua odiosa política colonial.

Coke is it!

O lado Coca-Cola da vida... que nenhuma propaganda teria a coragem de mostrar. Toda vez que tomar um gole de Coca-Cola no Brasil você estará dando, mesmo que involuntariamente, uma mãozinha no processo de devastação da Amazônia. Saiba porque, aqui.

Piromaníacos

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) coloca a boca no trombone: o governo petista de Ana Júlia, no Pará, brinca perigosamente com o fogo. No afã de se mostrar confiável aos setores mais retrógrados, que cobram o incremento da repressão às mobilizações de sem terra, repete-se a mesma sandice que marcou, para sempre, a biografia de Almir Gabriel, naquele trágico 17 de abril de 1996.
A história, que ninguém duvide, pode se repetir numa voragem ainda mais ampliada de sangue, pólvora e tragédia. Ainda mais quando a truculência toma o lugar do bom senso.

Choro e ranger de dentes

Um duro golpe, uma derrota de enormes proporções. A turma do prefeito Duciomar ainda deve estar atordoada, zonza, sem saber o que dizer quando voltar para casa. Afinal, ver seu projeto da super-privataria naufragar assim, sem a menor cerimônia, deve ter sido muito doloroso. Ainda mais por placar tão elástico: 18 contra 12 votos, e algumas abstenções envergonhadas.
Com a votação surpreendente realizada na manhã de ontem (9), a tentativa de privatizar os serviços de água e esgoto - além de uma enorme gama de outras competências municipais - parece ter soçobrado definitivamente. Definitivamente?
Aguarde-se o que vem por aí.
Novas marmotas, velhas manobras palacianas. Tudo pode acontecer.
Perder uma bolada às vésperas do Natal, quando a festança já estava preparada, com o champanhe geladinho apenas esperando para ser saboreado, azeda o humor de qualquer um.
O fracasso, como se sabe, não costuma ser um bom conselheiro.

domingo, 8 de novembro de 2009

Um zoom na devastação

Quase de 90% de toda madeira extraída no Pará tem origem ilegal. A conclusão é de um recente estudo, baseado em fotos de satélite, produzido por pesquisadores do Imazon (Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia).
A estimativa oficial era de que 10% da produção madeireira seria ilegal. Uma falha gigantesca, que põe a nu a completa falta de controle do Estado diante dessa atividade econômica predatória.

Raposas em ação

Quando o governo Lula entregou a Funasa e seus bilhões para que os cartolas do PMDB cuidassem não poderia crer em milagres. Deste encontro, entre a oportunidade e a vontade de comer, não poderia dar em outra coisa senão na mais deslavada corrupção.
O Estadão de hoje investiga as relações perigosas de Guaracy Aguiar, irmão do presidente do TCU, pilhado em a boca na botija à frente da Funasa no Ceará. É só a pontinha do novelo, um aperitivo na farra que parece não ter fim.

sábado, 7 de novembro de 2009

O que está ruim pode sempre piorar

Que tal uma anistia ampla e irrestrita para quem desmatou a reserva legal e destruiu áreas de preservação permanente até 2006? Um absurdo? Para a bancada ruralista na Câmara Federal isso não é só justo como desejável. Os deputados do latifúndio e do agronegócio trabalham pela aprovação dessa medida às vésperas do fim do último adiamento - agora em dezembro - de mais um prazo para que as multas contra os devastadores seja finalmente cobrada.
O governo Lula, refém voluntário dessa matilha, assiste tudo de camorote.
Se o golpe der certo - o que até agora parece não tão provavel assim - os operadores do presidente Lula sempre podem colocar a culpa nos setores atrasados do campo brasileiro, que, não tão estranhamente assim, estão quase todos aboletados em partidos da base de apoio governista.
Em todo caso, quando dezembro chegar, na undécima hora, pode surgir um decreto salvador, concedendo um novo e precário prazo. Tudo em nome da "governabilidade", palavrinha mágica para justificar os mais odiosos embustes.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

A velha face do terror

Depois de alguns anos em aparente submersão, reaparece à luz do dia a tristemente famosa União Democrática Ruralista (UDR). E vem falando grosso, ameaçando processar o governo do Pará pela suposta não realização de despejos de áreas ocupadas por famílias sem terra.
Um certo Luiz Antonio Nabhan Garcia, grande fazendeiro no interior paulista e presidente da entidade, toma as dores do banqueiro Daniel Dantas e de sua mega-grilagem de 510 mil hectares encravada nas vastidões do sul e sudeste paraense.
Nada mais óbvio: a Agropecuária Santa Bárbara e seu exército de mercenários armados até os dentes bebe na fonte contamidada da UDR, que há décadas se especializou em tratar os conflitos agrários na ponta do fuzil.
Por sua parte, o MST denuncia que nos últimos meses 18 trabalhadores foram baleados por homens da Santa Bárbara. O rastro de sangue e os sinais de explosão social estão aí para quem tiver olhos para ver.
O resto, como se sabe, faz parte do insensato jogo dos que que brincam com o fogo da tragédia iminente.

Um mar que está sempre para peixe

Sai um acusado de compra de votos, entra um acusado de, pelo menos, 200 delitos, com destaque para a sonegação fiscal.
A folha corrida do novo senador por Rondônia, Acir Gurgacz, do PDT, é de fazer inveja.
Assim é o Senado brasileiro, com o seu vasto e diversificado cardume de políticos-tubarões.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Crime de Estado

Decisão exemplar de juízes italianos condenou duas dezenas de ex-agentes da CIA pelo crime de sequestro e tortura contra um cidadão egípcio, arrancado do solo italiano em 2003 e levado a um centro de tortura em seu país.
Os réus foram julgados à revelia e a relação dos culpados apresenta uma evidente lacuna: lá deveriam figurar, entre outros, o ex-todo poderoso George W. Bush e seu fiel consorte, Sílvio Berlusconi, mandantes da atrocidade.

No princípio

Diante do vazio cósmico, luz e treva eram irmãs no abismo sem-fim.
Bing-Bang.
Gênesis de tudo: a criação do crime (quase) perfeito.
Pouco a pouco, a Justiça - lerda e quase sempre cega - vai desvelando o mega-esquema de corrupção e de levagem de dinheiro que os tucanos mineiros inventaram ainda em 1998 e depois lançaram a franquia no mercado para que outros, igualmente metidos a espertos, desenvolvessem uma versão turbinada da máquina de comprar políticos de baixa extração (e preço inversamente proporcional).

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

A presença que fica

Há exatos 40 anos tombava Carlos Marighella. No final daquela tarde de 4 de novembro de 1969, no elegante bairro paulistano dos Jardins, na outrora tranquila alameda Casa Branca, a tocaia estava à espreita. Dezenas de agentes policiais aguardavam apenas que sua presa, o homem mais procurado do Brasil, inimigo público número um da ditadura militar, fosse engolfado pela rede assassina.
Ainda assim, com a evidente superioridade bélica da equipe do brutal delegado Fleury, os policiais se desesperaram, acionando suas armas em uma fuzilaria indiscriminada que resultou na morte de uma integrante da guarnição, alvejada por seus próprios companheiros. Marighella não teve chance de qualquer reação. O fusca em que se encontrava foi crivado por incontáveis disparos, trucidado ali em plena via pública, sem a menor cerimônia.
O corpo dele foi exposto como o troféu. Ao aniquilá-lo, o regime pretendia transmitir a impressão de que com ele morria também toda a resistência. Menos de uma década depois, quando o povo voltou a retomar às ruas e praças em estado de rebeldia, foi suficiente para demonstrar o quando estavam enganados todos os que concorreram - material ou intelectualmente - para que aquele bárbaro crime fosse perpetrado.
Hoje, a memória de Carlos Marighella segue sendo celebrada. Seu testemunho de vida, sua firmeza de princípios e seu radical compromisso com os mais pobres continua sendo exemplo para as novas gerações.
Já seus algozes, todos eles, vivos ou mortos, pouco importa, não representam absolutamente nada. Quando muito merecem escassas linhas nos relatos daqueles anos de chumbo, afirmando apenas o quão abjetos e deploráveis são os métodos dos que abraçam a medonha opção do fascismo.

Das entranhas da mãe África

Lá, no outro lado do Atlântico, a Vale também vai provocando um rastro de destruição socioambiental. As vítimas são milhares de famílias camponesas da região de Moatize, em Moçambique, onde se localiza uma das maiores províncias carboníferas do mundo.
Se nada for feito, em breve o carvão mineral moçambicano poderá mover as turbinas da termelétrica de 600 MW que a Vale pretende construir em Barcarena, no nordeste do Pará. Seus lucros serão catapultados pelo aumento da produção de seu complexo industrial do alumínio, ampliando a ponte transoceânica que transfere milhões de toneladas de minério e de produtos de baixo valor agregado para manter sempre em movimento as fornalhas do neocapitalismo chinês, principalmente.
Já a elevadíssima conta dos prejuízos permanecerá onde sempre esteve: pendurada para todo mundo ver nos escaninhos de um governo paraense que, há muito, perdeu completamente a capacidade de se por de pé.

Ao som dos tambores

Verequete é nosso Rei


“O galo cantou, me deu alegria

O galo cantou, é sinal que vem o dia

O galo cantou no romper da aurora

O galo cantou e o Verequete vai embora”


Se é correto falar de imaginário amazônico, desde o ponto de vista de seu próprio povo, Verequete é, sem sombras de dúvidas, uma de suas sínteses mais belas e originais. Sua genialidade, expressada na força rítmico-melódica e na inventiva poética de suas composições, traduz uma postura filosófica, uma concepção e percepção de mundo, ao mesmo tempo amazônica e universal, simples e profunda como o mergulho de quem, empanemado de paixão, decide ir morar com “a sereia no fundo do mar”.


Augusto Gomes Rodrigues, ou melhor, Mestre Verequete, esse um que sabe “como é bom pescar na beira do mar em noite de luar”; esse caboclo cuja casinha “é tacada de taboca na beira de um riacho, coberta de pororoca” no bairro do Jurunas; esse mano velho que tão facilmente retira do coração u’a mágoa como se tirasse a flor e o limão da rama do limoeiro; esse é o mestre humilde e fraterno, consciente do valor de sua obra e do seu significado transformador da vida do povo.


Rei, comandante da coluna, Verequete faz rufar os tambores, organiza o terreiro para a luta, em outras palavras, para a dança do carimbo do Pará – remédio milagroso para quem, mordido pela cobra venenosa, sonha com um futuro digno.


Agora, quando o mestre descansa “de baixo de uma palmeira onde canta o sabiá”, continuamos ouvindo sua voz imortal de uirapuru, para orgulho da música universal produzida em Belém, esse pedaço de chão vermelho cabano do Brasil.


Edmilson Brito Rodrigues

Professor e Arquiteto

De volta para o futuro

Grão-Pará, 1825. As chamas da revolução crescem por todos os cantos.
Tomados de súbito pavor, os de cima exigem providências contra os "papéis insultantes" que os rebeldes distribuiam contra os "cidadãos probos e fiéis a V.M. Imperial", espalhando pela Província as "pestíferas sementes revolucionárias".
O autor da sedição não era outro senão o cônego Batista Campos, que "se cercava de gentalha, de soldados e de todos aqueles indivíduos, seus sócios, a quem instruía nas vertiginosas doutrinas republicanas".
Estes relatos sobreviveram pela pena de Domingos Antônio Raiol, em seu célebre "Motins Políticos" (1970:102-103).
Pois bem. Na primeira página do jornal de Batista Campos aparecia um lema que muito bem poderia ser utilizado para definir, com todas as letras, os personagens que se movem nas sombras dos tabuleiros eleitorais de 2010, no mesmo Pará de povo miserável e de uma elite perdulária, com suas elegantes peles de cordeiros e suas mãos manchadas pelo malfeito:

"De circunlóquios nada sei,
"O caso conto, como o caso foi,
"Na minha frase de constante lei
"O patife é patife, o boi é boi."

Uma boa imersão na coragem daqueles velhos tempos seria de muito proveito. E tiraria o sono dos que imaginam poder levar todo mundo no bico.


Ave, Verequete

De um mestre para outro, a etimologia do termo Verequete:

"VEREQUÊTE, s.m. Vodum nos cultos jejes-nagôs do Pará. É também um dos mais prestigiosos no tambor de mina, do Maranhão. Prende-se à linha de Quéviôcilé. Em África, Afrekéte, filho de Agbê e sua irmã Naéte. Referido por Nélio Reis no romance Subúrbio (1937: 148-9), mereceu também poema de Bruno de Menezes, incluído no livro Batuque (1966:39-41, ed. príncipe 1931). No alto Cairari, N. Figueiredo e A.V. e Silva (1972:27) identificam-no como "caboclo". Em Belém, o casal Leacock identificou-o como orixá (deity), indicando Averequete (vd.) como encantado (spirit) (1972: passim). Verequête puxa a linha dos encantados. Identificado com São Benedito (Nélio Reis). Seu dia é a Sexta-feira. A festa anual lhe é dedicada no dia 23 de agosto. ETIM.: vd. Averequete. Augusto Gomes Rodrigues, dito, cantor e compositor de carimbós. O Carimbó de Verequête, assim denominado em homengem a Toya Verequête, figura conhecida nos terreiros mina-nagô nos subúrbios de Belém, tem a marca da autenticidade, a começar pela manutenção dos instrumentos típicos e o respeito às raízes negras do carimbó (...)".

Vicente Salles (Vocabulário crioulo: contribuição do negro ao falar regional amazônico. Belém, IAP, 2003, p.249-250).

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Marreteiros de terno e gravata

Não é segredo para ninguém que a Câmara Municipal de Belém virou um puxadinho do Palácio Antônio Lemos. Lá, faça chuva, faça sol, a última palavra é sempre ditada de fora e de cima, pouco importando o tamanho no rombo no patrimônio municipal que os gentis vereadores estejam aprovando.
A última aparição do "Poder" Legislativo mirim, em rede nacional, porém, envolvido na cessão gratuita do hall de seu prédio-sede para todo tipo de comércio - de colchões a motocicletas - pode ter cometido uma relativa injustiça. Afinal, o balcão de negócios que ali está instalado - o verdadeiro, é claro - envolve interesses muito maiores, não devendo ser confundido com o quase inocente varejo revelado pela matéria da TV Globo.

Marcha da insensatez

O governo Lula acelera o cronograma para licitar a usina de Belo Monte nas véspera deste natal. Um ótimo presente para as empreiteiras e para as mega-empresas do complexo do alumínio, principais beneficiárias dos estimados R$ 30 bilhões a serem torrados na polêmica obra.
Em paralelo, cresce a denúncia sobre as eventuais e dramáticas consequências, reverberando protestos da comunidade científica aqui e no exterior. O caso acaba de aterrissar na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), em Washington.


Consummatum est

A Colômbia se ajoelhou diante do império. Ou melhor: ajoelhada já estava há anos; agora, depois de assinado o novo tratado militar, o país de Álvaro Uribe rasteja, como uma colônia, diante dos senhores da guerra.
Não é de menor importância o fato de que a própria Justiça colombiana, através do Conselho de Estado, tenha protestado contra os aspectos mais nocivos do tratado, como, por exemplo, as disposições que conferem aos Estados Unidos a competência para decidir quais atividades realizar, reservando à Colômbia o vergonhoso papel de "cooperante". Aliás, os termos do acordo não chegam a definir a "forma e o limite" do uso que os norte-americanos farão das instalações militares colombianas.
Ora, militares e armamentos dos Estados Unidos poderão utilizar livremente sete bases militares colombianas, algumas localizadas a escassos quilômetros da fronteira Venezuelana, favorecendo atos de provocação que podem gerar consequências imprevisíveis.
A reação das demais nações sul-americanas ainda peca pela falta de intensidade e pela injustificável lerdeza. Do Brasil, aliás, não se viu nada além de falas desconexas e verbalizações tendentes a cair no ridículo. O chamado feito por Lula para que Barack Obama assumisse publicamente compromissos acerca do assunto caíram num vazio desmoralizante.
Arma-se, assim, o estopim de potenciais conflitos na estratégica fronteira internacional da Amazônia brasileira.
Antes que seja tarde, que se deflagre o alerta e se mobilize as instituições e a sociedade de nosso país diante das pesadas nuvens de balcanização que se formam no horizonte.


Dialética no olhar atento de Eneida

"DELÍRIO NÚMERO UM

A primeira vez que senti o que depois chamei apelo dos pés, foi num café, se bem me lembro da rua Álvaro Alvim, onde, sentada diante de uma mesa, conversava com um amigo. A porta, cortada embaixo, era bastante alta para não mostrar cabeças; uma porta movediça e irrequieta, comum a vários restaurantes e cafés, egoísta porta consentindo apenas a exibição de pequeninos trechos das pernas e pés em trânsito.
(...)
Meu amigo continuava falando, gesticulando, sorvendo pequenos goles. Palavras iam, frases surgiam enquanto indiferente a tudo, eu continuava apenas presa àqueles sapatos, àqueles pés.
Há tragédias nestes, cheios de lama. A camisa de seu dono deve estar suja, o colarinho puído, as meias rotas. De onde vem assim, se não está chovendo? Por onde andou para apresentar pés marcados pelas estradas sem calçamento? Estará chovendo em algum subúrbio distante? Não os sujou na cidade, pois a dias não chove. De onde vem esse homem? Quanto ganhará ele? Terá uma grande família, mudas e mortas estarão as bocas de seu fogão? Pequeno funcionário ou biscateiro? Que faz nesta rua a esta hora?".

Eneida de Moraes (1904-1971), escritora, jornalista, esta paraense de Belém dedicou sua vida à cultura e ao compromisso com as causas libertárias. O trecho acima está na primeira edição (1957, p.62-65)) de seu mais famoso livro de crônicas, "Aruanda", publicado pela Livraria José Olympio Editora.

domingo, 1 de novembro de 2009

Quando menos vale mais

Pela 18a vez consecutiva a Assembleia Geral da ONU repudiou o bloqueio norte-americano a Cuba. A administração Obama, seguindo a truculenta tradição de seus antecessores dos últimos 48 anos, permaneceu isolado, contando, aliás, com a fidelidade canina de Israel e de Palau, pequena ilha do Pacífico. Foram 187 votos, um novo recorde, que exigiram o fim da política do criminoso cerco aos cubanos, infelizmente, sem qualquer consequência prática. Coisas de um mundo unipolar que desmoraliza a retórica pretensamente pacifista do atual inquilino da Casa Branca.