sexta-feira, 29 de fevereiro de 2008

Peixes graúdos

Ainda falta gente graúda cair na rede da operação Navalha na Carne, lançada ontem pela Polícia Civil para desbaratar um dos grupos de extermínio que espalham o terror na periferia de Belém. Pela desenvoltura de suas ações criminosas, a quadrilha aparentava ter coberturas variadas e em distintas esferas do poder público.
Comenta-se, inclusive, que o cabo Rosevam, apontado como líder do bando, alugava seus serviços como segurança particular de um magistrado, sendo visto em vários locais públicos acompanhando, ostensivamente armado, esse cidadão aparentemente acima de qualquer suspeita.
Está aí uma boa pista para os investigadores do Grupo Especial de Prevenção e Repressão às Organizações Criminosas (Geproc) do Ministério Público estadual.

Extorsão ambiental

De um indignado leitor do Blog, repercutindo as indecentes declarações de Fernando Coimbra, superintendente da Delegacia Regional do Trabalho (DRT-PA):

O que impede este cidadão, muito bem pago pelo contribuinte, de integrar as forças que combatem a ilegalidade que campeia no Pará? A poucos metros da P-150, em Tailândia, ele veria famílias alimentando fornos de carvão vegetal receber R$ 20,00 para enchê-lo e R$ 9,00 para esvaziá-lo. A CTPS deste cidadão não é assinada e ele não tem sequer um abrigo para se proteger do sol inclemente de tempos em tempos, quanto mais água fresca. Garanto que nem sujaria as botas de lama. Agora enlameado está sua reputação, pela insolência de defender a ilegalidade. Ele deveria estar em Tailândia combatendo a farsa de empresários que aproveitam a ação de combate às irregularidades ambientais para demitir seus trabalhadores, dando-lhes o calote ao não pagar a rescisão trabalhista, alegando "crise" florestal, ou melhor "apagão florestal". Não mostram o quanto já lucraram com o patrimônio ambiental extorquido, muitas vezes à bala, uma riqueza que deveria pertencer a toda os paraenses.

Terra sem lei

Distribuição de cestas básicas na casa do prefeito, uma grande fazenda às margens da PA-150, com pista de pouso e dois aviões no hangar, como detalha a Agência Estado. À luz dia e diante da imprensa que cobre os desdobramentos da operação Arco de Fogo, em Tailândia (PA). As pessoas que se debatiam em gigantescas filas desde a madrugada de ontem, revelam que este é um fato corriqueiro no município governado, com mãos de ferro, por Paulo Jasper, vulgo Macarrão.
É lógico que os alimentos foram comprados com recursos públicos. E o que está acontecendo não passa de crime, como tantos outros, que pontuam a trajetória deste político do PSDB, mas que estabeleceu um amplo controle sobre quase todas as forças políticas presentes na cidade. Controle, que por sinal, se estende para a área empresarial nebulosa que há anos vêm fazendo a fortuna de uns poucos na região.
A pergunta incômoda é se, mais uma vez, o império de malfeitorias de Macarrão - e todos que com ele se relacionam - vai resistir incólume à massiva presença de forças federais no município. Se isso acontecer, será um prêmio à esperteza e um incentivo aos que resolveram atuar no submundo da ilegalidade.

Rabo de fora

As obras da Prefeitura de Belém na avenida Marquês de Herval apresentam uma particularidade: apesar de formalmente executadas pela firma Leal Jr, conhecida por servir aos interesses de outras empresas do ramo ao assumir contratos de fachada, são tocadas por uma desconhecida empresa manauara que atende pelo nome de PA.
Pouco se sabe sobre o histórico dessa empreiteira, até então desconhecida no Pará. Uma pista, porém, pode ajudar a desvendar o mistério: a novata PA teria como padrinho o polêmico Paulo Castelo Branco, primeiro-amigo do prefeito Duciomar Costa (PTB).
Ele é aquele mesmo que foi preso, anos atrás, tentando extorquir empresário do ramo da madeira. Na época chefiava o Ibama local, onde deixou as marcas do mais deslavado tráfico de influência, deixando o órgão pela porta dos fundos, algemado pela PF, em meio a seguidos escândalos de corrupção.
Ao que parece, Paulo Castelo, seguindo exemplo de quem lhe é bem próximo, pretende dar um salto da baixa política para o mundo empresarial. Tudo com financiamento público, como convêm a esta casta de novos ricos.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

Carne fatiada

No final da tarde de hoje, com grande alarido e portando armamento pesado, diversas equipes da Polícia Civil saíram às ruas de Belém para cumprir mais 30 mandados de prisão contra policiais e civis suspeitos de envolvimento com grupo de extermínio. É a operação Navalha na Carne. Pelo menos 23 pessoas já estavam presas até o meio da noite. Entre elas, um major da PM lotado na Secretaria de Segurança Pública.
Foram apreendidas armas, munição e granadas. Pode ser o começo do fim de uma das escuderias do crime que há tempos espalha o terror na periferia da capital, podendo ter sido responsável por inúmeras execuções até hoje envolvidas em mistério.

Nuvens sobre Medellín

A avenida é de Belém e está bem próxima do centro da cidade. Mas a cena, sem dúvida, lembra bem mais os tempos em que Medellín, capital do departamento colombiano de Antioquia, era dominada por um famoso Cartel. Dois motoqueiros - sempre eles - abordaram o veículo do rico e polêmico empresário Gustavo Haber na tarde de ontem. Dispararam ao menos 12 tiros no que está sendo apresentado à polícia como uma simples e corriqueira tentativa de assalto.
Atuando na área de supermercados e apontado como um dos maiores doleiros da cidade, Haber alcançou notoriedade quando foi preso pela Polícia Federal, em 2004, durante a operação Farol da Colina, de combate à remessa ilegal de dólares ao exterior. Teve sorte da blindagem de seu carro resistir ao tiroteio.

Diante da folha corrida da principal vítima do atentado, seria recomendável que a polícia ampliasse seu leque de investigações. Pode ter sido um assalto comum. Ou não.

Palmares revisitado

João Lyra é um homem muito rico. Um plutocrata, que declarou patrimônio equivalente a R$ 236 milhões nas eleições passadas, quando tentou, sem sucesso, abocanhar o governo do sofrido Estado de Alagoas.
João Lyra é um homem ambicioso. Construiu sua fortuna, alavancada a partir do que lhe foi transmitido por herança, sempre utilizando a mão de ferro da intolerância. Senhor feudal, dono de gados e de gentes, nunca admitiu ser questionado em seus domínios.
Pisou firme nos aparentemente limpos carpetes da Câmara e do Senado, defendendo com ardor as teses da livre iniciativa e do progresso econômico (para ele e para uns poucos, claro). Exerceu seus mandatos como pessoa ilibada, ilustre representante da classe dos "produtores nacionais". Um grande usineiro, detentor de muitos empréstimos em bancos oficiais (quase nunca quitados, mas isso já é outra história).
João Lyra se envolveu no escândalo Renan Calheiros, seu ex-aliado na cruenta política alagoana. Uma sociedade secreta entre eles foi objeto de um arremedo de investigação no Conselho de Ética do Senado, malogrado porque ele próprio se negou a apresentar as provas cabais da negociata. Auto-incriminação não faz parte de sua longa biografia.
De repente, desembarca nas terras alagoanas, pela primeira vez desde 1995, ano em que foi criado, o temido Grupo Móvel do Ministério do Trabalho, aquele que se especializou a caçar escravocratas modernos pelo Brasil afora. Os auditores foram meter o bedelho numa das muitas usinas de João Lyra. Encravada no município de União dos Palmares, homenagem ao quilombo que infernizou a vida dos portugueses durante mais de um século, lá encontraram a Usina de Cana Laginha e dentro dela, em condições absolutamente degradantes, 61 trabalhadores reduzidos à condição semelhante à de escravos. Jornadas de trabalho extenuantes, não-pagamento de horas extras, alojamentos sem higiene e até água potável não existia. Os quartos em que os cortadores eram obrigados a ficar não tinham portas ou janelas e a temperatura ambiente alcançava 40C. Qual a diferença com as senzalas do século XVII?
Uma exceção no moderno e reluzente setor produtor de açúcar e álcool? Infelizmente, não. No ano passado, mais da metade das libertações de trabalhadores em condições degradantes ocorreu em usinas de açúcar. Foram 3.117 pessoas resgatadas neste segmento, um dos mais festejados vetores de expansão do agronegócio voltado para a exportação.
João Lyra, com sua coleção de empresas e seus muitos milhões que florescem sem cessar, não tem mais como esconder sua verdadeira face. É um criminoso e como tal merece ser tratado.

Corredor selvagem

De uma fonte do Blog, após ter ouvido o relato da mãe de um preso recolhido à masmorra da Seccional da Cremação, periferia de Belém:

"Na delegacia da Cremação, ontem, todos os presos foram espancados de forma vergonhosa e na frente dos familiares que estavam tentando pelo menos vê-los. Algemados, com as mãos nas costas, sem camisa, só de shorts e apanhando por uma fileira da Rotam (ex- Patam), um soldado após o outro, cada um com seu farnel de ódio, violência, truculência. Confirmando que o Estado é o maior violador dos direitos humanos".

Cena corriqueira, que já não causa escândalo. É como se estivesse incorporada à paisagem. A tortura de presos, nas delegacias e mesmo nos presídios, é quase um procedimento padrão, item indispensável na cartilha que, via de regra, levará a grande maioria dos detentos ao último círculo do inferno. De lá, como se sabe, volta-se mais monstro do que homem, pronto para ser, sem dó nem piedade, parte integrante da engrenagem que reproduz a espiral de violência e morte.
A ONU acaba de apresentar o Brasil como uma nação onde se tolera a tortura, a desigualdade social e o racismo. Aspectos inseparáveis de um legado de quatro séculos de escravidão, que fincou raízes muito profundas e se mantém quase inalteradas não importando muito as mudanças de ciclos econômicos ou de regimes políticos.
Com três anos de atraso, o governo anuncia para março o envio de relatório à ONU, onde detalhará as medidas que julga estar fazendo para minorar o quadro, que admite ser grave, até porque reconhece a prática da tortura, as execuções extrajudiciais na cidade e no campo, a concentração da terra, da renda e da riqueza como fontes primordiais da violência. Mea culpa necessária, mas insuficiente.
Enquanto não houver uma política de Estado que imponha tolerância zero diante dos crimes de tortura, ao passo em que aja sobre as causas estruturais que geram os miseráveis que são suas vítimas cotidianas, estaremos diante de belos discursos de justificação, lastreados por boas e inúteis intenções.

Dialética da palavra que se liberta

"Retorno à alma que viaja durante o sonho e pode ver coisas do futuro, já que se liberta do corpo, que é o que encarcera o homem na prisão do espaço e do tempo. Os pesadelos são visões de nosso inferno. E o que todos podemos conseguir no sonho, os místicos e os poetas alcançam o mesmo mediante o êxtase e a imaginação".


Ernesto Sabato (Abaddón el exterminador, 1992, p.302)

quarta-feira, 27 de fevereiro de 2008

A furiosa reação da motosserra

O falso consenso de que todos são contra a devastação ambiental não resistiu aos primeiros passos da chamada operação Arco de Fogo, deflagrada oficialmente ontem com a ocupação por tropas da Força Nacional de Segurança e da PF da conflagrada Tailândia, sudeste do Pará. Em ações sincronizadas, vozes começaram a se levantar, no parlamento federal e estadual, e em outras esferas, alertando para o "caos social e trabalhista" que a ação fiscalizadora irá supostamente causar.
A reação mais dura, entretanto, surgiu pela boca de um membro do próprio governo federal, em tese - e somente em tese - responsável pela sensível área da fiscalização da legislação trabalhista. "A política ambiental está dificultando e impedindo o desenvolvimento. O que está havendo é uma intervenção da pasta do Meio Ambiente na economia do Pará", disse um "revoltado" Fernando Coimbra, superintendente regional do Trabalho e Emprego no Estado, por indicação direta do deputado Giovanni Queiroz (PDT-PA), expoente da bancada ruralista na Câmara Federal.
Quem conhece a biografia de Coimbra, e suas íntimas relações com o latifúndio e com fazendeiros acusados da prática do trabalho escravo, não pode se assustar com a virulência de suas declarações. Não é por outra razão que as ações de combate ao trabalho escravo, há anos por sinal, estão centralizadas em Brasília, sob o estrito controle de um grupo de elite de funcionários de carreira, imunes à politicagem que campeia no Ministério.
A vergonha que o superintendente fez questão de repetir em vários momentos de sua entrevista, de certo, poderia ter outros destinatários. Ao invés de investir contra uma medida indispensável para resgatar a autoridade do Poder Público, ameaçada pela truculência dos bandos criminosos que se apossaram de Tailândia, ele prefere cerrar fileiras ao lado dos que sabidamente optaram pelo mundo da ilegalidade e de suas brutalizantes frentes de expansão sobre o que resta de floresta em pé.
Um caso de demissão sumária. Claro, se estivéssemos em outro governo, e não neste em que usineiros e agronegocistas em geral são tratados publicamente pelo próprio presidente da República como "heróis nacionais".

Sem teleprompter

O desempenho da governadora Ana Julia, quando obrigada a responder perguntas ao vivo, costuma ser sofrível. Quando mais pressionada, maior a chance de que seus argumentos se embaralhem, ou, em alguns casos, se explicitem de uma forma digamos pouco conveniente. Foi o que ocorreu ontem, por exemplo, ao responder sobre como o Estado responderá à ação do Ministério Público que exige a reforma de todas as cadeias públicas, com transferência dos presos para locais menos insalubres. "Não tenho orçamento. Só se puder retirar parte das verbas destinadas ao Ministério Público ou ao Tribunal de Justiça", afirmou a governadora para o constrangimento da bancada da imprensa que cobria a coletiva.
Como o assunto é sério demais para ser tratado como piada, o ato falho pode ser expressão de um estado de beligerância declarada diante das (ainda poucas) críticas que vem recebendo aqui e acolá. Uma boa dose de prudência e ponderação - proporcionais aos desafios de governar um Estado com problemas tão crônicos - seria mais que recomendável.

Contagem regressiva

Quem disse que o crime, quando cometido com perícia apurada e uma boa e permanente cobertura de seguidos mandatos políticos, não compensa? Após anos seguidos de apuração pelo Ministério Público Federal (MPF), a quadrilha que assaltou a Sudam em, pelo menos, R$ 1,3 bi, pode ver os processos extintos no final deste ano, beneficiando-se do princípio jurídico da prescrição.
Entre os acusados, gente graúda e seus diligentes e caríssimos advogados, cujas manobras protelatórias vão abrindo o caminho para salvar a pele da raia miúda, responsável pelo trabalho que pode ser chamado de "técnico" para viabilizar o esquema de desvio de recursos de incentivos fiscais da extinta (e, aparentemente não renascida) Sudam.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Uma floresta de crimes

Muito tem se falado sobre as quadrilhas que lucram milhões através de fraudes nos sistemas de controle do comércio de madeira no Pará. Elas existem há anos e têm alcançado notável desenvolvimento nos últimos anos. São cada vez mais especializadas e eficientes em seu trabalho sujo, disso ninguém duvida. Como também não se pode negar que jamais existiriam se não contassem com tentáculos espalhados dentro e fora das instituições. Vivem, portanto, à margem da lei, mas se beneficiam de esquemas que supõem ampla infiltração nos órgãos que deveriam fazer a fiscalização rigorosa e permanente das atividades potencialmente predadoras.
A fraude escandalosa em projetos de manejo florestal em seis áreas no município de Tailândia – hoje no epicentro da operação Arco de fogo do governo federal – pode dar muitas pistas de como agem essas quadrilhas e quais são os beneficiários desse poderoso esquema criminoso.
Recuperemos a história: em dezembro de 2006, no final do governo do PSDB, a Secretaria de Meio Ambiente, Ciência e Tecnologia (atual Sema), aprovou em tramitação recorde, em apenas 18 dias, a liberação de mais de 170 mil metros cúbicos de madeira, a serem explorados através de 20 projetos de manejo, sem que nenhum requisito técnico fosse obedecido. A partir daí estava gerado o “crédito” para que entrassem em campo demais integrantes da quadrilha. Como parte dessas áreas já não tinha nenhuma cobertura vegetal, posto que devastadas completamente há anos, além de outras que sequer existiam no mundo real – áreas fantasmas -, o que interessava era vender o “direito de desmatar” materializado pelos Documentos de Origem Florestal (DORF), antiga Autorização de Transporte de Produto Florestal (ATPF). Pois bem: aí entra em cena uma importante autoridade, que intermediara a liberação relâmpago dos planos de manejo. Por seu “trabalho” cobra uma cifra milionária, ao como R$ 12 milhões, pago por empresas madeireiras ilegais que atuam na região. A parte mais fácil é conseguir a matéria-prima. Ela vem dos muitos de todos os cantos, mas principalmente de propriedades invadidas e exploradas febrilmente por hordas de sem-tora, organizadas, armadas e equipadas por esses mesmos madeireiros, mas que agem como bandos criminosos, aparentemente sem controle de ninguém.
Em menos de um ano, as transações relativas aos 170 metros cúbicos de madeira já haviam sido realizadas, sob a enganosa capa da legalidade. Um lucro estimado em pelo menos R$ 50 milhões, equivalente a perto de sete mil carretas cheias de toras.
Dessa vez os bandidos da floresta podem ter deixado muitos rastros, pistas valiosas se houver efetiva vontade de investigar, apurar e punir os responsáveis. A denúncia foi feita por uma corajosa promotora de Justiça, uma honrosa exceção para confirmar a regra de um Ministério Público Estadual marcado pela inoperância diante dos crimes que são, dia após dia, cometidos em território paraense. Em breve, será ajuizada uma Ação Civil Pública para que a Justiça determine, entre outras medidas, a realização de perícia técnica nas áreas objeto dos supostos manejos. Facilmente será detectada a fraude. Da mesma forma – sempre se houver disposição – será possível rastrear todas as empresas que se beneficiaram dos DORFs sob suspeita. Ou seja, utilizaram-nas para esquentar madeira ilegal. Em resumo: desde os funcionários públicos corruptos que aprovaram os planos fajutos, passando por autoridades públicas envolvidas, até chegar à ponta do negócio, onde atuam empresas do ramo da madeira, quem sabe uma ou outra que pode até posar como portadora de profundo compromisso com o decantado desenvolvimento sustentável e com a responsabilidade social e ambiental.
Com a denúncia está aberta a trilha para desvendar uma intrincada floresta de crimes. E para colocar atrás das grades seus muitos e vistosos autores.

Sem legendas

A imprensa está atônita. Não compreende o que sustenta o sistema político cubano, quase duas décadas depois da derrocada do “socialismo real”. Na época, em 1991, a mídia norte-americana chegou a fazer contagem regressiva para que a população de Havana fosse às ruas derrubar muros e estátuas que no caso cubano eram mera ficção, ressonâncias de uma Guerra Fria que parece não ter fim.
Agora, diante da sucessão sem traumas que ocorre na ilha, despeja-se uma infinidade de asneiras e de adivinhações sobre o futuro imediato do único país latino-americano que teve forças para resistir, distante apenas 80 milhas, à brutal influência do maior império moderno da Terra. Tudo isso, lembre-se, em meio a um bloqueio econômico desumano, parte fundamental da guerra de baixa intensidade inaugurada desde sempre, mas tornada política de Estado em 1961.
Cuba aparece nas telas da CNN como um filme sem legendas. Seus habitantes falam uma língua exótica, ininteligível para os padrões dominantes. Carece de interpretação, tanto o que se diz, mas também os silêncios dos discursos oficiais. É só Raul Castro, presidente eleito pelos 614 deputados do parlamento cubano, falar em mudanças para que se comece a especular o retorno às práticas capitalistas que antes de 1959 transformavam a ilha caribenha num alegre bordel norte-americano. Ou, quando menos, prever uma fantasiosa tendência da direção cubana adotar, em breve, o modelo chinês – abertura econômica e ditadura política. Palavras soltas ao vento, propaganda ideológica apresentada como notícia objetiva.
Se tivessem um pouco menos de preconceito, esses bem-pagos articulistas poderiam rever com mais atenção a trajetória do irmão mais novo de Fidel. Perceberiam que sua história, forjada nas mesmas trincheiras, não deixa margens a ilusões. Afinal ele é aquilo que se pode denominar de um sobrevivente. Em 1953, durante o ataque ao quartel de Moncada, era um dos 135 guerrilheiros que ousaram desafiar a ditadura de Fulgencio Batista. Após o fracasso do ataque, 90 combatentes foram sumariamente executados. Poucos anos depois, em 1956, desembarcou do Granma em meio à fuzilaria das tropas do governo. Dos 82 expedicionários, apenas um número que varia de 22 a 12 combatentes conseguiram sobreviver, entre eles, como a história foi testemunha, lá estava Raul, ao lado de Fidel e Che Guevara.
Não se fale nem nos enormes riscos que correu durante a campanha guerrilheira de Sierra Maestra, quando foi um dos principais comandantes. Conhecido por sua firmeza no combate, implacável com os adversários, não titubeou, por exemplo, em tomar 49 norte-americanos como reféns, em 1958, como forma de pressionar Washington a cessar, mesmo que momentaneamente, o envio de aviões e bombas de napalm às tropas de Batista, que provocavam enormes perdas às fileiras revolucionárias.
Enfim, um homem de princípios e não um arrivista de ocasião, pronto a trair os ideais da revolução que ajudou a construir.
Deveria ser leitura obrigatória nas redações o monumental livro de um jornalista e escritor norte-americano, Jon Lee Anderson. Che Guevara, uma biografia (Editora Objetiva, 1997, 920 páginas) vai muito além de traçar um perfil do revolucionário argentino. É, ao mesmo tempo, um olhar profundo, crítico e generoso de todo o processo cubano. Quem sabe não teríamos uma redução considerável do número de abobrinhas nos despachos e análises da cobertura internacional.

Amigos para sempre

Como a tampa e a panela, onde está Duciomar Costa, podem procurar, lá também surge a igualmente nebulosa figura de Paulo Castelo. Não está se falando neste momento dos muitos processos judiciais que já começam a atormentar a vida do prefeito de Belém, onde sabe poder contar com a solidariedade ativa de seu fiel escudeiro. Nem, tampouco, de algum desdobramento inesperado do polêmico passado de Castelo, preso em flagrante pela PF anos atrás ao cobrar propina de empresário do ramo da madeira.
Eles aparecem hoje na imprensa recorrendo ao Tribunal Regional Eleitoral (TRE), em nome do PTB, na tentativa de obter, na tapetão, uma cadeira de vereador em Ananindeua para Castelo, quarto suplente de Carlos Begot, eleito pelo PTB, mas atualmente abrigado na legenda do PMDB, depois de uma rápida estadia no PR.
Fale-se tudo menos que não sejam sólidos os laços que unem essa dupla sempre dinâmica.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Nader, o penetra

Ralph Nader, 74, nunca teve medo de polêmicas. Várias vezes candidato independente à Presidência dos Estados Unidos, acaba de anunciar que vai entrar com tudo na disputa deste ano. Washingthon, diz ele, é um "território dominado pelas empresas", o que condiciona a política do governo sempre em sentido contrário à maioria da população.
Depois de ganhar notoriedade por sua defesa intransigente do direito dos consumidores, Nader sabe muito bem o jogo de cartas marcadas que as eleições norte-americanas representam. Nem por isso desanima de sua pregação contra os monopólios que, ao fim e ao cabo, são os que elegem - ou derrotam - os inquilinos da Casa Branca.
Em 2000, por exemplo, concorrendo pelo Partido Verde, obteve 2,7% dos votos, considerada uma marca histórica. Na eleição seguinte, como candidato avulso, seu desempenho foi menor ainda, mas, de qualquer forma, não deixou de dar alguma dor de cabeça aos poderosos de plantão.
Sua candidatura - ridicularizada pelos meios de comunicação - lança mão de táticas de comunicação de guerrilha, apenas para tornar ainda mais evidente os limites de um sistema político em que prevalece sempre o poder do dinheiro e das poderosas máquinas partidárias. Uma espécie de voto censitário num país que costuma se apresentar como modelo de democracia e de liberdade.

As (des) razões da Vale e o incompreensível colosso

Da montanha de boatos, que explodiu em um sem números de notas nas mais prestigiadas colunas de opinião da imprensa tão grande quanto subserviente - surge um simples ratinho, fraco, esquálido e que não consegue se sustentar em pé. O que viria como "compensação" da Vale à população paraense tendo em vista o meganegócio que está prestes a fechar com a compra da anglo-suíça Xstrata (pelo menos US$ 90 bi, o que deverá torná-la a maior mineradora do mundo), agora é apresentado como uma possibilidade algo remota e cercada de condicionalidades. E mais: não é um empreendimento direto da Vale, fruto da inversão de uma fração de seus lucros bilionários, mas uma tentativa de "atração" de parceiros do ramo siderúrgico. A tal industria siderúrgica só teria viabilidade, pelas palavras do diretor de assuntos corporativos da Vale, Tito Martins, se antes forem satisfeitas as seguintes pré-condições: a) conclusão das Eclusas de Tucuruí; b) construção do Terminal Off-shore (em águas profundas) do Espadarte, em Curuçá, nordeste paraense, e c) agilização do licenciamento ambiental dos projetos da mineradora. A Vale estabelece condições que demandarão pesados investimentos públicos - só Espadarte, ainda em fase inicial de estudos técnicos, é um projeto para alguns bilhões de reais - como se fosse mera expectadora, sem nenhum compromisso além de cobrar que o Estado - sempre ele - venha pavimentar o caminho para o lucro privado, a ser conseguido de forma quase instantânea, sem riscos e transferindo à sociedade os pesados ônus socioambientais. Tudo somado, o que resta é uma promessa para um futuro incerto. Em menos de uma década, numa previsão otimista, talvez se alcance o cenário desejado pela multinacional. Até lá que o povo do Pará se contente com o mesmo palavrório vazio de sempre. Aliás, não custa lembrar as proféticas palavras do deputado Bernardo Souza Franco, em 1840, acerca do incompreensível colosso representado pela então província do Grão-Pará (que na época correspondia aos atuais Estados do Pará, Amazonas, Amapá e Roraima). Dizia o parlamentar na tribuna da Câmara dos Deputados: "A que deverá o Pará, rico de um futuro imenso, incompreensível colosso, que por si só fará um grande império, o seu atraso atual?". Pergunta solta no ar, atravessando gerações. Que tal retomá-la nos dias cinza de hoje, partindo para o enfrentamento das causas objetivas de nosso atraso ancestral? A incorrigível arrogância da Vale não tem como não ser o primeiro e mais importante alvo dos que não querem que prevaleça a maldição de uma terra riquíssima que abriga em seu seio um povo reduzido à triste condição indigente, eternamente excluído do banquete dos flibusteiros do século XXI.

Linhas mal traçadas

Adulteração de documentos oficiais da Comarca de Abaetetuba. Este é o crime do qual a juíza Clarice Maria de Andrade está sendo acusada pela Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior, do Tribunal de Justiça do Estado (TJE). Se não houver nenhuma outra manobra protelatória, como as intermináveis e muito oportunas "férias" a que a magistrada teve direito, ela deverá ser julgada na próxima sessão plenária do órgão, prevista para a quarta-feira, 27.Para quem não se lembra: a juíza Clarice foi quem manteve a adolescente L., de apenas 15 anos, por mais de 30 dias, em uma cela com mais de 20 homens, onde a garota foi torturada, estuprada seguidas vezes, sob o olhar cúmplice de todos os escalões locais da Polícia Civil, da Promotoria e do Judiciário.
Caso típico em que o crime principal - a manutenção de uma presa em cela masculina e em e meio a presos, pelo menos três deles, que haviam sido presos justamente pela prática de estupro - pode ser substituído por um acessório - a falsificação de documento da Comarca para tentar fazer crer que a responsabilidade pela permanência de L. entre os presos caberia à Corregedoria do Interior, em Belém. Jogo de empurra macabro, que expõe antes de tudo a falência ética de autoridades públicas que precisavam estar acima de qualquer suspeita.
Por caminhos tortuosos e à moda de Al Capone, preso e julgado por sonegação fiscal e não por seus inúmeros crimes de sangue, pode-se chegar à finalmente à justiça. Ou, na pior das hipóteses, aos conhecidos e labirínticos caminhos da impunidade. O único remédio é manter a vigilância e não deixar o assunto ser substituído por uma barbárie mais atual. Das tantas que andam freqüentando o noticiário.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Tem gringo na fronteira

Durante décadas - talvez séculos - as fronteiras brasileiras no extremo sul do país foram palco de convulsões sangrentas e ferrenhas disputas com nossos vizinhos castelhanos. Criou-se o mito que se um dia voltássemos a guerrear no continente essa contenda encontraria as forças militares argentinas na barricada oposta. Esse temor militarista foi fundamental para manter até hoje as faixas de fronteira em 150 quilômetros, criando um anteparo destinado, supostamente, a conter infiltrações e ameaças à soberania verde e amarela.
Pois bem. Tudo isso parece que está mudando e as razões das transformações conceituais estão a léguas de distância dos nobres interesses nacionais. Nesta semana, a Comissão de Constituição e Justiça do Senado aprovou proposta de emenda constitucional do senador gaúcho Sérgio Zambiasi (PTB), reduzindo a faixa de fronteira para apenas 50 quilômetros do Rio Grande do Sul até o Mato Grosso do Sul. Note-se que sua intenção era alterar a faixa em todo o país, mas a Amazônia foi excluída, evitando que os impactos negativos da medida fossem ainda maiores.Os argumentos são os de sempre: a faixa de 150 quilômetros seria um inibidor dos "investimentos" e dificultaria nossa "integração com os parceiros do Mercosul". Pura balela. A mão invisível por trás a proposta não tem nada a ver com a América do Sul e nem espanhol fala. Trata-se da gigante da indústria mundial do papel e celulose, a Stora Enso, atuando em mais de 40 países e considerada a maior fabricante de polpa e papel do mundo.
A empresa de capital sueco-filandês possui enormes plantações de eucalipto próximo à zona de fronteira no Rio Grande do Sul e já atua dentro da faixa através de proprietários "laranjas". Com a mudança, cai a restrição para que possa assumir diretamente as suas amplas propriedades e inclusive ampliá-las, provocando, segundo os ambientalistas, enormes impactos ambientais ao debilitado bioma Pampa, cada dia mais ameaçado pelo avanço do deserto verde.

Efeitos Especiais

Como o mágico que tira o coelho da cartola e provoca assombro na platéia, o discurso do presidente Lula exultando a passagem do Brasil de devedor a credor internacional está mais para truque barato do que para um discurso de estadista. O brilho do falso brilhante pode até encantar os mais propensos a acreditar em qualquer coisa desde que a favor do governo, mas não resiste à mínima análise isenta.
Vejamos os números coletados pelo economista Rodrigo Ávila, da Campanha Auditoria Cidadã da Dívida, para desmontar a farsa: tudo não passaria de uma deslavada manipulação estatística, iniciada no governo FHC e perpetuada pela dupla Lula-Henrique Meireles, já que o cálculo apresentado exclui as dívidas das filiais de multinacionais no Brasil com suas matrizes no exterior. Só em 2007, esse débito pulou de US$ 20 para US$ 42 bilhões, valor suficiente para transformar o país novamente em devedor, pondo areia na comemoração oficial.
Mas á manipulação vai mais além. O que justifica o recorde histórico em reservas cambiais? Simples. Enquanto diminui a dívida externa - influenciada inclusive pela forte valorização do real frente ao dólar - cresce exponencialmente o endividamento interno, que no final do ano passado ultrapassou a barreira dos R$ 1,4 trilhão, um crescimento de mais de 40% em dois anos. Para fechar a equação é necessário saber que são os grandes especuladores internacionais que reforçam nossas reservas, trazendo dólares para o país, mas não para investimentos produtivos. Preferem o lucro fácil, rápido e sem riscos da compra de papéis do governo, o que alimenta a ciranda do endividamento.
Como afirmar então que superamos o problema da dívida, como fez Lula em discurso pirotécnico no parlamento argentino na última quinta-feira, 21, se a drenagem de recursos públicos no ano passado para os felizes detentores da riqueza financeira resultou numa conta de R$ 237 bi de juros das dívidas interna e externa, sem levar em consideração a parte que foi simplesmente "rolada", gerando mais endividamento?
Não se deve esquecer que é esse mesmo governo que chora lágrimas de sangue ao alegar a "perda" dos R$ 40 bilhões com o fim da CPMF, mas engole com satisfação perdas nas transações cambiais do Banco Central que em 2007 chegaram a R$ 60 bi.
Os olhares embevecidos da platéia não durarão para sempre. E a descoberta do embuste não estará isenta de dolorosos traumas.

Belém à siciliana

Os mafiosos costumam se definir como “homens de honra”. Entre suas leis está o compromisso de sangue de jamais delatar. Estão sob a proteção da Ormetà, derivada possivelmente da palavra italiana umiltà (humildade), mas que ganhou outra acepção quando passou a figurar no vocabulário do submundo da Cosa Nostra, Ndrangheta e da Camorra, alguns dos diversos nomes da máfia italiana.
Um escândalo público geralmente nasce de fissuras no muro protetor da cumplicidade. A busca, muitas vezes infrutífera, da delação premiada, tem estimulado que membros menores de organizações criminosas busquem colaborar com a Justiça em troca de benefícios processuais.
A matéria exclusiva do Diário do Pará de hoje, revelando o depoimento informal ao Ministério Público Federal do ex-secretário de Saúde de Belém, médico William Lola, que confirmou ter recebido ordem pessoal do prefeito Duciomar Costa (PTB) para realizar o desvio de veículos comprados com recursos da Saúde para a Guarda Municipal (GBel), dá boas pistas neste sentido.
Escândalo dentro do escândalo, a revelação deve complicar a já delicada situação do prefeito da capital, réu em dois processos que apuram a ocorrência de crime de responsabilidade e desvio criminoso de recursos públicos federais. Se condenado, pode cumprir pena de detenção de até três anos, perder o cargo e ficar afastado de qualquer função pública por um largo período, a ser definido por sentença judicial.
A máquina de propaganda municipal, porém, garante que o prefeito "está tranqüilo". Deve ser aquele tipo de tranqüilidade que costuma preceder às tragédias.

sábado, 23 de fevereiro de 2008

Os boinas vermelhas estão chegando. Para ficar?

Pela primeira vez desde sua criação em 2004, a Força Nacional de Segurança desembarcará em terras paraenses. Serão 157 homens que reforçarão a tropa de mais de 400 PMs que desde hoje ocupam as ruas de Tailândia, a 240 quilômetros de Belém.
A ação das forças de segurança é uma resposta - adequada e indispensável - à violenta reação orquestrada pelo crime organizado que domina o município, com seus tentáculos mais evidentes se expressando através de supostas entidades patronais. Manipulam de forma descarada a miséria e o desespero de uma população que sobrevive dos precários empregos gerados por uma atividade que só sabe atuar na marginalidade, em aberta afronta à legislação trabalhista e ambiental.
Espera-se que mais esta operação de impacto não se esgote em si mesma. A memória recente - basta recuar a fevereiro de 2005, nas ensangüentadas glebas da Terra do Meio, após o martírio da irmã Dorothy Stang - está repleta de exemplos de como ações espetaculares quando não acompanhas de medidas estruturais de combate à grilagem e de execução de um consistente plano de Reforma Agrária, tendem a dar lugar, tão logo as tropas se retirem, ao mesmo cenário de barbárie de antes.
Tailândia se tornou sinônimo do agrobanditismo, na expressão cunhada pelo geógrafo Ariovaldo Umbelino, da USP. A cada dia surgem novas denúncias, revelando o quanto essa região foi e ainda permanece entregue à ação de verdadeiras máfias. Veja-se, por exemplo, a revelação trazida ontem pelo Jornal Nacional, da Rede Globo, de que 20 projetos de manejo localizados no município foram aprovados, em dezembro de 2006, no tempo recorde de duas semanas, no apagar das luzes do reinado tucano. Na época, a Secretaria estadual de Meio Ambiente (antiga Sectam, atual Sema) era feudo do deputado Joaquim Passarinho (PTB), que dominava a área ambiental através de seu irmão, Raul Porto (este, como é sabido, preso em março do ano passado durante a operação Ananias, da Polícia Federal, de combate a quadrilhas de criminosos ambientais). Resultado: tudo não passava de fraude para "esquentar" mais de 170 mil metros cúbicos de madeira, rendendo aos fraudadores - figuras bem postas no mundo político e empresarial daquela localidade- a fabulosa soma de R$ 50 milhões.
Misteriosamente, quando a promotora Ana Maria Magalhães de Carvalho – que tem recebido ameaças de morte - cobrou informações da Sema, descobriu-se o sumiço de todos os processos. Grosseira tentativa de dificultar as investigações que revela a sobrevivência de elementos do ancien régimen atuando com desenvoltura nesta estratégica secretaria do governo estadual.
Tailândia, mais que tudo, para ter futuro e resgatar sua população do círculo vicioso da violência e da impunidade, precisa da presença permanente do Estado – em todos os níveis – dotado da coragem cívica de fazer, custe o que custar, uma exemplar operação mãos limpas.


Faxina só no começo

A decisão liminar do ministro Carlos Ayres Brito, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a eficácia de 20 dos 77 dos artigos da draconiana Lei de Imprensa, editada em 1967, deve mesmo ser saudada como uma medida progressista e um tanto tardia para se por fim à herança dos anos de chumbo. De fato, muitos de seus dispositivos carregam o ranço da censura e do cerceamento das liberdades em geral e da livre expressão em particular.
Mas, como sempre, é salutar ter parcimônia e não embarcar nos festejos que as entidades patronais da imprensa estão fazendo, como se a liberdade de imprensa fosse absoluta, não sujeita a qualquer controle senão aos próprios interesses (muitas vezes inconfessáveis) das empresas e de seus ricos proprietários. Liberdade e impunidade, eis dois conceitos que devem ser excludentes e não complementares.
Um interessante olhar crítico sobre a matéria - muito embora louvando a decisão ainda provisória do Supremo - pode ser encontrada no site da ONG Artigo 19, criada na Inglaterra em 1987, e que defende a necessidade de uma análise "cautelosa" das mudanças a serem implementadas na legislação de imprensa do país, "particularmente no que diz respeito aos padrões internacionais e melhores práticas sobre a liberdade de expressão”, diz o comunicado lançado ontem pela entidade.
Inspirada no artigo 19 da Declaração Universal dos Direitos Humanos (“Todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras"), a ONG possui um rico acervo de informações que vale a pena ser consultado (
http://www.livreacesso.net/main.php).

Dialética da palavra que toma partido

"Jornalismo é transgressão. E jornalista não é neutro. Isso é bobagem. Ninguém é neutro".


Paulo Patarra

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Safados, demagogos, vagabundos

"Você é um safado", bradou Mário Couto (PSDB-PA), dedo em riste, quase agredindo seu colega do Amapá, Gilvan Borges (PMDB). Em resposta, o fiel soldado de Sarney respondeu no mesmo tom: "Vossa Excelência é um vagabundo, um demagogo". O barraco aconteceu sob as lentes da mídia nacional e em meio à correria da turma do deixa disso. Caso típico em que cada qual só tem razão quando ataca o adversário e está a descoberto quando tenta empreender sua própria defesa.
Os dois diligentes parlamentares têm autoridade para falar desses temas. São doutores honoris causa na matéria.

Por trás da devastação, a grilagem

Sempre a mesma cantilena: os porta-vozes da indústria madeireira tentam justificar a quase total ilegalidade do setor no Pará culpando a excessiva "burocracia" na liberação dos chamados planos de manejo. Esta, repetida por eles e disseminada ad nauseam por um determinado tipo de imprensa sempre dócil aos interesses dos devastadores, seria a causa primeira dos conflitos que começaram por Tailândia e se generalizarão em breve por todos os municípios incluídos na lista suja do Ministério do Meio Ambiente. Em tom de ameaça, sugerem que aí sim será o caos.
O que quase ninguém lembra é o fato que impede, na maioria das vezes, a tramitação regular dos processos das madeireiras - isso, é claro, sabendo que uma parte substantiva da "categoria" sequer tenta dissimular suas práticas flagrantemente ilegais - que abarrotam as prateleiras da Secretaria de Meio Ambiente (Sema). A razão é simples: as terras são griladas, de forma descarada e reincidente. Trata-se de apropriação de áreas públicas da União e do Estado, sem falar em "frentes de devastação" que penetram em Terras Indígenas e em áreas de preservação permanente.
Os madeireiros não são "empurrados à informalidade", portanto. Eles se nutrem da bagunça fundiária e florescem na mesma medida em que o Estado se faz ausente e, não raro, cúmplice e incentivador de uma tragédia pacientemente fabricada há décadas.
Este, em suma, é o nó que cabe desatar. Caso contrário, medidas marcadas pela boa intenção acabam na vala comum de pirotécnicas operações ambientais. Para inglês ver, of course.

Carreira solo

É para valer. Se depender de um amplo grupo de petistas de Ananindeua, o partido seguirá trilha própria e não se abrigará sob as asas da candidatura de Helder Barbalho (PMDB) à reeleição. Já está nas ruas a pré-candidatura da ex-deputada Sandra Batista (ex-PCdoB, neopetista desde outubro passado). A idéia, mesmo que não revelada, é lançar areia no pretenso acordo que parte da cúpula do partido sonha em sacramentar com o todo-poderoso Jader Barbalho. Negociação, dizem, só num eventual segundo turno, que pela primeira vez poderá ocorrer na cidade que já alcançou 200 mil eleitores.
Não é pouca coisa que está em risco caso o nome de Sandra Batista realmente consiga se consolidar. Em troca do apoio a Helder, os cardeis do PT pretendem cobrar uma régia contrapartida peemedebista, através do apoio às candidaturas petistas que tentarão se reeleger em cidades estratégicas como Santarém e Parauapebas, por exemplo.
Agora, as belicosas tendências internas do PT, que sempre tiveram um relacionamento muito distante daquilo que possa ser chamado de amistoso, terão um bom motivo para travar uma imprevisível disputa interna na segunda cidade mais importante do Pará.

Mergulho no desespero

O povo Guarani-Kayowá está sob cerco de morte. Há muito tempo e às vistas de todos. A tragédia segue impune, com milhares de indígenas confinados em minúsculas áreas de terra, fração residual do enorme território que foi apropriado pela soja e agropecuária no Mato Grosso do Sul.
Os vínculos espirituais - relativos à sua cultura milenar - vão sendo desconstruídos inapelavelmente. Sem referências, os índios tornam-se presa fácil do alcoolismo, da fome endêmica e da violência doméstica. No meio do caos, proliferam seitas evangélicas - a intolerante Deus é Amor é de todas a mais presente e de longe a mais agressiva contra os costumes indígenas ancestrais. Tudo somado resta um quadro crônico de falta de perspectiva e desespero.
Para muitos o caminho é buscar a saída através da queda livre no poço escuro do suicídio. Nesta semana, segundo noticiou o Estadão, um jovem índio de 16 anos foi ao encontro da morte com a rama do próprio pai. Diante do corpo do filho, o pai também cometeu suicídio. É o nono caso somente neste ano.
A polícia avisa que instaurou competente inquérito. Deve percorrer as infectas vielas da Terra Indígena Potrero Guaçu, no extremo sul do Estado, procurando identificar as causas da tragédia. Trabalho inútil: nesta como em todos os outros muitos casos de suicídio registrados ano a ano é na falta de terra - condição básica para a sobrevivência de qualquer povo - que se encontrará a causa fundamental deste interminável etnocídio, que tem como palco um dos baluartes da agricultura dita moderna e de seu reluzente agronegócio tipo exportação.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

Um passo à frente

Leitores do Página Crítica há muito sabiam das vicissitudes que a pré-candidatura de Mario Cardoso enfrenta no PT. O que pode ter aparecido como novidade para os leitores de coluna Repórter 70 na edição de hoje de O Liberal, através da notinha intitulada "Fora", já havia sido filtrado, por diversas vezes, neste espaço.
Para refrescar a memória:

Quinta-feira, 31 de Janeiro de 2008

Passaporte carimbado

Mário Cardoso, ex-secretário estadual de educação e virtual candidato a prefeito de Belém pelo PT, só não assumirá uma vaga de conselheiro do TCM se não quiser.Apesar dos desmentidos protocolares, a decisão de Mário abandonar a disputa estaria muito perto de ser anunciada. Se isso se confirmar, não significa que o caminho está livre para as pretensões da deputada Regina Barata, por enquanto a única outra pré-candidata que postula a indicação do partido. Sob sigilo - relativo, é claro - outras possibilidades estão sendo pacientemente articuladas, garantem fontes com amplo acesso à cúpula petista paroara.


Segunda-feira, 4 de Fevereiro de 2008

Mário, o breve

Periga não chegar até a Páscoa a pré-candidatura a prefeito de Belém do ex-secretário estadual de Educação Mário Cardoso (PT). Poucos são os que ainda acreditam na viabilidade dela e menos ainda os que se dispõe a se cerrar fileiras em torno de seu nome numa eventual prévia.Tanto é assim, que dois dos principais generais petistas – cada um tendo sob seu controle muitas Brigadas e Divisões espalhadas por todo o Estado – procuraram a governadora Ana Julia para uma conversa ao pé do ouvido. Trataram de eleições. Da de 2008 e, principalmente, da de 2010. Muito falaram, mas o nome de Mário Cardoso sequer foi pronunciado. Buscam uma alternativa para a sucessão de Belém, desde que o nome permaneça nas fronteiras do antigo Campo Majoritário. Prometeram apoio – sem prévias, é claro – ao nome da governadora para a ainda distante reeleição daqui a três anos. Saíram de mãos abanando e com a nítida impressão de ter deixado uma Ana Julia com o humor mais azedo que de costume.

Encarando o caos

Uma corajosa iniciativa de defensores públicos está trazendo à pauta o caos do sistema de saúde na capital. Numa visita realizada na semana passada às instalações do Pronto Socorro do Guamá integrantes do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos (NDDH) da Defensoria Pública do Estado se depararam com um cenário de horror que está muito longe de ser exceção em Belém sob o desgoverno de Duciomar Costa (PTB). Falta tudo - até materiais indispensáveis à esterilização dos equipamentos cirúrgicos - e os pacientes ficam expostos a toda sorte de doenças e infecções. Uma pequena amostra do que será encontrado nas dependências de outras unidades da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma), cujo sucateamento alcançou níveis impensáveis.
Enquanto se arrastam sem conclusão os diversos procedimentos investigatórios abertos pelo Ministério Público Federal, gesta-se uma crise de saúde pública de enormes proporções. A lentidão e a falta de vigor dos órgãos fiscalizadores acabam virando um tonificante para que o saque não só prossiga como seja aprofundado, numa espécie de contagem regressiva onde a população entra com o próprio sangue - muitas vezes literalmente - para que a transfusão de recursos públicos continue intacta.

A roda da fortuna

Que a ânsia privatista integra o DNA dos políticos tucanos, não há mais quem duvide. Por isso, não deve causar maiores solvancos na opinião pública a decisão do governador José Serra (PSDB-SP) de dar continuidade à privataria - através da venda da o leilão da Cesp (Companhia Energética de São Paulo), a terceira do ranking nacional de geração de energia. Uma jóia da coroa, portanto, que poderá ser arrematada por R$ 6,6 bilhões. Muito dinheiro? Não necessariamente. Esses números aparentemente gigantescos podem esconder as mesmas armadilhas de sempre, por meio da presença cruzada de fundos de pensão, fartas linhas de crédito do setor público e os inevitáveis repasses às tarifas, que transformaram o processo de privatização de estatais em um dos mais lucrativos negócios desde a década passada.
De olho na negociata, grandes monopólios estrangeiros, como a franco-belga Suez/Tractebel e a Neoenergia, controlada pela espanhola Iberdrola. Em suma, está em curso a desnacionalização desse setor estratégico para o desenvolvimento nacional.
A promessa do governo paulista é concentrar os recursos arrecadados em investimentos em infra-estrutura e em saúde pública, tudo em ano de eleições municipais, ensaio geral para a disputa do Palácio do Planalto em 2010. Nestes labirintos que unem interesses públicos e privados não se deve crer em coincidências.

O homem que calculava

Toda vez que os bancos divulgam seus extraordinários lucros – recordes a cada ano – uma sirene de alarme deveria disparar. Por trás dos bilhões apropriados pela oligarquia financeira há uma selvagem estrutura de concentração de renda e riqueza, cujos motores propulsores se mantêm em plena atividade impulsionados pela política econômica do governo Lula.
Quem desvenda o mistério é um cientista que sempre foi conseqüente no uso de todas as armas contra a exploração. Da juventude vinculada às organizações da luta armada à cátedra de professor titular da PUC-SP, Ladilau Dowbor, este intelectual engajado, jamais abriu mão da capacidade de criticar as engrenagens perversas do capitalismo contemporâneo.
É dele o estudo publicado na última edição do Le Monde Diplomatique-Brasil, já nas bancas, demonstrando de forma irrefutável que o mercado financeiro no Brasil pratica taxas de juros para lá de extorsivas e isso é o que explica os números fantásticos que ilustram os balanços dos gigantes como Bradesco, e Itaú, para ficar somente nos líderes da ciranda financeira nacional.
Vejamos: as taxas de juros anuais praticadas nos demais países do mundo não costumam ultrapassar a faixa de 5% para o mercado imobiliário e de até 8% para os bens de consumo. Atenção: ao ano e não ao mês, como acontece no Brasil. Aqui, segundo dados da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), a taxa média de juros do mês de novembro de 2007 foi de 4,10% ao mês para pessoa jurídica, totalizando 61,96% ao ano. Já as pessoas físicas são escorchadas por taxas médias de 7,23% ao mês, o que conduz a uma indecente taxa anual de 131,10%. Está aí a chave para explicar a euforia dos endinheirados executivos da Avenida Paulista.
Imaginem um consumidor japonês, acostumado a taxas anuais de 2%, diante destes números que revelam uma usura escandalosa. Deve ter calafrios.
A conclusão do professor Dowbor vale como um grito de alerta: “Intermediários financeiros cumprem a função de facilitar o acesso ao dinheiro dos outros. Mas, quando viram atravessadores, se tornam um desastre. Já é hora de por um pouco de ordem na selva que virou a intermediação financeira no Brasil”.


quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

A casa caiu

A curta carreira do Centro Federal de Educação Tecnológica do Pará (Cefet) sofreu mais um duro golpe. Quem sabe o golpe definitivo. Acaba de ser anulado pelo governo do Estado o concurso público C-126 para cargos de nível superior da SEDUC, sob uma pesada bateria de críticas por parte de candidatos e professores de cursinhos.
O Cefet foi afastado da realização do concurso, que deverá ser organizado por outra entidade.
Já estavam anulados outros cinco concursos, diante de uma extensa coleção de fraudes e irregularidades. Resta saber se além de afastar a instituição, o governo vai abrir procedimento para apurar responsabilidades, bem como o destino dos recursos arrecadados pela taxa de inscrição de muitos milhares de candidatos.

Bucha de canhão

As cenas de guerra urbana ocorridas ontem (19) em Tailândia, a 240 quilômetros de Belém, repetem um roteiro sempre utilizado pelos que vivem da depredação permanente da floresta. Diante de uma ação mais dura da fiscalização governamental, os proprietários da serrarias ilegais arregimentam, com enorme facilidade, centenas de seus empregados para que promovam o máximo de tumulto. Servem de bucha de canhão, arriscando a própria vida e dos servidores públicos encarregados de fazer cumprir a lei.
Enquanto o fogo arde nas ruas, os mandantes permanecem abrigados em segurança, ditando ordens de ataque. Protegidos das balas de borracha e do spray de pimenta, podem pensar nos próximos passos para seus lucrativos negócios sejam retomados tão logo as "forças de ocupação" sejam retiradas da cidade.
Tailândia não é por acaso o sexto município mais violento do país. Anos de inércia e cumplicidade do Estado com quadrilhas especializadas em devastação ambiental estão na raiz dos atuais conflitos. Controlam, assim, praticamente todos os espaços de representação pública, possuindo musculatura financeira e política para suportar um cerco muito mais longo que uma simples operação prevista para durar apenas algumas poucas semanas.
Há poucos dias uma promotora de Justiça precisou se afastar de Tailândia sob ameaça de morte. A jovem integrante do Ministério Público julgou que os negócios nebulosos do atual prefeito, Paulo Jasper (PSDB), conhecido por Macarrão, um notório gangster, precisavam ser investigados. O terror parece ter imposto suas regras.
Apesar de todos os riscos que a operação Guardiões da Amazônia está enfrentando, a ação do poder público deve ser ampliada, com reforço das equipes federais e estaduais envolvidas, e mantida por prazo indeterminado. Qualquer recuo, mesmo que momentâneo, representará uma concessão injustificável às máfias que se apoderaram da região. A hora efetivamente é de agir. Com serenidade - utilizando-se dos recursos de inteligência e investigação policial - mas também sem permitir que o banditismo vença mais uma vez.

O céu é o limite

Fenômeno empresarial que em breve se tornará um case de sucesso instantâneo, a empreiteira Belém Ambiental Ltda., a BA, já se sente forte o suficiente para entrar com força em outros mercados, depois de abocanhar, por tortuosos e misteriosos caminhos, o naco principal da limpeza urbana e das obras de pavimentação em Belém.
Após participar de uma grande licitação do Governo do Distrito Federal para a conservação das áreas verdes do Plano Piloto, pacote de serviços de muitos milhões de reais, a BA é o epicentro de uma intricada disputa judicial. Os demais concorrentes suspeitam de concorrência desleal com a apresentação de preços fictícios.
Caso alguém tenha alguma sugestão de como resolver o imbróglio, cartas e e-mails podem ser encaminhados ao Palácio Antônio Lemos, sede do governo municipal de Belém.

Replicante

Pode ser mera coincidência. Caiu, ontem (19), o secretário de Segurança Pública da Bahia, Paulo Bezerra, depois de sob sua gestão ter havido um expressivo aumento nos números da violência durante o primeiro ano do governo Jaques Wagner (PT-BA).
Sob fogo cerrado da oposição, principalmente depois da ocorrência de 25 assassinatos na região metropolitana de Salvador em um único final de semana, Bezerra não teve outro caminho que não fosse apresentar sua carta de renúncia ao governador.
Para sua cadeira, como já vem ocorrendo em outros Estados governados por petistas ou pela base aliada, será convocado um delegado da Polícia Federal, uma forma indireta de "federalizar" os precários sistemas estaduais de segurança.
Tal como no Pará, em breve será possível conferir e cobrar os resultados.

Dialética do protagonismo popular

"A consciência-de-ser-povo produz permanentemente sínteses superadoras das dicotomias sociais, levando a base popular a saltos qualitativos e à participação sempre mais plena na gestão do poder".


Pasquale Di Paolo (Cabanagem: a revolução popular da Amazônia, 1990, p.367

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Variações em vermelho

A carta-renúncia de Fidel, cuja repercussão incendeia a blogosfera desde cedo, precisa ser colocada em um contexto mais realista, menos fantástico. A história da revolução cubana não foi obra solitária de um punhado de homens, muito embora Fidel seja parte - talvez a mais eloqüente e determinada - de uma vanguarda que soube estar à altura (e, muitas vezes, adiante) dos desafios de seu tempo. Heróis, sim, mas humanos, de carne e osso. Mediados pelas circunstâncias e determinações concretas da vida real.
Não cabe alimentar expectativas quanto a mudanças bruscas, rupturas políticas, retornos apoteóticos ao capitalismo ou qualquer coisa do gênero. Quem conhece com o mínimo rigor o cenário político-social cubano sabe que a continuidade da revolução - com todos os seus méritos e contradições - não depende de um único homem, mesmo que seja um líder com as qualidades e dimensões de Fidel. Também não estamos diante de uma solução necessariamente familiar, oligarquia socialista, cujo poder ou irá para Raul Castro, revolucionário e dirigente de primeira hora, ou se dispersará em um torvelinho de desagregação.
O mais provável é que Cuba siga seu rumo, reforçando opções que têm marcado sua trajetória nos últimos 15 anos pelo menos. Sem solavancos, sem retrocessos, mas ainda navegando pelas turbulentas águas do cerco econômico, político e midiático patrocinado pelo governo estadunidense.
Com Raul ou com outro quadro - e há muitos de enorme preparo na cúpula do Partido Comunista - o horizonte cubano continuará sendo pintado de vermelho, infinitas variações do mesmo tema de justiça e igualdade que embala os melhores sonhos da humanidade há tanto tempo.

Livro dos recordes

Lucrar, lucrar e lucrar. O que mais os empresários querem? Mas, está para além de qualquer expectativa poder aumentar o preço de seu principal produto em até 71%. Certo? Pelo menos para a Vale do Rio Doce, gigante mundial de setor de mineração, que acaba de fechar com seus principais clientes a segunda maior elevação do preço do ferro desde 2005, quando a majoração ficou em 71,5%.
Os acordos estão sendo acertados com cada um de seus parceiros comerciais. Por exemplo, as japonesas JFE Steel e Nippon Steel aceitaram uma elevação de 65%. Com a sul-coreana Posco, a tonelada passou a custar US$ 78,90. Em breve, o mercado siderúrgico chinês, que já absorve 30% da produção de Carajás, deve também aceitar um acordo em torno dos incríveis 71%. É essa pelo menos a expectativa de analistas que acompanham as negociações entre a Vale e a Baosteel, que representa as empresas chinesas.
Uma montanha de dinheiro. Caminho seguro para que a ex-estatal continue batendo, ano a ano, todos os seus recordes de produção e de lucratividade.
O que nos sobra desse festim multibilionário? Quase nada. O jornalista Lúcio Flávio Pinto, na edição do Jornal Pessoal que está nas bancas, estima que talvez alcance 10% o valor "devolvido" ao Estado que abriga a maior província mineral do mundo, isso se somados hipoteticamente os valores relativos à massa de salários, pagamento de royalty e compras locais. Para quitar impostos, como se sabe, a Vale não abre mesmo a mão, já que goza desde 1997 de isenção de ICMS através da lei Kandir, esdrúxula invenção tucana que alcançou status constitucional sob o governo Lula.
Com a cabeça ocupada com as intrincadas negociações de mercado para aquisição da anglo-suíça Xstrata, por US$ 90 bilhões, os executivos da Vale não se prestarão a dedicar alguns segundos sequer para analisar a dramática situação de dezenas de famílias de pequenos agricultores do Projeto de Assentamento Campo dos Sonhos, em Ourilândia, sudeste do Pará, que sofrem violenta pressão da Onça Puma, uma das muitas empresas do grupo, dedicada à exploração das reservas de níquel da região. Abertura ilegal de estradas dentro dos lotes, contaminação de riachos e nascentes, aquisição de áreas por preço subavaliado, são algumas das denúncias que os camponeses querem debater em uma audiência pública.
Talvez sem saber, essas famílias de brasileiros embrenhados na floresta, estejam travando uma batalha contra um verdadeiro Estado do mundo, monopólio dos monopólios, que se julga acima e credor dos Estados nacionais que supostamente controlam os territórios nos quais atua. Confronto desigual, quem sabe fadado ao fracasso, mas que possui a coragem de desafiar o estúpido coro dos contentes e sua eterna promessa de um progresso que nunca virá.

Quem tem medo do Araguaia?

A Guerrilha do Araguaia, mais de 30 anos depois de aniquilada por tropas do Exército brasileiro, permanece como uma ferida aberta. A história oficial não dá conta nem de uma pequena fração do que realmente aconteceu naquela guerra suja, permanecendo como um segredo de Estado que encobre os crimes praticados pelos militares encarregados de por fim ao movimento deflagrado pelo Partido Comunista do Brasil (PCdoB) no Pará. Não é por outro motivo que uma parte razoável dos desaparecidos políticos do período da ditadura militar tenham vinculação direta a este episódio sangrento.
Em mais um capítulo da luta por desenterrar a memória da repressão militar, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) anuncia que ingressará, no Supremo Tribunal Federal (STF), com uma notícia-crime para apurar quem foi o responsável pela suposta destruição dos documentos referentes à Guerrilha do Araguaia, fato alegado pelas Forças Armadas para continuar omitindo dados sobre a localização de mortos e desaparecidos.
Recentemente o governo federal, através da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, lançou um livro “Direito à memória e à Verdade – Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos”. Edição primorosa, conteúdo histórico rigoroso e bela apresentação gráfica, transformam esta publicação em fonte indispensável para quem se dispuser a levantar os véus do silêncio e da impunidade que ainda cobrem a história das últimas quatro décadas no Brasil. Mas ainda é pouco. De um governo que se elegeu, em 2002, despertando tantas expectativas de mudanças, o saldo do governo Lula neste aspecto é claramente negativo. Quem sabe que a iniciativa corajosa da OAB recoloque o tema da impunidade dos crimes da ditadura na pauta dos debates do país.

Que chamem Maíra

Na complexa cosmologia Tembé-Tenetehara, Maíra é o herói mítico responsável pelo ciclo da criação. Estes indígenas do tronco Tupi-Guarani nunca estiveram tão ameaçados, com suas terras invadidas por madeireiros e colonos há várias décadas. Talvez a saga dos Tenetehara - é assim que se autodefinem, significando simplesmente gente, índios no geral - do lado paraense não seja menos trágica que a de seus irmãos maranhenses, os Guajajara, igualmente vilipendiados em seu direito à sobrevivência pela contínua expansão da fronteira agrícola.
Nas últimas semanas o conflito entre índios e posseiros atingiu o grau máximo. É previsível novas situações de violência, como a que faz reféns, desde domingo (17), pelo menos 25 indígenas de três famílias Tembé, impedidos de sair da aldeia Itahu por mais de 2 mil pessoas arregimentadas entre os muitos colonos que ocupam ilegalmente a Reserva Alto Rio Guamá de 279 mil hectares.
Os Tembé estão nesta região entre os rios Guamá e Gurupi desde 1845. Há farta documentação historiográfica reconhecendo a posse dessas terras. Durante décadas dedicaram-se à extração do óleo de copaíba, que era negociado com os regatões que percorriam os rios. O sistema utilizado era o do aviamento, através do qual as mercadorias eram adiantadas e posteriormente pagas com produtos florestais coletados pelos índios. A truculência dos comerciantes provocou o primeiro conflito documentado em 1861, quando nove brancos foram mortos. Índios foram espancados pelo responsável pela apuração dos crimes e nove crianças indígenas foram raptadas e remetidas a Vizeu. A partir daí, no ano seguinte, os regatões foram proibidos de ingressar na área indígena e a população Tembé foi reunida e novos aldeamentos. Essa proibição, é claro, jamais foi obedecida.
Muitas décadas depois, em 1943, foi oficialmente criada a Reserva do Alto Rio Guamá, mas sua homologação só ocorreu, após inúmeros conflitos, em 1996. Até hoje a área não foi liberada para o usufruto exclusivo dos 1500 índios e permanece ocupada por 25 mil colonos.
Mais uma vez anuncia-se a formação de uma força-tarefa (Funai, Incra, PF e órgãos estaduais) para tentar debelar o conflito, evitando um desfecho sangrento. Que a emergência da intervenção não sirva de desculpa para o adiamento de uma ação profunda e estrutural na área, assegurando, de uma vez por todas, os direitos inalienáveis do povo Tembé às suas terras ancestrais.

Ditadura revisitada

Quando vale a pena ver de novo: a Caros Amigos Editora acaba de lançar nas bancas de todo o país uma nova coleção de fascículos, "A Ditadura Militar no Brasil". Serão 12 edições quinzenais, com 32 páginas e em quatro cores. O primeiro número, "A noite do golpe", já está disponível para compra. O planejamento da coleção, de excelente qualidade editorial, coube a dois experientes e combativos jornalistas, José Arbex Jr. e Hamilton Octavio de Souza. E a edição passará pelas mãos de Mylton Severiano, cuja carreira se confunde com várias décadas de imprensa alternativa no país. Há alguns anos atrás, a Caros Amigos lançou sua primeira coleção de fascículos, "Rebeldes Brasileiros - Homens e Mulheres que Desafiaram o Poder", fonte obrigatória para quem deseje um olhar crítica sobre a história nacional. Com esse currículo invejável, tudo sinaliza para um excelente produto editorial. A conferir.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Sem senso de humor

Até o Circo Portugal, armado no Entroncamento, não escapou da onda de violência que assola a capital paraense. Na madrugada de ontem (17), bandidos armados realizaram um assalto às dependências da companhia circense, roubando perto de R$ 60 mil, resultado da semana de espetáculos. Aterrorizada, a trupe parece disposta a antecipar o desarme de suas lonas e encurtar a temporada em Belém.

Com informações do Portal ORM

O especialista

Algumas Unidades Básicas de Saúde da Prefeitura de Belém têm recebido nas últimas semanas visitas inusitadas. São agentes do Ministério Público Federal que buscam encontrar - geralmente sem êxito - equipamentos comprados com recursos do Sistema Único de Saúde (SUS). O detalhe é que no cadastro da Secretaria Municipal de Saúde (Sesma) esses equipamentos - microcomputadores, inclusive - constam como distribuído às unidades.
Alguns funcionários - que falam sob a proteção do anonimato - relatam que a pressão do gabinete da Sesma é cada vez maior para que atestem a existência dos equipamentos, ou, ainda, que sejam cúmplices em tentativas de fraudar a fiscalização. Assim, móveis, computadores e equipamentos médicos seriam enviados para as Unidades somente pelo tempo necessário à visita dos fiscais do MPF. Logo depois, tudo toma rumo incerto e não sabido. Trabalho de especialista, com vasta experiência em movimentações fantasmagóricas em diversas áreas, que agora utiliza suas habilidades no caótico sistema de saúde municipal.

Línguas de trapo

Correndo atrás do prejuízo, Flexa Ribeiro e Zenaldo Coutinho aparecem hoje na imprensa duelando com os fatos. O primeiro, depois de freqüentar durante dias a mídia nacional como um dos líderes da bancada da devastação, tenta negar a evidente relação de seu projeto de “recomposição de áreas degradadas” - leia-se, autorização para plantio de culturas homogêneas, como dendê e eucalipto - com a propalada anistia aos desmatadores, em estudo no Ministério do Meio Ambiente. Não teria nada a ver, diz o senador tucano em apuros. A missão do deputado federal do PSDB é ainda mais inglória: comprovar que Paragominas foi incluído injustamente na relação dos 36 municípios que mais devastaram a floresta no último período. Ao contrário, trata-se de um exemplo vitorioso de “desenvolvimento sustentável”. Manobra diversionista fadada ao fracasso. Afinal, ninguém duvida que o reinado de 12 anos do PSDB no Pará correspondeu ao fortalecimento sem precedentes dos segmentos econômicos mais vinculados ao modelo predatório e excludente.
Recorrer ao discurso da “sustentabilidade” – revestido de evidente carga ideológica – soa de um anacronismo atroz, peneira grossa demais para encobrir os efeitos da expansão brutal da monocultura da soja, da indústria suja do ferro gusa e do trabalho escravo em fazendas e carvoarias, seu “subproduto” necessário.
Uma pena que na defesa - aberta ou velada, tanto faz - deste modelo os tucanos não estejam sozinhos. É justamente este o elo que identifica a continuidade perversa entre os governos de FHC e de Lula. Mórbida e dramática semelhança.

A firma

Crime comum ou espionagem internacional? O furto de informações estratégicas da Petrobras, a maior empresa da América Latina, com valor de mercado em 2007 estimado em US$ 252,7 bilhões, revela, antes de tudo, um enorme despreparo de seus dirigentes. Como explicar que dados sigilosos, referente à nova bacia petrolífera descoberta no litoral paulista, transitem em contêiner, armazenados em laptops comuns, sem qualquer esquema especial de segurança?
Tratar “segredos de Estado” com tamanho desleixo, muito embora pagando US$ 270 milhões por um contrato de quatro anos para uma empresa multinacional especializada em segurança – a Halliburton, segunda maior companhia de serviços de petróleo do mundo, vinculada ao vice-presidente norte-americano Dick Cheney – revela mais um roteiro mambembe de uma comédia da antiga Vera Cruz, estrelada por Mazzaropi, do que uma superprodução baseada em algum livro de John Grisham.
Para jogar mais lenha na fogueira, o perito Isaac Morais, do Núcleo de Criminalística da Superintendência da PF no Rio de Janeiro, afirma estar convencido, pelos indícios que encontrou até o momento, que se tratou de crime comum, sem que seus autores tivessem noção dos dados armazenados nos equipamentos de informática furtados.
Para o governo federal, entretanto, o desaparecimento dos quatro notebooks é fruto de um intricado esquema de espionagem e de violação de dados essenciais à soberania nacional. Tão essenciais que nem a cena do crime foi preservada, regra indispensável para uma investigação possa alcançar sucesso.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Transações opacas

Entre um brinde e outro, não se falava em outra coisa nas rodas de ricos e famosos da capital. Todos comentavam o excelente negócio realizado por uma socialite que acabara de arrematar, por valor não muito superior a R$ 1 milhão, o flat do ex-governador Almir Gabriel (PSDB), em um prédio luxuoso no centro de Belém. Uma pechincha, diziam.
Diante da abundante presença de outdoors na cidade alardeando a “seriedade e honestidade” do político tucano, exatamente no momento em que ele anuncia – mais uma vez – sua “aposentadoria”, talvez repetindo a pantomima de 2003 (alguém se lembra que ele iria cuidar das orquídeas e dos netos?), não deve ser muito difícil que esclareça, diretamente ou por meio de seus muitos porta-vozes, qual o valor real do negócio e o que explicaria sua súbita e algo fantástica valorização. Afinal, não foi este mesmo imóvel (apartamento 2100, no elegante Torre de Alhambra, localizado rua João Balbi, 296) que foi declarado ao TRE, nas eleições de 2006, por apenas R$ 343.659,00?

Chafariz escandaloso

Chafariz é uma palavra de origem árabe. Provém de sihrídj 'cisterna, tanque', como ensina o Houaiss, pai de todos os burros. Desde 1392 penetrou na língua portuguesa (çafarege, caffarege, chafariz) e está aí até hoje significando "fonte com uma ou mais bicas por onde corre água, na maioria das vezes fazendo parte de um conjunto arquitetônico". Quem passa pela Almirante Barroso e se defronta com as instalações do Centro de Ensino Técnico e Tecnológico do Pará (Cefet), transformado repentina e espetacularmente numa lucrativa fábrica de concursos públicos do governo do Estado, não tem motivos para ficar tranqüilo quanto à lisura dos certames, depois da enxurrada de denúncias acumuladas nas últimas semanas. Aquilo virou um enorme chafariz de escândalos.
O comentário de um muito bem informado leitor anônimo na caixinha do post "Credibilidade em frangalhos", pela riqueza de informações, oferece muitas pistas para quem queira se dedicar a um necessário trabalho de arqueologia em defesa do dinheiro público.

Diz o Anônimo das 8:17 de hoje:

"Ora, essa história de dizer que o CEFET não tem experiência em concursos não cola... senão, vejamos:1. Logo que o atual diretor-geral assumiu o CEFET, houve um grande concurso para contratação de professores para o quadro efetivo da instituição.2. Na lista de aprovados deste concurso, figuravam pelo menos sete candidatos com vínculos e relações pessoais diretas com a direção e seus apaniguados.3. Havia mulher de professor, sobrinho de diretor, filho de funcionário, funcionários do próprio CEFET, o marido da amante de um dos diretores, enfim, um verdadeiro concurso.4. Um tópico especial deve ser dedicado a uma candidata que, somente graduada, com um documento falso para comprovação de pós-graduação, venceu experiente professor doutor em prova de desempenho. Infelizmente, o CEFET não teve a honra de desfrutar por muito tempo a sapiência desta senhora. Assim que o atual governo estadual se instalou, ele foi providencialmente removida para assumir um cargo de direção em uma Secretaria de Estado.5. Como já faz algum tempo da realização deste concurso, minha memória já começa a falhar. Portanto, passemos para o próximo concurso, também realizado para a contratação de professores efetivos, mas desta feita para o interior.6. Para não fugir a regra, dois filhos do diretor-geral foram aprovados, a esposa de um subordinado, uma leal servidora técnico-administrativa e mais um bate-pau da direção.7. Agora, o que é mais interessante é que todo esse povo trabalha aqui em Belém, a despeito de terem sido contratados para suprir as necessidades do quadro de professores das UNEDs no interior do Estado.8. Não vou afirmar isso para não ser leviano, mas comenta-se intramuros que algumas dessas pessoas ainda recebem diárias para permanecer aqui em Belém. Não sei se é verdade...
9. Para finalizar, há bem pouco tempo atrás, mais um concurso organizado pelo CEFET. Aliás, desta vez, já organizado pela Fundação Ctrl-C + Ctrl-V. Nesse concurso, para mostrar que as coisas já haviam mudado, da lista de aprovados, que eu conheça, pelo menos de relevância, somente a nora do diretor-geral.10. Enfim, esse argumento estapafúrdio de que o CEFET não tem experiência em concursos não tem fundamentos. Parece mais choro de derrotados, incompetentes mesmo, pessoas que não tem no sobrenome aquele artefato que jorra água, colocado no plural.Esperemos para ver no que vai dar. Só não vale dizer que a Auditoria Interna do CEFET está trabalhando no caso. Aí é maldade demais para com os candidatos".

Ciro, sincero?

"Você é muito jovem e um dia vai se sentar aqui. Verá que caiu o presidente que não contemporizou com o patrimonialismo". A frase, atribuída a FHC, foi ouvida por Ciro Gomes (PSB-CE) em uma conversa "explícita" sobre a "frouxidão moral" do governo do tucano e revelada pela primeira vez em uma estranha entrevista publicada na Folha de São Paulo deste domingo.
E Lula, também contemporizou com o patrimonialismo? É Ciro, entre cético e cínico, quem responde: "É o que estou lhe dizendo. Não deveríamos aceitá-lo, deveríamos manter sempre disciplina crítica contra isso, mas devemos reconhecer que é um traço da realidade. Como atenuar? Governo vai ter sempre corrupção".
Então, estamos combinados: que se restaure a moralidade pública ou, diante da notória impossibilidade de uma faxina de tão oceânicas dimensões, que aumente o fluxo de migalhas em direção aos que daqui de baixo continuam excluídos do animado baile da Ilha Fiscal.

Antena de ouro

Da construção de espigões de aço, concreto e vidro diretamente para o alegre mundo da comunicação midiática. Por um preço guardado a sete chaves, mas que pode ter alcançado alguns milhões de reais, um endinheirado empresário do setor da construção civil seria o mais novo dono de um canal de TV em Belém. Mais-valia absoluta, quando se sabe que a concessão foi obtida por meios muito pouco ortodoxos. Ao feliz deputado coube apenas a simples retirada de sua assinatura em requerimento de uma inconveniente (para o governo, é claro) CPI no Congresso Nacional. Quem acertar o nome do nobre parlamentar se habilita ao sorteio de uma coleção completa dos maiores hits de todos os tempos do brega music paraora.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

Desumano, cruel e degradante

Chocantes as fotos do trabalhador marcado a ferro e fogo nas fazendas do escravocrata Gilberto Andrade, em Paragominas, publicada hoje na imprensa. São marcas de uma violência produzida por quem se imagina acima da lei.
No local onde foram encontrados pelo Grupo Móvel, os trabalhadores recebiam tratamento muitas vezes inferior ao que é destinado aos animais. Bebiam água contaminada e a comida não era digna nem de porcos.
Diante de fatos dessa natureza, soa como uma ofensa ouvir de parlamentares e empresários a desgastada cantilena de que "trabalho escravo não existe no Brasil", quando muito, "em casos isolados", existiriam trabalhadores em "condições degradantes". Lenga-lenga de quem tem rabo preso com agentes da barbárie moderna.
Em pleno século XXI, um tratamento cruel, desumano, degradante e, sem a menor dúvida, assemelhado à escravidão. Escravidão tão cruel e desumana quanto aquela que predominou no país - como direito líquido e certo dos proprietários - por quase 400 anos e cujas marcas dilaceram até hoje a sociedade brasileira.

Pega um, pega geral

Cena inusitada: policiais federais realizaram na manhã de ontem (15) uma operação no 20o Batalhão Comunitário de Policiamento da Capital, no bairro do Guamá, em Belém. Estavam em busca de armas e dinheiro. E agiram cobertos por mandado expedido por um juiz federal.
Não foram divulgados detalhes do que, por ventura, possa ter sido encontrado. Mas pode ser um excelente sinal de que algo se move para revolver as entranhas da parte putrefata do aparato policial paraense.

Credibilidade em frangalhos

Não é um fato isolado. As questões replicadas em diversas provas dos concursos executados pelo Centro Federal de Educação e Tecnologia do Pará (Cefet) - em parte já admitido pela própria Seduc - revelam um comportamento sistemático de fraude. Às vésperas da prova que vai selecionar as quase 9.500 vagas para professor do Estado, a gritaria é enorme entre professores de cursinhos e candidatos inscritos. Todos exigem a suspensão imediata do concurso e consideram insuficientes as medidas anunciadas pelo governo, que ficaram limitadas à anulação das provas para o cargo de fonoaudiólogo, estatístico, economista, nutricionista e bibliotecário. Medidas necessárias, mas insuficientes diante da gravidade da denúncia que esfarelou em definitivo a pouca credibilidade que o concurso C-126 ainda possuía. Triscaram de leve na pontinha do iceberg, sem coragem para adotar o remédio correto: afastar o Cefet da coordenação do certame, abrindo uma apuração imediata e rigorosa para chegar aos responsáveis pela lambança.
Cresce a cada momento a sensação de que atua, nas sombras como é conveniente nestes casos, um bem articulado esquema de proteção aos dirigentes do Cefet, cuja experiência em concursos públicos até então era considerada nula. A situação fica mais insustentável quando se sabe que entre os manda-chuvas da antiga Escola Técnica Federal está o professor Edson Ari, irmão de Edilza Fontes, uma das principais conselheiras da governadora Ana Julia (PT).

Verdadeiro, sim, como uma nota de R$ 15

Diz-se que o hábito faz o monge. Um ditado antigo, com raízes perdidas em tempos remotos o suficiente para que monges e seus imaculados hábitos fossem colocados à prova e virassem sinônimo de malfeitorias. O que dizer então de Edir Macedo, bispo e fundador da maior multinacional da fé do mundo, a Igreja Universal, com seus 8 milhões de fiéis no Brasil, 4.700 templos em 172 países, “mais globalizada que a rede Mac McDonald’s”, segundo reportagem da Época, foi denunciado como autor de uma suposta fraude documental em um negócio da Rede Record, em Santa Catarina.
A Polícia Federal acaba de abrir inquérito para apurar os crimes de falsidade ideológica e de uso de documento falso na transferência da propriedade da TV Itajaí, retransmissora da Rede Record na região.
Logo vão aparecer os que enxergarão no inquérito, que poderá ser aceito em breve pela Justiça Federal, sintomas de “preconceito e perseguição religiosa”. Outros dirão que não passa de intriga dos veículos concorrentes – Globo et caterva – cada vez mais invejosos diante do sucesso empresarial da Record. Simples cortina de fumaça.
Há muito que se espera uma investigação séria sobre os negócios mundanos dos dirigentes da Universal, capaz de desvelar o verdadeiro milagre existente na transformação de milhões de dólares recolhidos em dízimos de pessoas humildes no mundo inteiro e que vão irrigar, depois de transitarem por canais da esperteza, as contas bancárias dos agora prósperos empresários da casta dominante das comunicações e da política.
Será que esse processo irá adiante?

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Ecos de Columbine

Mais um massacre em uma universidade dos Estados Unidos. A receita é sempre a mesma: um atirador solitário e uma fabulosa coleção de armas da morte. O resultado é um rastro de sangue e dor. Na Universidade de Northern Illinois foram seis vítimas fatais, além de 15 feridos.Uma sociedade que faz a apologia das armas e do direito a portá-las colhe, de maneira sistemática e recorrente, os sangrentos frutos de uma opção que coloca a preservação do lucro acima da vida. O lobby da indústria de armas não se deixa abalar e não dá mostras de arrefecer sua eficiente campanha voltada a manter o cidadão estadunidense como um dos mais armados (e perigosos) do mundo. Massacres como o da escola Columbine (12 estudantes assassinados, em 1999) ou da Universidade Virginia Tech (32 vítimas fatais, em abril do ano passado) são gritos eloqüentes em uma nação que optou pela surdez embrutecida, acostumando-se a digerir o pavoroso travo da cumplicidade a cada nova tragédia.

Floresta zero

Está na edição de hoje de O Globo. Ambientalistas do Greenpeace reagem com vigor às manobras da bancada da devastação, tendo à frente o senador paraense Flexa Ribeiro (PSDB). É de sua autoria o projeto que reduz a área de reserva legal de 80% para 50% na Amazônia e propõe a anistia para os predadores, um criminoso retrocesso em termos da legislação ambiental.
"A lógica do projeto Floresta Zero é o pragmatismo do fato consumado e do lucro rápido, que se alimenta da certeza de impunidade amparada na falta de governança e se beneficia de um sistema jurídico complexo, lento e ineficiente", afirmam.
Porta-voz do que há de mais atrasado no Congresso Nacional, o senador paraense que fez carreira no mundo empresarial a partir de seu íntimo relacionamento com políticos tucanos, vai precisar de muito latim para explicar sua contumaz presença sempre ao lado mais sombrio da política brasileira.

Dialética da palavra engajada

"Eu escrevo para os que não podem me ler. Os de baixo, os que esperam há séculos na fila da história, não sabem ler ou não tem com o quê".


Eduardo Galeano (O livro dos abraços, 2003, p.153)

Que rei sou eu?

Só faltou esquecer o próprio nome. Nem quem era secretário de saúde em dezembro de 2005, período em que ocorreu o desvio de R$ 2 milhões, como fartamente comprovado nos autos da Ação da Justiça Federal, o prefeito Duciomar Costa conseguiu recordar. Um caso crônico de providencial amnésia, seguindo à risca o roteiro prévio acertado com seus advogados.
Em resumo, alegou não saber de nada. Está mais por fora que umbigo de vedete.
Depois do súbito esquecimento de uma série de atos e decisões que transitaram por seu gabinete meses a fio, Duciomar ainda arranjou tempo para fazer, diante do desembargador Cândido Ribeiro, revelações fantásticas - acredite quem quiser - sobre os elevados investimentos de sua administração em saúde, que alcançariam 23% da receita do município. Para os adeptos de São Tomé, recomenda-se uma rápida visita ao site do Ministério da Saúde (http://w3.datasus.gov.br/datasus/datasus.php).

Cachimbo da paz

Já foi muito pior, com mais tapas do que beijos, a relação entre um rico empresário de Barcarena (123 km de Belém), aspirante a cargo político nas próximas eleições de outubro, e um conhecido dublê de parlamentar, dançarino e animador de auditório.
Pelas vielas do município, entre um zouc e outro, parecem estar chegando a um acordo de convivência. Cada um vai poder preservar suas preferências, sem qualquer preconceito.
Para ajudar a reconciliação, que muitos dão como certa, faltaria apenas o consenso sobre determinadas pendências que está mais para a aritmética do que para a política.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

A ferro e fogo

O fazendeiro Gilberto Andrade, deve se definir como um típico representante das tais “classes produtoras do campo”, mas se pudesse, faria o tempo girar para trás, lá pelos idos do século XVII, onde a escravidão de índios e negros era não só normal como indicava o nível de prestígio da aristocracia da época. Quantos mais escravos a seu serviço, maiores os cabedais e as honrarias que fidalgo poderia ostentar. Quanto mais violento no trato com sua escravaria, mais temido e respeitado.
Reincidente no crime de reduzir trabalhadores à condição análoga à escravidão, este legítimo eleitor da operosa bancada ruralista, foi flagrado ontem (13) por uma equipe do Grupo Móvel do Ministério do Trabalho mantendo 35 trabalhadores escravizados em uma de suas fazendas, em Paragominas, sudeste paraense.
Após os procedimentos de praxe, as vítimas foram conduzidas até a cidade, onde estão recebendo assistência e proteção das autoridades federais.
Segundo a lista suja de empregadores, disponibilizada para consulta no site do Ministério do Trabalho e Emprego (
www.mte.gov.br), Gilberto Andrade já foi autuado em novembro de 2005, em sua fazenda Boa Fé, no município maranhense de Centro Novo, da qual foram libertados na ocasião 18 trabalhadores. Protegido pela impunidade, ele não teve dúvida em voltar a delinqüir, agora do lado paraense de suas vastíssimas propriedades.
Um detalhe mórbido despertou a indignação da equipe de fiscais: um dos trabalhadores libertados exibiu uma marca nas costas, gravada a ferro quente, como punição à sua tentativa de empreender fuga da fazenda. Por mais inacreditável que pareça, a tortura já foi confirmada pelas autoridades policiais.
Espera-se agora que a mão pesada da lei, muitas vezes célere e vigorosa quando se trata de encarcerar pobres envolvidos em pequenos delitos, aja com rapidez e determinação para por atrás das grades os responsáveis por esses crimes contra a dignidade humana. Caso contrário, será dado um poderoso atestado de cumplicidade e de fraqueza diante de modernos capitães do mato.

Teclados de aluguel

Alguém ainda se lembra do Batfino, aquele simpático morcego que não se cansava de repetir o bordão: "Suas balas não me atingem, minhas asas são como uma couraça de aço"? Se depender de O Liberal o prefeito Duciomar não precisa esquentar a cabeça com suas cada vez maiores broncas judiciárias. O prefeito da capital será interrogado hoje em Brasília, na qualidade de réu em uma ação federal por improbidade administrativa- desvio de R$ 2 milhões de verbas da Saúde -, mas nada disso tem importância suficiente para ganhar algumas poucas linhas no outrora maior jornal do Pará.
Da primeira à última página, passando pelo sanguinolento caderno de Polícia (talvez o local mais adequado para se fazer o registro), nada, absolutamente nada foi dito. Isso é que blindagem, para tucano nenhum botar defeito.

Tuíra e seu facão, 19 anos depois

As idas e vindas da provável (mas ainda insegura) nomeação do engenheiro José Antônio Muniz Lopes para a presidência da Eletronorte, sob as bênçãos de seu eterno padrinho José Sarney, evoca imagens de quase 20 anos e dá a dimensão do quanto a Amazônia vive enredada num labirinto que parece não ter fim. Altamira, finais de fevereiro de 1989. Mais de 3000 participantes - entre os quais 650 indígenas - lotam o plenário do histórico I Encontro dos ovos Indígenas do Xingu. Sob os holofotes da mídia nacional e internacional, a índia Tuíra, da nação Kaiapó, aproxima o facão da face do então diretor da Eletronorte (mais tarde, sob FHC, ele seria presidente da estatal). A foto desse desencontro correu o mundo e ilustrou a vitória de índios e ambientalistas. Naquele momento foi derrotado o plano de construção das usinas hidrelétricas na volta grande do Xingu, o projeto Kararaô, hoje lipoaspirado sob o novo nome de Belo Monte.
A roda do mundo girou e, duas décadas depois, estão mais vivos do que nunca o mesmo José Muniz - representando os mesmíssimos interesses das empreiteiras de sempre - e a disposição governamental de transpor todos os obstáculos para construir grandes barragens na Amazônia, fonte de energia boa e barata para a indústria eletrointensiva (afinal, a Alcoa e a Vale não têm tempo e dinheiro a perder).
A novidade, talvez, seja outra. Depois de anos de marasmo, ressurge com força uma articulação dos povos indígenas em aliança com os movimentos sociais da região. Prometem repetir - simbolicamente, é claro - o gesto corajoso da guerreira Tuíra e colocar o governo e os barrageiros contra a parede novamente. Será em maio, na mesma Altamira. Palavras de ordem e cânticos de guerra em defesa da sobrevivência da floresta e de seus filhos.

Um bom começo

Caiu uma quadrilha de PMs que espalhava o terror entre Marabá e Conceição do Araguaia. O grupo de extermínio, formado por três praças e dois oficiais, é acusado, entre outros crimes, de cinco assassinatos. Agia a soldo de quadrilhas de traficantes de drogas, eliminando integrantes de facções rivais.Depois desse início de faxina, não custa voltar os olhos para o que acontece na Grande Belém, cenário por onde circulam com ampla liberdade grupos de celerados que nada ficam a dever a seus congêneres do sul e sudeste do Estado.

¿Por qué no hablas?"

Os paranaenses já têm o direito de assistir, todas as noites, ao noticiário da Rede Telesur para a América Latina. E em português. A iniciativa é do governador Roberto Requião (PMDB), declarado simpatizante de Hugo Chávez.O telejornal vai ao ar às 20 horas, através do canal aberto da TV Educativa, mas também está acessível nas antenas parabólicas (canal 25).Fica a sugestão para o auto-proclamado "governo democrático e popular". Que tal incluir essa programação na grade da TV Cultura?

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Réu, sim senhor

Risível, para dizer o mínimo, a nota da Coordenadoria de Comunicação da Prefeitura de Belém, distribuída à imprensa hoje à tarde, afirmando que partiu de uma solicitação do próprio prefeito Duciomar Costa (PTB) a "audiência" que terá com o desembargador federal Cândido Ribeiro, a ser realizada na manhã desta quinta-feira, 14, em Brasília. É como se ele fosse fazer uma visita de cortesia ao prédio do Tribunal Regional Federal (TRF-1). Nada mais distante da realidade. O prefeito de fato solicitou, via fax, que ele pudesse ser ouvido em Brasília e não em Belém, como estava previsto, na tentativa de atenuar a repercussão evidentemente negativa de estar sendo intimado a um interrogatório na desconfortável condição de réu. Réu em uma Ação Penal Pública (2006.01.00.036879-9), solicitada pelo Ministério Público Federal (MPF) e aceita pela Justiça Federal, que enxergou indícios suficientes da prática de vários delitos, entre os quais o Crime de Responsabilidade previsto no Decreto Lei 201/67.
Para refrescar a memória: Duciomar é acusado do desvio de quase R$ 2 milhões de recursos do Sistema Único de Saúde (SUS), que deveriam reforçar as ações e serviços de vigilância epidemiológica e sanitária, mas acabaram desviadas para a aquisição de cerca de 50 veículos para a Guarda Municipal (GBel), em 2006. Além da queda, o coice: depois de desviar a finalidade dos recursos, o governo municipal ainda tentou fraudar a fiscalização realizada pelo Ministério Público Federal, modificando a pintura dos carros e motos. O esforço, entretanto, foi em vão. Os peritos federais recolheram provas definitivas da adulteração.Se condenado, Duciomar Costa estará sujeito a cumprir pena de até três anos de detenção, deverá perder o cargo e ainda ficar inabilitado para o exercício de função pública por um longo período.
Numa palavra, um escândalo de proporções amazônicas. Aí entrou em ação a máquina de propaganda custeada com recursos públicos e apelar para a boa vontade dos veículos de comunicação para diminuir ou mesmo neutralizar a repercussão negativa. Já se ouve o tilintar de caixas registradoras.

De barriga cheia

O Itaú, segundo maior banco privado brasileiro, quase dobou seu lucro em 2007, alcançando a cifra recorde de R$ 8,474 bi, o que representou um aumento de 96,7% em relação ao ano anterior. Nada mal, portanto.
As elites - capital financeiro à frente - não têm mesmo do que reclamar. Estão no poder, mais fortes e melhor representadas do que nunca. E o Mário Amato, no já distante 1989, ainda queria liderar uma fuga em massa de empresários para Miami, temendo o "efeito Lula". Tigre de papel, como sobejamente comprovado.