segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Elementar, meu caro Watson

O leitor do Página Crítica já sabia. Desde fevereiro de 2008, já sabia que da Belém Ambiental exalava um fedor muito mais ácido do que aquele derivado do chorume que segue pingando de seus carros coletores da limpeza urbana.
No centro da trama, a simpática São Luiz do Curu, no interior cearense. Como se sabe, esta cidadezinha é inocente. Só ela, porque os personagens envolvidos na armação - todos eles - são culpados de variados e diversos crimes. Mas seguem impunes, como sempre.
A novidade, algo reiterativa aliás, foi o destaque dado ao assunto pelo Diário do Pará, em ampla manchete no domingo passado.
Afinal, 2010 com toda sua carga de fortes e intensas emoções chegou mesmo para ficar.

sábado, 29 de agosto de 2009

O homem que virou suco

Deraldo, poeta, retirante, é caçado impiedosamente na selva de pedra por um crime que não cometera.
Francenildo, caseiro, testemunha ocular da esbórnia, vítima da arrogância do poder, acaba esmagado, sem apelação, no altar solene de uma corte que resolveu, mais uma vez, consagrar a impunidade que serve de exemplo.
Deraldo, o repentista, sofre horrores, mas sua existência está limitada à película e sua pulsação resulta da velocidade em que os frames se deslocam sob a genial direção de João Batista Andrade, no clássico do cinema nacional do já distante 1980.
Francenildo, o caseiro, é de carne e osso, e seu olhar de desamparo diante do placar vergonhoso - 5 votos contra 4 - é a mais acabada tradução do abismo que separa a sociedade orfã e as necrosadas estruturas do Estado que permanece aprisionado à lógica dos prepotentes de ontem e de hoje.
O STF cravou mais um prego na cruz que simboliza sua desmoralização. O voto de seu presidente, ministro Gilmar Mendes, decisivo para livrar a pele de Antônio Palocci, desconheceu a elementar questão que vincula o delito a quem dele se beneficiou. Afinal, era o ex-Czar da economia lulista que precisava destruir a reputação do caseiro e, assim, desmontar seu depoimento sobre a tal mansão onde lobistas, altas autoridades da República e moças de má-fama se entregavam aos prazeres mundanos, numa simbiose alucinada entre poder, sexo e dinheiro.
Restou, como sempre, a sensação de que o crime quase sempre compensa. Pelo menos para alguns afortunados.

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Nunca é tarde demais

Em meio a um cenário político algo desértico, sempre é bom saber que ainda existem aqueles que perseveram ao lado das boas causas. A punição exemplar dos algozes que investaram os porões da ditadura por mais de duas décadas é uma dessas. E a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) não tem fugido do bom (e indispensável) combate.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Da arte de fazer besteira

O governo Lula é mesmo incorrigível. Quando uma crise política (mais ou menos artificial, diga-se) em torno do suposto e nebuloso encontro entre a ex-secretária da Receita Federal, Lina Vieira, e a ministra Dilma Rousseff (Casa Civil) já estava em seus penúltimos estertores, eis que alguém - com certeza muito bem situado na pirâmide de comando - resolve mandar decapitar, sem dó nem piedade, uma meia dúzia de cargos comissionados que guardavam lealdade à ex-secretária. Pronto, foi como apagar fogo com querosene: instalou-se a Terceira Guerra Mundial nos corredores do fisco, com dezenas de pedidos de exoneração e altíssimos graus de intrigas e detonações para todos os gostos.
Como nas divertidas fitas em branco e preto, onde os patetas - eram três, hilários e inesquecíveis - sempre encontravam um jeito de dar cabeçadas ou enfiar o dedo nos olhos uns dos outros, a equipe ministerial de Lula não consegue passar uma semana sem fornecer munição para seus adversários no Congresso, que andavam meio mofinos depois que a CPI da Petrobrás naufragou em águas tão escuras quanto profundas.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Justiça tardia e pela metade

Quanto vale mesmo a vida de um sem terra?
Pouco, quase nada, apregoa a lógica do andar de cima.
No país do latifúndio e de seus executivos do agronegócio as lições devem ser sempre exemplares: enfrentar com destemor as cercas da injustiça e da prepotência pode custar a vida.
E as vidas ceifadas - estraçalhadas pelas balas assassinas e pelos golpes de arma branca de uma tropa de celerados - devem ser condenadas ao esquecimento, sob sete palmos, por todos os séculos dos séculos.
Este enredo, tantas vezes repetido, sofreu uma fissura ontem, 25, quando a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STF), em Brasília, colocou, por decisão unânime, o ponto final na longa e indecente perlenga jurídica que há mais de seis anos tem conseguido impedir o cumprimento da sentença que condenou os dois comandantes da PM diretamente envolvidos com o massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido naquele sombrio 17 de abril de 1996.
Assim, tão logo a decisão seja publicada no Diário da Justiça, o coronel Mário Colares Pantoja e o major José Maria Pereira de Oliveira deverão ser recolhidos à prisão, onde cumprirão, respectivamente, 228 e 158 anos.
Além deles mais ninguém foi condenado. Nenhum outro militar, das dezenas que participaram ativamente da chacina.
Mas, sobretudo, nenhuma das autoridades governamentais que foram, em última instância, autoras intelectuais do desfecho sangrento: Almir Gabriel, governador; Paulo Sette Câmara, secretário de Segurança; e Coronel Fabiano Lopes, comandante da PM.
O vazio neste banco de réus permanece sendo um escárnio e uma afronta. Até quando?

Real e de viés

Vários dias fora do Pará, com irregular acesso à internet, não deixa de produzir certo estranhamento na chegada. É que a realidade- nua, crua, brutal - recepciona como uma bofetada. Chacinas ao atacado, com os corpos fazendo uma longa fila nos baldios das periferias, anunciam que a guerra civil do narcotráfico veio para ficar; as cadeias - enxovias do século XXI - explodem em fugas e na degradação cotidiana, sétimo círculo do inferno; a capital - sangrada até a última gota - expele, dia a dia, suas tragédias em todas as áreas, sem governo, mas espertamente transformada em balcão de negócios escusos; em meio a tudo isso, a grande política - enorme em termos das cifras que maneja e tão nanica pela dimensão ética dos personagens envolvidos - segue seu banquete tropical sobre a grande mesa onde são negociados - comprados e vendidos - mandatos, votos e consciências, estas, por óbvio, pálidas expressões do que teriam sido algum dia.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Se não agora, quando?

O governo Lula, sob pressão da jornada de lutas do MST, assumiu o compromisso de atualizar, nos próximos 15 dias, os índices de produtividade do campo, que estão congelados desde 1975. Sem essa medida, que vem sendo protelada anos a fio, é impossível desapropriar para fins de reforma agrária latifúndios improdutivos no Nordeste, Sudeste e Sul do país, principalmente.
A reviravolta na posição do governo teria como causa uma ameaça iminente: a bancada ruralista está prestes a aprovar no Congresso um decreto legislativo retirando do Executivo a prerrogativa de alterar, pela via administrativa e por meio de portaria interministerial, esses índices. Ou seja, é agora ou nunca.
Diante da feroz reação dos ruralistas, que arreganharam os dentes em protesto contra a medida, será preciso aguardar o último ato. Lula, mais uma vez, estará diante da encruzilhada: honrar a dignidade de seu cargo ou se render, como tem feito reiteradas vezes, à pressão espúria dos senhores da eterna casa grande que governa o Brasil por mais de 500 anos.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Via Ápia no Planalto Central

De Roma a Cápua eram 300 quilômetros. Pela Via Ápia, nos cinzentos tempos da escravidão na antiguidade, cruzes sem-fim eram espalhadas em toda sua extensão. Crucificados, lá apodreceram milhares de escravos. Entre eles, Spartacus e seus valentes seguidores.
Como se sabe, Roma caiu e levou junto com ela as instituições que eram tidas como eternas. O Senado, dos patrícios com suas vestes impolutas (só elas, é claro), também virou pó quando a revolução dos escravos e dos demais povos levianamente chamados de bárbaros colocou abaixo a ordem estabelecida.
Frei Betto lembra de Roma e do célebre discurso que Marco Túlio Cícero fez diante das malfeitorias de outro senador, Lúcio Sérgio Catilina, há mais de 2000 anos. Seu alvo, porém, está bem mais próximo do que se imagina. E os crucificados de hoje podem ser contados aos milhões, vítimas da esperança impiedosamente fraudada.

Linha de comando

Os bate-paus que empastelaram a sessão da Câmara sobre a privatização dos serviços de água e esgoto na capital, com direito a cadeira voando no plenário, executaram com destreza um plano organizado nos mais altos escalões do governo Duciomar. A truculência, portanto, não foi fortuita, nem deve ser entendida como um acidente de percurso. Acima de tudo revela a facilidade com que a base de apoio da prefeitura, em todos os níveis, transita com enorme desenvoltura entre os escaninhos da política e as variadas práticas delinquenciais.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Rinha de meias-verdades e mentiras inteiras

As duas principais redes de TV do país - Globo e Record - há vários dias chafurdam num atoleiro de acusações mútuas. Detonado pela denúncia do Ministério Público contra os principais líderes da igreja Universal, o bate-boca vai ganhando novos contornos a cada dia, mesmo que a base do escândalo seja matéria velha de mais de uma década.
Como é de costume, os telejornais absolutamente editorializados erram quando se defendem e acertam nos ataques aos adversários.
Por trás dos factóides, a guerra pela liderança do bilionário mercado publicitário brasileiro.
Para o jornalista Antônio Brasil, doutor em comunicação e colaborador do Observatório da Imprensa, trata-se daquelas disputas onde não se pode escolher um lado. Como dizem os argentinos, "Que percan los dos!".

Sob as asas do terror

O governo militar brasileiro (1964-1985) participou ativamente da repressão aos movimentos e governos socialistas no Cone Sul, sobretudo nas articulações golpistas que redudaram na derrubada violenta do presidente Salvador Allende, no fatídico 11 de setembro de 1973, e da ampla caçada aos militantes de esquerda nos anos seguintes na esteira da chamada Operação Condor. E parte dessa história vergonhosa começa a vir à luz com a liberação de documentos oficiais da Casa Branca, como comprova a ata do encontro entre o ditador Médice e o presidente Nixon, na Casa Branca, em dezembro de 1971.
O Brasil, onde o sigilo eterno continua a ser imposto a uma enorme gama de documentos, é duplamente devedor. Primeiro, de desculpas formais ao povo chileno em função da criminosa intromissão de agentes do governo da época em aberta violação da soberania e auto-determinação daquele país. Segundo, ao seu próprio povo que possui o direito de conhecer cada detalhe sórdido das ações de terrorismo de Estado que se prolongaram por longos 21 anos.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

O crime por trás das grades

Se faltava apenas a gota d'água para decretar a falência do sistema prisional no Pará, agora não falta mais. O escandaloso episódio de uma adolescente de apenas 14 anos que permaneceu mais de 30 horas em "visita íntima" a seu namorado, um detento condenado por latrocínio (roubo seguido de morte), numa cela de um presídio estadual nas cercanias de Belém, sem que os agentes e policiais tenham percebido, revela um nível de descontrole, incompetência e conivência com práticas delituosas como poucas vezes se tem notícia.
Além do suposto namorado, a adolescente ficou horas em companhia de mais dois detentos. É provável que tenha sido vítima de violência sexual.

A idade da menina também é alvo de controvérsia. Ela própria relatou ter 16 anos, o que foi desmentido pela família em entrevista à equipe do Conselho Tutelar. Ela tem apenas 14 anos.
O Presídio Estadual Metropolitano, em Marituba, ainda é tido como de "segurança máxima". Por favor, é preciso ter um mínimo de decência. Lá, pelo que se depreende deste episódio, não se controla coisa alguma. É a lei da selva, pura e simplesmente.

domingo, 16 de agosto de 2009

E agora José?

Apartamentos de luxo pagos por uma empreiteira muy amiga, eis o "Fiat Elba" de Sarney. Resta saber se a operação abafa em pleno andamento vai segurar mais essa.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Cheque sem fundo

Vai haver choro e ranger de dentes. O poderoso (e oneroso) lobby que forçou a aprovação do crédito-prêmio do IPI pelo Senado e pela Câmara de Deputados, por meio de contrabando em uma medida provisória, naufragou na praia. Ou melhor, morreu nas mãos do ministro Ricardo Lewandowski, que acaba de sepultar a manobra dos espertalhões em decisão definitiva do plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), livrando os cofres da União de uma conta que poderia ultrapassar os R$ 250 bi.
E pensar que já tinha muita gente gastando por conta, imaginando que suas campanhas em 2010 já estavam devidamente forradas com as verdinhas de sempre.

Cabeça de dinossauro

O imperialismo estadunidense nunca esteve mais vivo. Alguém duvida? As 865 bases militares em 40 países não são apenas herança dos tempos da finada Guerra Fria. Elas sobreviveram ao fim da ex-URSS para demonstrar que o mundo caiu no abismo da unipolaridade mais perversa. E, também, mostram que os pretensos donos do mundo não estão mesmo para brincadeiras.

Epidemia de incompetência

A saúde das populações indígenas no Brasil está como sempre esteve: à beira do colapso. A crescimento dos casos de malária entre os Yanomami, em Roraima, apenas revela parte de uma desgraça que atinge boa parte das nações, de um extremo ao outro do país.

Dialética do espelho partido

"O elitismo, o racismo, o machismo e o militarismo impedem que a América reconheça no espelho seu rosto múltiplo e luminoso. Estamos abobados, dedicados a nossa própria negação e trabalhando por nossa própria perdição. América Latina, quero dizer? Não apenas a América Latina: também a exitosa América do Norte, com toda sua suspeita prosperidade material mascarando as mutilações da alma."

Eduardo Galeano, escritor uruguaio, cidadão do mundo. "Nós dizemos não" (1990, p. 39).

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

A vanguarda do atraso

Engana-se quem pensa que trabalho escravo é coisa somente de anacrônicos latifundiários encravados nos rincões mais distantes do interior brasileiro. O grupo Bertin, maior abatedouro e campeão nacional na exportação de carne, um dos mais destacados expoentes do moderno e globalizado agronegócio verde e amarelo, acaba de ser flagrado, mais uma vez, como cúmplice da prática odiosa de reduzir seres humanos à escravidão contemporânea.

Franciscanos

O clã de Renan Calheiros acaba de receber mais um prêmio por sua, digamos, fidelidade canina ao governo Lula. Como sempre, o agrado foi dado com dinheiro público.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Holocausto africano

África, continente em carne viva, mergulha nas águas revoltas do extermínio sistemático de suas populações, pela fome e pela guerra, não necessariamente nesta ordem.
Alguém ainda se escandaliza diante deste massacre?
José Saramago, jovem em seus quase 90 anos, aponta para a ferida aberta e conclama a uma insurreição das consciências. Agora, imediatamente, enquanto ainda há tempo.

Capitão Gancho

Mais de 60 mil cabeças de gado na Floresta Nacional do Jamaxim, no Xingu paraense, revela que a máquina de fazer fortuna operada pelos ruralistas necessita de um combustível singelo: a apropriação descarada do patrimônio que pertence a todos os brasileiros.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Durma-se com um barulho desses

Acabou o sigilo: a íntegra da ação do Ministério Público Federal (MPF) que desvela o escabroso esquema da governadora gaúcha Yeda Crusius (PSDB) já está disponível para download. São 1239 páginas com uma overdose do nada edificante mundo das organizações criminosas que transformaram boa parte da política nacional em fábrica de fazer dinheiro (para elas próprias, é claro).

Boca do lixo

O decoro parlamentar feito em mil pedaços e algumas lições do velho e insubstituível Aurélio, aqui.

Silêncio forçado

Há momentos em que as palavras secam, como os rios nas mais bravas estiagens.
Nos últimos dias o editor deste espaço esteve diante de uma dessas situações-limite: a inevitabilidade da perda de uma pessoa amiga, o historiador, dirigente político e colega de trabalho Manoel Amaral, companheiro de longos anos de caminhada, que faleceu aos 34 anos, no último sábado, 8.
O que resta fazer quando se esgotam todos os recursos para preservar a vida humana - essa dádiva tão preciosa e delicadamente tão tênue?
Absorver, tanto quanto possível, o rude golpe que nos fere o coração, para, no instante seguinte, recobrar forças e celebrar a presença imorredoura dos valores do humanismo mais radical e libertário que caracterizaram a curta e extremamente fértil passagem deste autêntico filho do povo entre nós. E mais ainda: continuar palmilhando, em sua homenagem, com redobrada coragem e disposição, os difíceis e imprescindíveis senderos da luta de resistência e de anúncio profético da sociedade de homens e mulheres livremente associados.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

O homem deles em Tegucigalpa

A folha corrida de Hugo Llorens, o embaixador dos Estados Unidos em Honduras, não deixa nenhuma margem a dúvidas. Ele sempre está por perto quando está em curso algum episódio da guerra subterrânea contra os inimigos de Washinghton na América Latina.
Reportagem assinada por Jean-Guy Allard, da Agência Bolivariana de Notícias (ABN), dá pistas de uma história muito pouco edificante da diplomacia da Casa Branca, volta e meia deixando rastros nas quarteladas cíclicas que assolam o continente de Martí e Bolívar.

Feras feridas

Não toquem, mas nem pensem em triscar, nos amplos e elásticos domínios dos barões da mídia. Nem aqui, nem em lugar algum. A pena para essa ousadia é a excomunhão eterna em escala planetária, uma desconstrução contínua e interminável da imagem do suposto agressor, para todo o sempre pintado como a reencarnação do totalitarismo mais perverso.
Hugo Chávez, que já demonstrou não ter medo de cara feia, avançou mais um pouco no processo de imposição da legalidade a um setor acostumado a mandar e nunca obedecer. Ele cancelou concessões de rádios que estavam fora da lei, nem mais, nem menos. Porém o suficiente para que fosse iniciada uma tempestade de agressões de virulência máxima.
Por isso, recrudesceu a campanha cerrada contra ele nas telas da grande mídia, seguindo o coro puxado pela CNN e por seus milhares de satélites mundo afora. No Brasil, claro, cabe aos comentaristas da Globo o papel de entoar a cantilena em nome da liberdade total de lucrar.
Felizmente, sempre resta alguém para remar contra a maré.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Pampas em chamas

A tucana Yeda Crusius deu mais um passo a caminho do patíbulo: o MPF acaba de pedir seu afastamento do cargo e indisponibilidade de seus bens. No cerne da uma crise sem fim está o rombo de R$ 44 milhões de reais.

Usina de mentiras

Lula prometeu que seu governo não enfiaria a usina de Belo Monte "goela abaixo" dos povos da região. Nada mais distante da realidade. Por pressão do governo, o presidente do Tribunal Regional Federal (TRF) da 1a Região, Jirair Aram Meguerian, acaba de suspender a liminar que embargava o processo de licenciamento ambiental da polêmica usina.
As "razões" do governo são ridículas e remetem à velhas chantagens: sem Belo Monte o país estará próximo de um apagão, tendo de recorrer a fontes mais "sujas" de geração de energia, como as termelétricas.
Sustentada em argumentos tão frágeis quanto falaciosos, a decisão do desembargador joga água - muita água - no moinho de mais este desastre socioambiental anunciado.

Olhar 43

Furibundo, alucinado, à beira de um ataque de hidrofobia, Fernando Collor retornou a seu estado normal. Aquele modelito bem comportado, canhestramente suave, tinha um prazo de validade bem delimitado. Agora, vitaminado pelo apoio do Planalto, ele pode volta a ser o que sempre foi: um deliquente de terno e gravata.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Calote a galope

Na surdina, os ruralistas da Câmara Federal estão a centímetros de aprovar a sétima renegociação geral das dívidas dos grandes proprietários rurais. Um papagaio de R$ 36 bilhões prestes a ser pendurado no sempre solícito Tesouro Nacional. É a repetição de um péssimo costume que remonta a tempos remotíssimos: os recursos públicos engordam o patrimônio dos produtores e no momento de honrar o compromisso junto aos bancos oficiais surge a ajuda providencial na forma de mais um refinanciamento, que vai durar só o tempo suficiente para ser novamente "alongado".
Assim, fica muito fácil bradar contra o tamanho do Estado e a favor do sacrossanto livre mercado.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

O bonde do Dantas

Que o espertalhão Daniel Dantas transformou seu banco Opportunity em uma enorme e eficiente lavanderia não chega ser nenhuma novidade, mas agora a Polícia Federal produziu a mais completa radiografia do funcionamento do esquema, identificando seus tentáculos na agropecuária, na prospecção mineral e - não de todo surpreendente - na aquisição de imóveis milionários no Rio de Janeiro.
Esse roteiro, aliás, não deve causar inveja a outras tantas atividades do grande mundo do crime em qualquer latitude e sob qualquer denominação.

domingo, 2 de agosto de 2009

Dialética da esperança na liberdade humana

"(...) Do caos destacam-se grandes acontecimentos em vias de realização. (...) É a técnica industrial e científica do mundo moderno que rompe brutalmente com o passado e coloca os povos de continentes inteiros diante da necessidade de recomeçar a vida sobre novas bases. Que essas bases devem ser, só podem ser de organização racional, justiça social, respeito pela pessoa humana, liberdade é para mim uma evidência que se impõe aos poucos através da própria desumanidade do tempo presente. O futuro me aparece, quaisquer que sejam as nuvens no horizonte, cheio de possibilidades mais amplas do que antevimos no passado. A paixão, a experiência amarga, os erros da geração combatente à qual pertenço podem esclarecer um pouco os caminhos. Sob essa condição única, convertida em imperativo categórico: jamais renunciar a defender o homem contra os sistemas que planejam a aniquilação do indivíduo."

Memórias de um revolucionário, p. 347, Companhia das Letras, 1987.

Victor Serge (1890-1947), revolucionário e escritor russo, militante bolchevique, foi contemporâneo de Kropotkin, Lenin, Bukharin e Trotski. Vítima da repressão e dos expurgos de Stalin, participou da Oposição de Esquerda junto com Trotski, vivendo seus últimos anos exilado na Europa e na América. Faleceu pobre e abandonado no México, sem abrir mão de suas firmes convicções socialistas.

sábado, 1 de agosto de 2009

Destilaria de ódio

É notável como as elites reagem a qualquer movimento que aponte para uma distribuição de renda menos indecente no Brasil. Por menor e mais superficial, pouco importa, essas medidas costumam sofrer ataque cerrado do andar de cima. Mesmo que seja apenas um reajuste - de menos de 10% - nos miseráveis valores pagos pelo Bolsa Família, maior programa de transferência de renda do governo federal. Aumentar em quase R$ 500 milhões o orçamento do programa é apontado como uma heresia, ou mesmo como uma espécie de crime contra a economia nacional.
O editorial de O Globo de hoje, por exemplo, a pretexto de combater o "populismo" de Lula, chega a duvidar da existência de famintos no Brasil. Segundo o jornal da família Marinho, o número de famintos sempre foi superestimado e não chegaria a 4% da população (cerca de 8 milhões de pessoas). Logo, o Bolsa Família que atende quase 12 milhões de famílias seria um claro exagero e uma forma de retirar recursos das áreas de saúde, educação e - lógico - infraestrutura, porque os empreiteiros também precisam ganhar o seu.
Destinar, ao menos, 30% da arrecadação federal para pagar os mandarins da dívida pública - interna e externa - é visto como um indicador de responsabilidade e saúde fiscal. Mas drenar para as famílias muito pobres algo como R$ 12 bilhões de um orçamento anual que ultrapassa R$ 1,5 trilhão chega a ser inaceitável para os que jamais tiveram a menor ideia do que significa dormir com fome e acordar mais faminto ainda.
As intenções eleitorais de Lula parecem evidentes, o que não diminui a necessidade de se recompor o poder de compra de um benefício que assegura o sustento de quase 50 milhões de brasileiros atualmente, muito embora submetidos ao círculo vicioso da dependência eterna aos programas sociais do governo.
O que deveria ser entendido como uma política emergencial acabou virando um instrumento permanente, com viés manipulatório e perfeitamente assimilado no seio de uma política econômica voltada a aumentar o lucro dos que sempre faturam em qualquer contexto. Mas que parecem jamais estar de barriga cheia.