É certo que foi um ato pensado. Mais que isso: tratava-se de uma estratégia, urdida parcimoniosamente talvez por uma equipe de espertos assessores. Ou, talvez, tenha sido um ato solitário, quase inconsciente, de um político que nasceu e se criou debaixo das asas da ditadura. Tanto faz como tanto fez. O resultado não poderia ter sido mais desastroso.
Agripino Maia, o estridente líder dos democratas no Senado, deve ainda hoje ter sonhos (ou pesadelos) com o tempo em que militava, sem qualquer remorso, nas hostes da Arena e, lá fora, o pau cantava impunemente. Pessoas eram seqüestradas e torturadas todos os dias. Seus corpos, mutilados com sadismo, eram enterrados em valas comuns ou simplesmente desintegrados. Nada disso, entretanto, àquela época, tirava o sono do então governador potiguar. Ele tinha outras ocupações, como bajular os ditadores de plantão e surfar sobre as ondas douradas do milagre brasileiro.
De toda forma, Agripino, bem no início da sessão destinada a ouvir ontem, 7, a ministra Dilma Rousseff, sobre o PAC e, de contrabando, trazer à tona o insuportável tema do dossiê de gastos "secretos" de FHC e familiares, resolveu encenar uma esquete que julgava o primor da sagacidade política: leu trechos de uma antiga entrevista da ministra ao jornalista Luiz Maklouf Carvalho onde ela confessa ter mentido sob tortura, em 1970, nos anos de chumbo da ditadura. Com a lembrança, o político do DEM insinuou que Dilma poderia fazer o mesmo naquela sessão do Senado já que a prática de vazar dossiês era um ato que lembrava o regime de exceção. Do alto de uma justa indignação, a ministra contra-atacou: esteve presa aos 19 anos e foi barbaramente torturada. Tinha orgulho de ter mentido sob tortura, porque só quem tem dignidade por fazer isso e para salvar seus companheiros de guerrilha. E, ademais, naquele momento ela e o senador estavam em campos opostos. Ponto final.
Impagável a expressão desolada do ilustre senador, em cujas veias corre o sangue oligarca de uma mais tradicionais famílias nordestinas. A partir deste momento e até o final das longas nove horas de inquirição - que em certos trechos mais parecia uma quermesse eleitoral onde cada um quer puxar uma obrinha do PAC para seu terreiro - a oposição estava nas cordas e o governo colhia os frutos de uma inusitada vitória política.
Com a dupla Agripino Maia-Artur Virgílio no comando da oposição, que mais parece integrar uma das células da Al-Quaeda, o governo Lula realmente não tem por que se preocupar. Pode navegar em águas tranqüilas. Pelo menos até que a tsunami que se gesta nas entranhas do capitalismo de papel dê suas caras por aqui. Mais cedo, ou mais tarde.
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