sábado, 25 de abril de 2009

Dialética do batismo de fogo

"Requerimiento

(...)

Se não o fizerdes (converterem-se à fé católica), ou nisto puserdes maliciosamente dilação, certifico-vos que com a ajuda de Deus eu entrarei poderosamente contra vós e vos farei guerra por todas as partes e maneira que puder, e vos sujeitarei ao jugo e obediência da Igreja e de Sua Majestade e tomarei vossas mulheres e filhos e vos farei escravos, e como tais vos venderei, e disporei de vós como Sua Majestade mandar, e tomarei vossos bens e vos farei todos os males e danos que puder...".


Segundo Eduardo Galeano, citando Daniel Vidart (Ideología y realidad de América, Montividéu, 1968), era mais ou menos nestes termos a proclama que os capitães da conquista, lá pelos idos de 1492, deveriam ler para os índios antes de se assenhorar, em nome da cruz e da espada, das magníficas riquezas naturais e humanas do novo mundo que estava nascendo. O anúncio solene era feito, com toda a pompa e circunstância, mas sem intérprete, para nações que jamais tinham ouvido qualquer palavra em espanhol.
Esta preciosa e sempre atual passagem foi incluída na parte 1 (A pobreza do homem como resultado da riqueza da terra) do indispensável best-seller de Galeano, As veias abertas da América Latina, cuja primeira edição data de 1976.
Páginas ácidas e radicais, como a própria vida em tempos cinzentos, podem agora repousar à cabeceira de Barack Obama, após o singelo regalo que recebeu de Hugo Chávez na recente Cúpula das Américas. Chávez, aliás, que afirma ter sido cortés com o colega norte-americano, sem contudo cultivar qualquer tipo de ilusão. Afinal, quem hoje desempenha o papel de senhor do mundo que no passado coube a Fernando de Aragão e Isabel de Castela, não deve possuir nem a mais pálida capacidade de conversão.

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