quarta-feira, 31 de março de 2010

Don Corleone toma caipirinha

O Brasil teria se transformado no paraíso para as mais poderosas máfias com atuação em nível planetário.
E não se está falando dos chamados "chefões" do tráfico em favelas e bairros periféricos que, vez por outra, são apresentados pela polícia como "barões da droga". Na verdade, são apenas soldados, flagrados de bermuda e chinelo em aberta contradição com o armamento de alta potência que muitas vezes utilizam.
Os capos das organizações criminosas jamais têm seu rosto revelado. Estão acima e, como revela a intrigante reportagem da Carta Capital desta semana, bem distantes do território brasileiro, ao mesmo tempo um enorme mercado consumidor e um pouco vigiado corredor pelo qual transitam volumes cada dia mais espantosos de cocaína e outras comodditties das transnacionais do crime.
É aí que entra a máfia calabresa - a poderosa 'Ndrangheta -, com fortes e antigas raízes no país, e que possui sob seu comando com uma extensa e bilionária rede de tráfico e lavagem de dinheiro.
Fazer vistas grossas a esse fenômeno equivale a deixar aberta a porteira para novas e tormentosas tragédias, como se já não bastasse a existência dos cartéis nacionais da bandidagem de elevado calibre que por aqui proliferam sem cessar.


Mal-aventurados

"Quando quis rezar - e só um pensamento, como um raio e raio, que em mim. Que o senhor sabe? Qual: ...O Diabo na rua, no meio do redemunho..."
Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas (p. 450).



Logo mais, às 8 da manhã, um dos mandantes do assassinato de irmã Dorothy sentará, pela terciera vez, no banco dos réus. Vitamiro Bastos de Moura, vulgo Bida, jurará inocência e verterá lágrimas como se estes cinco anos que separam o trágico 12 de fevereiro de 2005 tivessem o condão de transformar a ele - e a todos que urdirão aquela conspiração covarde - em anjos caídos, conversos sinceros e exemplares. Mas que ninguém se engane: suas mãos ainda trazem a marca indelével do sangue de uma mártir.
Não é apenas uma triste ironia que mais esta sessão especial de Justiça ocorra em plena Páscoa, a Pessah judaica e a travessia sem-fim para os cristãos. Do cativeiro à terra sem males, sonho renovado e inconcluso. Do cativeiro ainda ao cativeiro, melhor e mais precisamente, quando se olha no entorno, funda e profundamente.
Bida, com olhar de vítima, sentará no banco de réus. Enquanto isso, os sicários que ele contratou gozam do "direito" de passar o feriado em liberdade. Os pistoleiros e intermediários - Rayfran Neves, Clodoaldo Batista e Amair da Cunha - apresentam-se, agora, como detentos de "bom comportamento", como se o tempo os estivessem redimindo. Será mesmo?
Logo após sair do presídio, Rayfran disparou: no dia do assassinato, no coração da floresta, em plena Terra do Meio, ele revela ter sido "ameaçado" pela freira de 73 anos. Matou, sim, mas para se defender. Afinal, nas mãos da religiosa, misturado com terra e com seu próprio sangue, restou um exemplar da Bíblia, com o qual, num último e frustrado esforço missionário, ela tentou dissuadir seus executores.
Dorothy era e continua sendo uma séria ameaça. Ameaça , sim, o privilégio dos que transformam a terra - os rios, os bichos, as gentes - em mercadoria. Estupram sem perdão e sem remorso a dádiva mais preciosa que foi legada à espécie humana e, entretanto, borram-se de medo diante de uma anciã de fala mansa, mas de coração vocacionado a jamais transigir diante das múltiplas formas de apreentação do Mal.
Que se faça a Justiça, de uma vez por todas. A sentença a ser imposta a Bida, como a seus comparsas, deve ter um caráter pedagógico.
Ou agimos com a firmeza necessária, ou nossos sertões continuarão a encenar o duelo intermitente onde a força destruidora e corrompedora da morte insiste em se declarar vencedora.

Atualização das 9:30:

Uma manobra da defesa provocou a suspensão do julgamento. Mais uma, por sinal.
Com isso, ganham mais alguns dias e esticam ainda mais a corda da impunidade. Até quando?

terça-feira, 30 de março de 2010

Uma mão lavando a outra

O furo é da Folha de São Paulo. Uma novíssima medida provisória está saindo do forno para beneficiar grandes corporações que exploram, a preço de banana e sem concorrência, dezenas de terminais portuários públicos.
Depois de intenso lobby, tudo leva a crer que os interesses de gigantes como a Petrobras, Braskem e Gargill vão acabar prevalecendo, jogando para o dia de São Nunca a prometida licitação que a Lei dos Portos manda fazer há 17 anos e nada - absolutamente nada - acontece.

Na palma de sua mão, uma guerra sangrenta

Você acaba de ligar seu computador. Nada mais inofensivo.
Os microprocessadores entram em ação. Segundos depois, sua tela está conectada ao mundo. Tudo clean. Tudo soft. Será?
Por trás da mais avançada tecnologia que o homem foi capaz de criar desponta uma tragédia silenciosa. Milhões de seres humanos são mortos todos os anos na África em meio a guerras sem fim.
Saiba como seu moderno equipamento de informática tem tudo a ver com essa carnificina do século XXI.

segunda-feira, 29 de março de 2010

Sesmaria Internacional

Pare um minuto e reflita: que tal uma área de, pelo menos, 350 mil Km2 em poder de estrangeiros no campo brasileiro? Isto mesmo. É um escândalo superior à extensão da Itália e tudo acontece sob o olhar bovino das autoridades que têm o dever constitucional de zelar por nossa soberania e integridade.
Os dados - ainda incompletos e confusos - dão conta de um crescente avanço de estrangeiros - pessoas físicas e, principalmente, jurídicas - sobre as áreas mais nobres do agronegócio, com destaque para a produção de grãos e de cana-de-açúcar.
O Ministério Público Federal (MPF) já deu o alarme.

As estripulias da nanopolítica

Do balança-balança-mais-não-cai na Seduc, com indisfarçável cheiro de déjà vu, restou a sensação de que a governadora Ana Júlia (PT) saiu do episódio um pouco menor do que entrou. E já virou costume. Ela é mestra em dar demonstrações de falta de poder. Ou, o que dá no mesmo, de como não saber utilizar o poder que tem.
Sem alianças sólidas e confiáveis na área externa, em permanente guerrilha com seus neo-aliados e quase-inimigos do PMDB et caterva, e ainda tendo de administrar a ebulição intermitente da guerra civil entre as hostes petistas, o Palácio dos Despachos vai consolidando a imagem de uma nau sem rumo, a ponto de soçobrar.
Mas que ninguém se iluda: com as eleições transformadas em um imenso e pouco escrupuloso mercado de compra e venda, tudo pode acontecer. Até a reeleição da enfraquecida governadora.

domingo, 28 de março de 2010

Todos diferentes. Todos idênticos.

Marina Silva (PV) postula ser a grande novidade nas eleições de outubro.
Apesar disso, a pré-candidata verde tangencia uma questão básica e essencial para se alçar a um mínimo patamar de disputa: não tem programa próprio e nem quer se diferenciar de seus adversários. Antes, pretende flertar com eles. É por isso que não para de reivindicar o legado dos 16 anos de governo tucano-petista.
Desta contradição - insolúvel e antagônica a qualquer perspectiva que se pretenda verdadeiramente de esquerda ou, quando menos, de oposição com maiúsculas - sobressai sua maior fraqueza: por que optar por uma cópia mal-acabada se há no mercado eleitoral dois produtos originais surgidos do ventre de Wall Street e do insepulto Consenso de Washington?
O jornalista Carlos Tautz não deixa pedra sobre pedra. Confira.

Água de beber

Quando a água vira mercadoria o fim, a hecatombe planetária está mais próxima do que se imagina.
Remando contra a maré do pensamento único, Riccardo Petrella aponta um caminho alternativo. Radical como convém aos que adotam a insubmissão como bandeira.

Quando o crime compensa

Quantos escravocratas modernos estão na cadeia no Brasil?
Nenhum.
O Congresso em Foco desvenda este mistério bem brasileiro.

Estandarte da esperança

Uma índia reclamando sua libertação do cativeiro.
Corria o ano da Graça de 1751 e os índios, há dois séculos e meio, sofriam uma cruel e permanente faxina étnica.
Indignada com o tratamento violento que recebia de seu pretenso senhor, um tal Sebastião Gomes, a índia recorreu aos tribunais. Sua causa foi julgada pela Junta do Pará, que a considerou livre. Uma exceção, portanto.
E dela não se ouviu mais falar, perdendo-se na poeira da história.
Mas, seu nome, ironia e profecia, foi guardado naquelas atas que o tempo não foi capaz e destruir: Esperança, era assim que esta brasileira se chamava, naqueles tempos em que vocalizou a coragem ancestral de seus parentes e de seus irmãos de sangue e de destino.
Onde ela morava?
Ali, atravessando a baía, na localidade que à época se chamava Mortigura (em Tupi, morador, ou natural. Igoara ut Mortigurigoara), que após a emergência das leis pombalinas seria definitivamente conhecida como Vila do Conde, no atual município paraense de Barcarena.
Isso tudo é história e aconteceu quatro anos antes que o rei Dom José I, de Portugal, promulgasse a famosa lei da liberdade "de pessoas, bens, e comércio dos índios do Pará e Maranhão", reconhecendo que "muitos milhões de índios se foram extinguindo, de modo que é pequeno o número de povoações e dos moradores delas, vivendo esses poucos em tão grande miséria" (John Hemming, Fronteira Amazônica, Edusp, 2009, p.29).
Esta lei e tantas outras não vingaram. Letras mortas, desmoralizadas pela força do aço e do fogo de que dispunham os colonos.
O extermínio, como se sabe, prossegue até hoje. Com métodos um tanto mais sutis, mas igualmente letais quanto aqueles utilizados no tempo em que Sebastião José Carvalho e Melo, mais conhecido como marquês de Pombal, mandava e desmandava no pequeno e atrasado Portugal e em suas imensidões ultramarinhas.

Dialética do dia a ser aproveitado

"Basta um dia

Para mim
Basta um dia
Não mais que um dia
Um meio dia
E eu faço desatar
A minha fantasia
Só um
Belo dia
Pois se jura, se esconjura
Se ama e se tortura
Se tritura, se atura e se cura
A dor
Na orgia
Da luz do dia
É só o que eu pedia
Um dia para aplacar
Minha agonia
Toda a sangria
Todo o veneno
De um pequeno dia".

Chico Buarque (Meus Caros Amigos, 1976, Phonogram).

O americano intranquilo

James Cameron é um artista sensível. Seu "Avatar" não é um blockbuster qualquer. Tem conteúdo. Mais ainda: tem lado. O lado dos despossuídos, ultrajados de todos os quadrantes, tempos e espaços.
Portanto, não é nenhuma novidade que ele abrace causas justas, como esta aqui.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Hasta la vista, baby

Saiba quem são (e o que querem) os exterminadores do futuro.
Eles são belicosos na essência, mas usam vestes de pacíficos cordeirinhos.
Saiba como agem esses novos (?) cavaleiros do apocalipse. E aprenda como combatê-los.

Herança Maldita

Em poucos dias terminará o turbulento mandato de Gilmar Mendes à frente do Supremo Tribunal Federal (STF). Já vai tarde, mas deixará suas marcas.
Funcionando como uma espécie de líder informal da oposição de direita, Mendes, cuja indicação à mais importante corte brasileira decorreu unicamente de sua fidelidade canina aos governos tucanos, usou e abusou de seu poder para impor uma pauta de retrocesso e conservadorismo em uma gama enorme de assuntos, com assento na explosiva situação do conflito agrário no Brasil.
Para fechar sua gestão, um último e gravíssimo golpe. Na qualidade de presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ele assinou convênio com a Confederação Nacional de Agricultura (CNA) para a criação de um "Observatório da Insegurança no Campo", para mapear supostas ameaças ao "direito de propriedade" e "mensurar os prejuízos causados pelas invasões de propriedades rurais".
Mais parcialidade e desequilíbrio seria impossível. É a vitória da jagunçagem e da violência institucionalidada.
Espera-se que o ministro Cesar Peluso, conhecido pela ponderação e pela inquestionável bagagem jurídica, determine a imediata correção desse desvio. Ou se arquiva a ideia (de resto, inspirada em discurso marcadamente ideológico), ou se amplia o âmbito do "Observatório", incluindo entidades que representem os pequenos agricultores e os milhões de trabalhadores sem terra que são a outra face de uma guerra civil não-declarada e sem prazo para terminar.

quinta-feira, 25 de março de 2010

O homem que calculava

Fernando Sarney, filho pródigo, sempre enroscado. Agora é o governo suíço, absolutamente insuspeito, que botou a mão na fortuna - U$ 13 mi - que o esperto empresário e lobista maranhense havia escondido por lá.
Não é a primeira vez que o rebento mais famoso do senador José Sarney passa por esse constrangimento. Há poucos meses uma conta secreta na China dava a dimensão de quanto dinheiro - sujo, por certo - circula pelas operosas mãos do esquema montado por essa longeva oligarquia.
O pior é que tudo tende a terminar em pizza. Uma amarga e imoral demonstração de que roubar só só transforma em crime, no Brasil, quando se trata de uma lata de leite em pó para aplacar a fome de uma prole faminta.

terça-feira, 23 de março de 2010

A guerra da água

A água contaminada mata mais que as guerras.
Os números assustadores desta tragédia contemporânea estão no estudo elaborado pelo Programa de Meio Ambiente das Nações Unidas (Pnud).

A Coleira do Cão

Ninguém duvida que o leilão de Belo Monte será uma guerra de cachorro grande. Grandes empreiteiras, fundos de pensão e monopólios do setor mineral estarão se digladiando por uma obra de R$ 30 bilhões, quem sabe até mais.
O Estado brasileiro, através da holding do setor elétrico, a Eletrobrás sob o comando do clã Sarney, vai funcionar como um poderoso adestrador dessa matilha de cães quase sempre raivosos. Os dois consórcios em formação já receberam a promessa do calor oficial. Tudo para tirar do papel aquilo que será um dos maiores crimes contra a Amazônia e seus povos em todos os tempos.

Atingidos de todo o mundo, uni-vos

Se a Vale é uma empresa global, que hoje ostenta o título de maior mineradora do mundo e a 14a companhia mundial em valor de mercado, a resistência à intensa precarização das relações trabalhistas e ao passivo socioambiental que ela gera nos cinco continentes também precisa se tornar um movimento internacional.
Os primeiros passos nesse sentido já estão sendo dados. Veja aqui os caminhos a serem trilhados para a realização, em abril deste ano, no Rio de Janeiro, do I Encontro de populações, comunidades e trabalhadores afetados pela política agressiva e predatória da Companhia Vale do Rio Doce.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Armados, granados e perigosos

Não faltará grana para que os ruralistas tentem ampliar sua (já enorme e ostensiva) influência sobre o Congresso Nacional.
Aliás, abusados como sempre, eles sentem que devem aproveitar o bom tempo derivado do nem sempre discreto apoio que recebem do Planalto onde, em tese, deveria estar sentado um antagonista das teses retrógradas e perversamente anti-populares que estes modernos capitães do mato professam desde o berço.

quarta-feira, 17 de março de 2010

Muro de hipocrisias

Israel possui (ao menos) 300 ogivas nucleares.
Israel não é signatário do Tratado de Não Proliferação Nuclear, já subscrito por 187 países.
Israel não permite que suas instalações nucleares - ofensivas, por certo - sejam inspecionadas por técnicos da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA).
Ao longo as últimas cinco décadas, Israel invadiu e anexou territórios de muitos de seus vizinhos e até hoje nega o cumprimento de dezenas de resoluções da ONU, como, por exemplo, a que determina o respeito pelo status internacional de Jerusalém Oriental, anexada desde 1967.
Ainda assim, a grande mídia, secundada por seus papagaios nativos, insiste em demonizar o regime iraniano e sua suposta - e até agora não comprovada - escalada armamentista e nuclear.
Esse roteiro de terror nem chega a ser inédito. Foi a caça às fantasmagóricas "armas de destruição em massa" de Saddam Hussein que deu o álibe para a invasão e recolonização do Iraque em 2003.
Quem será a próxima vítima?


Barrados no baile

A PF, cumprindo ordem judicial, flagrou ontem (16) o presidente da Assembleia Legislativa paraense, Domingos Juvenil (PMDB), com a mão na massa. Aliás, com a mão numa boa quantidade de medicamentos estocados em sua residência em Altamira.
A hipótese levantada pela denúncia é que as mais de 40 caixas de remédios tenham como origem algum almoxarifado público estadual, o que não seria algo assim tão estranho em se conhecendo a folha corrida do deputado.
A tese da defesa - como são rápidos e criativos os advogados - dá conta de que não existe nada de errado com os remédios, cuja compra em uma empresa sediada em Belém estaria devidamente comprovada através de nota fiscal. Eles seriam destinados ao "atendimento político" mantido por Ozório Juvenil, filho e herdeiro político do deputado peemedebista.
"Atendimento político", como se sabe, é um eufemismo usado para disfarçar a mais descarada compra de votos. Uma amostra grátis do que vai ser o vale tudo da campanha eleitoral que se aproxima.




Devagar, quase parando

Há dois dias este espaço não é atualizado.
Uma pesada jornada de trabalho tem sido a pedra no caminho. Por enquanto, intransponível.
Na medida do possível, as postagens e a moderação de comentários voltarão à normalidade.

domingo, 14 de março de 2010

Matrix S.A.

A realidade virtual das licitações públicas foi, finalmente, colocada à prova.
Por baixo dos panos, com profissionalismo crescente, as maiores empreiteiras do país estariam repartindo entre si negócios bilionários.
Uma revelação surpreendente? Nem tanto assim.
A matéria publicada neste domingo (14) na Folha de São Paulo tem pelo menos um grande mérito: joga um facho de luz sobre os corruptores, este polo quase sempre oculto, mas absolutamente fundamentral, no processo de degradação da política brasileira.

sábado, 13 de março de 2010

Dialética dos filhos da Mãe Terra

"A terra foi criada com o auxílio do sol e deveria ser deixada como está... O campo foi feito sem linhas de demarcação e não compete ao homem demarcá-lo... Vejo os brancos por toda a parte buscando riquezas, e vejo que querem nos dar terras sem valor... A terra e eu somos uma coisa só. A medida da terra e a medida de nossos corpos é a mesma. Digam-nos, se puderem, que o Poder do Criador os enviou para falar conosco. Vocês talvez pensem que foram enviados para fazer de nós o que bem entenderem. Se eu achasse que foi o Criador quem os mandou, consentiria que vocês têm direitos sobre mim. Não interpretem mal meus sentimentos de amor à terra. Eu nunca disse que a terra era minha para fazer com ela o que quisesse. O único com direito a dispor da terra é aquele que a criou.
O que exijo é o direito de viver em minha terra e lhes concedo o privilégio de viverem na de vocês."

Hin-mah-too-yah-lat-kekht ou Trovão-das-Alturas-Sublimes-da-Montanha, chefe da orgulhosa tribo dos Nez Percé (Nariz Furado), respondendo à investida do homem branco (Estados Unidos, final do século XIX).

Transcrito de Pés Nus Sobre A Terra Sagrada (L&PM, 3a edição, 1996, p.46).

sexta-feira, 12 de março de 2010

Rastilho de pólvora

Não foi por acaso que o presidente Lula fez de tudo para blindar seu presidente do Banco Central, Henrique Meirelles. É que a qualquer momento poderia vir à luz as muitas suspeitas que rondam a biografia deste que é o queridinho de Wall Street e da plutocracia globalizada.
Entre as medidas adotadas para assegurar a retaguarda do banqueiro, providenciou-se a elevação do status de seu cargo, nivelando-o aos ministros de Estado, para que as eventuais denúncias caíssem no balaio do Supremo Tribunal Federal (STF), em tese mais conservador em suas sentenças.
O sinal de alerta finalmente estrilou: a primeira denúncia, de autoria do Ministério Público Federal (MPF) acaba de aterrissar na mesa do ministro Joaquim Barbosa. Nela, chumbo grosso em estripulias financeiras supostamente cometidas por Meirelles, acusado de crime contra a ordem tributária. Com certeza, negócios na casa de bilhões, como convém àquele que governa, de fato e nem sempre de direito, a economia brasileira há longos sete anos.

Cara de um, focinho do outro

Da guerra de dossiês entre os componentes da atual e da antiga mesa diretora da Câmara de Belém, além do forte odor de malfeitorias, resta uma certeza: os contendores só têm razão quando se atacam e estão irremediavelmente desguarnecidos quando tentam erguer seus precários muros de defesa.

quinta-feira, 11 de março de 2010

Céu de brigadeiro

Eike Batista deu um enorme salto. Para cima, como convém a uma pessoa que cultiva a auto-imagem de vencedor.
Em apenas um ano, ele passou da 61a posição para a 8a no ranking dos mais ricos do mundo.
Segundo a revista Forbes, Batista entrou no seleto grupo dos maiores bilionários do planeta, fazendo companhia para Bill Gates e Carlos Slim, acumulando uma fortuna estimada em US$ 27 bilhões.
Por trás desse impressionante sucesso, histórias obscuras, lances de desconcertante esperteza e uma boa dose de sorte. Até agora, pelo menos. Mas ainda não foi inventado o crime perfeito.

Gigante de pés de barro

A Vale recebeu talvez a maior multa trabalhista de sua história: R$ 300 milhões. E já não era sem tempo. Há anos que esta empresa, que se apresenta como exemplo de responsabilidade socioambiental, recusa pagar como horas trabalhadas o tempo do percurso gasto por seus milhares de empregados para subir a Serra dos Carajás, diariamente.
A sentença, cuja contestação deverá mobilizar um exército de (muito) bem-pagos advogados da empresa, coroa o trabalho corajoso - e tecnicamente irrepreensível - do juiz da Vara do Trabalho de Parauapebas, Jônatas Andrade.

quarta-feira, 10 de março de 2010

A pimenta e o refresco

2009 foi o ano da crise. O desemprego disparou e a recessão rondou ameaçadora, espalhando reflexos do fundo do poço.
Mas, cuidado. De perto, como se sabe, o cenário é muito mais complexo.
Apenas os setores mais dependentes da demanda externa - mineração e siderurgia - sofreram o tranco. Os demais, lépidos e fagueiros, surfaram por sobre a tal marolinha e ainda duplicaram seu lucro líquido.
Já a multidão de trabalhadores jogada no olho da rua não tem nenhum motivo para comemorar.

terça-feira, 9 de março de 2010

Terra em Transe

A pequena cidade de Tracuateua, no nordeste paraense, viveu ontem (8) seu dia de fúria.
Após um caso de latrocínio (roubo seguido de morte) que chocou a cidade, centenas de populares apedrejaram a delegacia do município, dando início a um tumulto que somente foi controlado horas depois.
Resultado: dois jovens foram abatidos a bala. Um deles, com um tiro na cabeça, teve morte instantânea.
Os disparos partiram dos policiais acuados pela multidão que cobrava justiça e localizava nestes funcionários públicos algum grau de responsabilidade pela onda de violência que atemoriza a outrora pacata comunidade.
É evidente - pelo resultado sangrento do conflito - que houve uso excessivo de força. Ao atirar na multidão - e atirar para matar - os policiais foram além da justa legítima defesa e, pelo que se deduz das informações registradas pela imprensa, revelaram-se sem o mínimo preparo para lidar com uma situação explosiva como a que já se delineava desde as primeiras horas do dia.
Houve, muito provavelmente, uma série de erros, de diversos agentes públicos, que deveriam ter previsto a situação e tomado medidas acauteladoras, como o envio de contingentes policiais dos municípios vizinhos ou de tropas especializadas em controle de conflitos de rua. Nestes casos, a regra básica é a utilização de armamento não-letal, que poderia ter evitado a tragédia.
A polícia anuncia que está trabalhando na identificação dos que participaram dos atos de destruição dos bens públicos. Espera-se, da mesma forma, que não se coloque uma pedra em cima do fuzilamento dos dois jovens.
Uma investigação independente e levada a cabo com rigor e técnica é uma exigência elementar para que não se instaure, de uma vez por todas, a famigerada lei da selva.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Vale quanto pesa?

Lula prometeu e não cumpriu.
Até hoje, passados mais de sete anos de governo e incontáveis promessas solenes, nada de sair o decreto atualizando os índices de produtividade do campo, mecanismo essencial para agilizar o processo de desapropriação para fins de reforma agrária.
Dizem que foi a bancada ruralista, boa parte aboletada na base governista no Congresso Nacional, a responsável direta pela implosão da promessa presidencial. Uma meia-verdade. Ou uma meia-mentira.
O principal responsável, o maior de todos, é o próprio presidente. Foi ele e seu governo que se dobraram, submissos, ao que de mais reacionário existe na sociedade brasileira.
Enquanto isso, a desigualdade e a concentração de terra e riqueza não dão tréguas no campo, onde, efetivamente, existe um alentado processo de aumento na produtividade. Diga-se, uma produtividade vinculada às culturas de exportação, o que consolida, segundo os mais recentes dados, o Brasil na terceira posição mundial em termos de exportação de grãos.
Esta é uma verdade incômoda. E perigosa.
O salto de produtividade cobra, entretanto, uma elevada e indigesta conta socioambiental, espetada nas costas das atuais e futuras gerações .
Afinal, a crescente introdução de variedades transgênicas, o contínuo avanço sobre a floresta em pé e a permanência e mesmo a disseminação de práticas trabalhistas retrógradas e indecentes - como aquelas flagradas a rodo em algumas das principais empresas do setor sulco-alcooleiro - revelam a face cruel de um cenário que só é risonho e franco nas páginas da propaganda oficial.

domingo, 7 de março de 2010

Arca do tesouro

Quem quer viajar no tempo?
Sim, então aperte o cinto e dê a partida.
Basta um clique e, num passe de mágica, o leitor-viajante estará na Belém dos Oitocentos.
Mais precisamente, no ano da graça de 1884, e poderá percorrer as ruas e largos de uma cidade que sofria (e se deleitava) com as ferozes dores do crescimento.
Era o início do opulento Ciclo da Borracha, que em poucas décadas iria trazer riqueza (para poucos, é claro), mas muitas transformações no desenho urbano e social desta Paris dos trópicos.
São 12 litografias, verdadeiras joias raras, que concebidas pelo gênio de J. Léon Righini, foram resgatadas pela pertinácia de José Mindlin, que resolveu compartilhar com o povo paraense parte de sua incalculável riqueza. Livros, livros à mão cheia!
Não se intimide com as preciosidades do "Panorama do Pará em Doze Visitas". As janelas do tempo estão abertas, aproveite sem medo e esqueça do cenário atual, com tantas feridas da incúria e do maltrato.
Abra os olhos e veja. Veja como era (e continua sendo) belo o Largo do Palácio, amplo e campestre, vários anos antes que ali se construisse uma elegante praça.
Que seus olhos se percam nos contornos do novo e imponente Theatro de Nossa Senhora da Paz, em suas feições originalíssimas, pontificando a área da Campina, ainda sem qualquer urbanização.
Faça um passeio, ao cair da tarde, na formosa Estrada de São José (atual avenida 16 de novembro), com sua arborização típica da qual quase nada restou. Mas, cuidado: não deixe de olhar com atenção os personagens de carne, osso e tinta que passam por este caminho. A mulher escrava com sua vestimenta colorida trazendo pela mão uma criança, uma menina talvez, cujo futuro (se é que teve algum) esteve sempre marcado pela marca da abjeta escravidão. Terá se tornada uma operária e descoberto o caminho da luta? Ou viverá seus dias imersa nas profundezas da miséria e do abandono?
Aproveite o quanto puder.
Essa Belém da memória pode e deve ser eterna.

sábado, 6 de março de 2010

Dialética da linguagem e seus descaminhos

"PALAVRAS

Veio me dizer que eu desestruturo a linguagem. Eu desestruturo a linguagem? Vejamos: eu estou bem sentado num ligar. Vem uma palavra e tira o lugar de debaixo de mim. Tira o lugar em que eu estava sentado. Eu não fazia nada para que a palavra me desalojasse daquele lugar. E eu nem atrapalhava a passagem ninguém. Ao retirar de debaixo de mim o lugar, eu desaprumei. Ali só havia um grilo com sua flauta de couro. O grilo feridava o silêncio. Os moradores do lugar se queixavam do grilo. Veio uma palavra e retirou o grilo da flauta. Agora eu pergunto: quem desestruturou a linguagem? Fui eu ou foram as palavras? E o lugar que retiraram de debaixo de mim? Não era para terem retirado a mim do lugar? Foram as palavras pois que desestruturam a linguagem. E não eu."

Manoel de Barros (1916), poeta brasileiro. Ensaios fotográficos ( Editora Record, 2000, p.57).

sexta-feira, 5 de março de 2010

A ameaça de quem de cima

Quais são os principais entraves ao avanço da regularização dos territórios dos povos indígenas e das populações remanescentes de quilombos?
Algumas respostas - oportunas e contundentes - na entrevista da antropóloga Daniela Perutti, da Comissão Pró-Índio de São Paulo (CPI-SP), publicada no site da ONG Repórter Brasil.

quinta-feira, 4 de março de 2010

Bola fora

Não queira estar próximo, neste instante, do banqueiro Daniel Dantas. Seu humor só pode estar péssimo - para dizer o mínimo - diante da decisão que 5a Turma do STJ (Superior Tribunal de Justiça), que acaba de manter o juiz Fausto De Sanctis no caso, mandando para o espaço a liminar em um pedido de habeas corpus que há poucos meses havia trancado todo o processo decorrente da Operação Satiagraha.
Com a sentença, aferida por quatro votos a um, a fornalha vai voltar a arder sob o assento de um homem que se imagina acima da lei. E, de fato, vez por outra parece estar mesmo.

A ditadura global

A defesa da liberdade de expressão virou estandarte nas mãos dos proprietários da grande mídia.
Algum desavisado pode até engolir esse discurso oportunista, mas vai estar comprando gato por lebre.
A Rede Globo e suas telenovelas são um bom exemplo de como se dissemina o ódio, o preconceito e uma visão de mundo que interessa apenas aos de cima sem qualquer perspectiva de controle. Aliás, é de controle e fiscalização que os barões da imprensa fogem e se pelam de medo.
Com a palavra, o jornalista e escritor José Arbex.

O caneco é nosso

Campeão mundial, de novo, o Brasil não tem porque comemorar.
Saiba os motivos aqui.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Depois da queda, o coice

O terremoto devastador que abalou o Chile há poucos dias trouxe à luz as profundas fraturas existentes naquela que, no passado, foi uma das mais equilibradas sociedades latino-americanas. A emergência de vastos contingentes populacionais empobrecidos e marginalizados, mantidos fora do circuito do consumo e em posição sempre mais vulnerável diante da tragédia, é apenas um aspecto de uma herança trágica de quase quatro décadas de experimentos neoliberais, desde que La Moneda ardeu sob as bombas dos militares golpistas.
A desestruturação do Estado e um patológico desprezo para com os mais pobres estão na raiz do injustificável abandono de dezenas de milhares de vítimas a sua própria sorte, mais de 72 horas após o grande sismo. A ajuda oficial, que deveria ter sido imediata, sequer chegou a algumas das regiões mais atingidas, como é o caso da cidade de Constitución, no centro do país, onde pereceu, ao menos, a metade das vítimas fatais do desastre.
Esse é o maior combustível para os saques e outros atos de vandalismo que só aumentam a agonia dos que perderam quase tudo e que agora precisam enfrentar a difícil (mas necessária) tarefa de reconstruir a vida feita em pedaços.

Aos pés do oráculo

Está na Folha de São Paulo de hoje (3), sob o sugestivo título: "Em Wall Street, tanto faz quem vencer eleição". Isso mesmo: para os operadores da plutocracia financeira globalizada, Dilma e Serra são mesmo farinha do mesmo saco.
Vejam esta declaração lapidar, que a reportagem atribui a Marc Chandler, chefe de estratégia de moedas da Brown Brothers Harriman: "Talvez um ou outro fator possa chamar a atenção do mercado, mas não há risco de volta a uma política econômica anterior a Fernando Henrique". Desce o pano.
Em outubro, quando se abrirem as urnas, se não se interpuser o inusitado, o Brasil caminha para a sagração da mesmice, muito embora luzes e lantejoulas possam proporcionar a ilusão de que se trate de uma verdadeira e legítima disputa entre contrários.

terça-feira, 2 de março de 2010

Humanos, apenas humanos

Yanomami é um termo criado pelos antropólogos para designar uma das mais importantes populações indígenas no Brasil a partir da palavra yanõmami, que significa "seres humanos". Simples, assim, para marcar a contraposição às demais categorias, como "yaro" (animais de caça),"ya" (seres invisíveis e sem nome) e napë (inimigo, estrangeiro, "branco").
Para este povo, urihi, a "terra-floresta", não se resume a espaço de exploração econômica. Antes, é uma entidade viva, fonte de toda a vida e espaço permanente de trocas entre humanos e não-humanos.
O Instituto Socioambiental (ISA) mantém desde dezembro um interessante espaço virtual abrigado no site Globo Amazônia. Para conhecer mais, clique aqui.

Cheiro de pólvora no ar

O Supremo Tribunal Federal (STF) e seus doutos ministros abrirão aquela corte para um debate fundamental: o país deve ou não manter o regime de cotas raciais nas universidades públicas?
Os debates, reunindo defensores e detratores da medida, promete movimentar o vetusto plenário do STF a partir de amanhã, 3.
Tudo porque o DEM (ex-PFL, ex-PDS, ex-Arena) resolveu utilizar uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) para demolir a política de cotas da Universidade de Brasília.
Justamente os auto-proclamados democratas, que têm no DNA o mais puro sangue dos senhores de escravos, agitam a esfarrapada bandeira de que as cotas serviriam para "ressuscitar" o racismo no Brasil, que talvez, na lógica dos de cima, jamais tenha existindo nas terras de Vera Cruz.
O tratamento desigual dos desiguais, lição tão antiga quanto pouco colocada em prática, contituna gerando escândalo.
Afinal, foi por aqui, no litoral e nos sertões do Brasil colonial, que levas e levas de africanos aportaram, em grilhões, para abastecer a economia, já àquela época, determinada pela lógica ditada de fora e de cima.
Diante da ameaça de retrocesso, não de todo imprevisível tendo em conta as recentes decisões adotadas pela mais importante instância do judiciário brasileiro, não custa recordar um registro recolhido por Vicente Salles (O Negro no Pará sob o regime da escravidão, Belém: IAP/Projeto Raízes, 2005):

"...Esperamos ao bem conhecido zelo da polícia, que mande sem demora alguma, assaltar o dito quilombo, com gente armada de pólvora e bala, fazendo apreender todos os que nele se acharem, destruindo e arrasando para nunca mais ter serventia alguma...".

Pólvora e bala, hoje como ontem, não são apenas recurso retórico. Estão aí, para que ninguém duvide, que a faxina étnica não foi interrompida um segundo sequer, e continua a afogar em sangue as favelas e periferias pobres de todo o Brasil.

Mais, muito mais, do mesmo

Deu no coluna Painel Político, na Folha de São Paulo de hoje:

Cimento 1. Técnicos do TCU apontam indícios de irregularidades graves em cinco obras (quatro delas incluídas no PAC) que não faziam parte da lista divulgada pelo tribunal em setembro do ano passado. Além da paralisação, recomendam a suspensão de pagamentos em duas delas.

Cimento 2. Das cinco obras, as mais importantes são o projeto habitacional Vila da Barca (PA) e o aeroporto de Goiânia (GO). Nos dois casos há suspeita de sobrepreço.


Muito bem. O projeto habitacional da Vila da Barca, para os que não se lembram, é aquele tocado com a marca de Duciomar Costa (PTB), sob o embalo de sua ruinosa administração na capital.

Até aí, diga-se, nenhuma novidade. O estranho seria que não existisse a suspeita de corrupção. Ou, quem sabe, se dessa vez fosse ocorrer a punição dos envolvidos na maracutaia.

segunda-feira, 1 de março de 2010

O guardião

Quem contou esta história foi o próprio José Mindlin (Uma vida entre livros, Edusp/Companhia das Letras, 1997). Com apenas seis meses de vida, em setembro de 1914, ele, seus pais e seus irmãos, quase têm suas vidas ceifadas quando o navio "Voltaire", de bandeira inglesa, foi posto a pique por um barco de guerra alemão na costa do Pará. Era os ecos furiosos da Primeira Grande Guerra. Foi isso que fez o pequeno José, filho de emigrantes russos, aportasse pela primeira vez em Belém do Pará, cidade que ainda vivia seus luminosos tempos da riqueza que o ciclo da borracha propiciava (para poucos, evidentemente).
Ontem, 28, Mindlin encerrou sua longeva existência. Para este amante da cultura, que dedicou sua vida inteira à preservação de verdadeiros monumentos que a inteligência humana criara nos últimos séculos, a morte física está longe de representar um ponto final.
Antes, muito pelo contrário. Foi dele e de sua esposa, falecida em 2006, a iniciativa de doar todo o seu extraordinário acervo de milhares e milhares de livros à Universidade de São Paulo (USP), para a criação da biblioteca Brasiliana, um projeto de vanguarda que está em plena implantação.
Só este gesto já garante sua perenidade. Que sirva de exemplo e de espelho num país tão carente de personalidades desta estatura.

Tudo tem seu preço

2050 pode ser o ano do não-retorno no processo de devastação da Amazônia. A partir deste ponto, segundo estimativas do pesquisador Gilvan Sampaio, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), chegaremos no "dieback", quando parte da floresta entrará em colapso definitivo e irremediável.
Os céticos apontarão o dedo acusador como se não passasse de alarmismo. Enquanto isso, os vértices das queimadas, desmatamentos criminosos e mudanças climáticas vão cavando as bordas do precipício.