As democracias - quase todo mundo crê - são sustentadas pela soberania do voto popular. Alguém duvida? Pois deveria, porque as aparências estão aí mesmo para semear o engano.
Vejamos um caso recente e muito ilustrativo. O povo argentino elegeu, em 2007, Cristina Kischner como sua presidenta. Ela recebeu 44% dos votos numa eleição consagradora. Daí se deduz que cabe principalmente a ela a condução dos assuntos do Estado argentino. Dedução lógica mas imperfeita. Cristina pode quase tudo, ou melhor, pode tudo desde que não resolva governar de fato, alterando os rumos da política monetária e econômica do país, cuja competência exclusiva compete, por decisão de um único e decisivo eleitor, o intangível mercado, ao presidente do Banco Central, "autônomo e independente", como costumam dizer por lá (e também, não por coincidência, por aqui).
O caso da demissão do presidente do BC argentino, por ordem direta da presidenta, e sua imediata recolocação na cadeira por decisão judicial, deveria colocar lenha na fogueira deste debate. Afinal, o que está em jogo é a soberania. Do país (e de seu povo) ou dos deuses que povoam Wall Street e seus múltiplos satélites ao redor do mundo.
A ditadura dos "técnicos", na palavra insuspeita do economista Luiz Carlos Bresser-Pereira, é um fantasma que também nos ronda. Ou será que aqui já se instalou, confortável e tranquilamente, por sobre a supostamente poderosa Esplanada dos Ministérios?
Um comentário:
Meu caro, acontece que o direito constitucional argentino prevê mandato para o presidente do BC. E aí, a presidenta, eleita democraticamente por um sistema constitucionalmente previsto, poderá ir contra a Constituição?
É disso que se trata e que você omite na postagem.
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