domingo, 25 de janeiro de 2009

Dialética da palavra que se faz imagem

"Nuvens

A primeira coisa que guardei na memória foi um vaso de louça vidrada, cheio de pitombas, escondido atrás da porta. Ignoro onde o vi, quando o vi, e se uma parte do caso remoto não desaguasse noutro posterior, julgá-lo-ia sonho. Talvez nem recorde bem do vaso: é possível que a imagem, brilhante e esguia, permaneça por eu a ter comunicado a pessoas que a confirmaram. Assim, não conservo a lembrança de uma alfaia esquisita, mas a reprodução dela, corroborada por indivíduos que lhe fixaram o conteúdo e a forma. De qualquer modo a aparição deve ter sido real. Inculcaram-me nesse tempo a noção de pitombas - e as pitombas serviram para designar todos os objetos esféricos. Depois me explicaram que a generalização era um erro, e isso me pertubou".

Graciliano Ramos (1892-1953), escritor brasileiro. Infância (p.7)

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