sábado, 28 de fevereiro de 2009

Dialética da guerra e de sua fonética da barbárie

"(...)

Caminhamos 1,5 km pelos atracadouros. Há tanques de armazenamento de petróleo queimados e peças de artilharia tomadas do inimigo: a terra e o concreto estão pulverizados, os cadáveres iraquianos jazem na sujeira. Um soldado perdeu a cabeça; outro, os braços. Ambos atingidos por granadas. (...) vejo outro corpo em uma vala de canhão, um jovem em posição fetal, encolhido como uma criança, já preto de morte, mas com uma aliança no dedo. Essa aliança me fascina. Nessa manhã abrasadora e dourada, reluz e cintila com o frescor da vida. O jovem tem uns 25 anos, seu cabelo é preto. Ou deveria dizer "tinha", "era"? Paramos o relógio quando a morte nos surpreende? (...) Torno a olhar para a aliança. Um casamento arranjado ou um enlace por amor? De onde era esse cadáver de soldado? Sunita, xiita, cristão ou curdo? E sua mulher? Não deve estar morto há mais de três dias. Em algum lugar, ao norte, sua acorda acorda as crianças, faz o café-da-manhã, contempla a fotografia de seu marido na parede sem saber que já é viúva e que a aliança de seu marido, tão reluzente de amor por ela nessa esplendorosa manhã, decora um dedo morto."


Robert Fisk. "A grande guerra pela civilização: a conquista do Oriente Médio" (Editora Planeta, 2007, p. 341-342)

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