Gente não morre, fica encantada. 19 de janeiro de 1982, distante 25 anos, eu não conhecia a célebre frase do imortal João Guimarães Rosa. Na verdade, meus horizontes se abriam para um mundo novo, num rito de passagem alucinante onde cada dia era uma descoberta e de adolescente me transformava em militante político, com responsabilidades, em várias ocasiões, muito superiores a minha capacidade de discernir.
Anos rebeldes, agitados, insubmissos. No início dos anos 80 semanas podiam valer por anos e tudo parecia se mover a uma velocidade muito acelerada. A morte – e seus traumas – estava sempre rondando, como um perigo e uma possibilidade. Ela brotava de histórias macabras – a cabeça de Oswaldão decepada e seu corpo puxado por um helicóptero no meio da selva – e poderia estar em cada esquina. Naquela esquina em que, por mais uma vez, cobri um ponto e fui recolhido para a uma reunião clandestina. Esperar o contato, em plena São Paulo, com uma revista VEJA na mão, com aquele mar de gente em volta, parecia prosaico demais, entretanto funcionava e, ao que parecia, de forma eficiente. Codinomes. Destruir as anotações, mas todas mesmo. Seguir adiante, avançar. Retroceder? O que é isso companheiro?
Mundo louco aquele, sem dúvida. A volta para casa de ônibus. 48 horas de estrada, com pouquíssimo dinheiro no bolso, mas com a cabeça fervilhando. Tarefas, planos, compromissos para um militante que já podia se julgar experiente com apenas 18 anos.
Parada obrigatória na fria rodoviária de Anápolis, ao amanhecer daquele dia. O clima parecia diferente, paralisado (talvez esse aspecto tenha vindo depois, com o choque, não sei ao certo). Na primeira banca de revista, um jornal qualquer alardeava: Morreu Elis. A estrela se cala. Li e não acreditei. Aquilo não poderia ser verdade. Oswaldão sem cabeça, o vento solapando a copa das árvores. O frio e a morte, combinados. O medo, espaçoso e invasivo, dominava tudo, onipotente.
Estranho que não imaginava que Elis pudesse morrer. Pelo menos, não tão jovem, tão produtiva, tão linda. Acho que naquele dia – exatamente ali, parado, petrificado diante de um jornal qualquer, envelheci vários anos. A pulso, como se diz.
Há pouco tempo assisti a um especial de TV sobre Elis e essas lembranças todas voltaram com força. Quantos de nós – jovens de mais de 40 – não sentiram o mesmo?
De qualquer forma, hoje é dia de celebrar a sua presença, eterna, aliás, e se deixar levar através do seu sorriso e de sua voz de anjo.
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