De dia ou de noite, pouco importa. A cena sempre se repete: uma legião de crianças e adolescentes, meninos e meninas - aparentando ter menos de 10 anos - vagueia entre os carros que transitam pelo porto do Arapari, da Secretaria de Estado de Transportes, em Barcarena, 50 quilômetros de Belém. Maltrapilhos, descalços, abandonados, vendem qualquer bugiganga, doces ou frutas da região. Esmolam abertamente, como seres invisíveis, sem que suas presenças incômodas cheguem a causar maior constrangimento.
A pouca distância dali, em Abaetetuba, dois meses atrás, o drama da menina L, 15 anos, presa e violentada na delegacia do município, causou forte comoção. Foi um escândalo de alta octonagem política, cujos desdobramentos ainda estão por vir (pelo menos, espera-se que algo realmente aconteça). Entretanto, o drama de L. não foi gerado em apenas um dia. Por quantos meses - talvez anos - ela não terá vagado pelas ruas, praças e portos da região, sem que nenhuma autoridade tenha tomado conhecimento de sua existência?
Nem mesmo após o primeiro delito cometido e a primeira detenção - com o conseqüente rito de passagem ao inferno carcerário - sua condição de criança vítima da barbárie social foi reconhecida. Precisou surgir, em rede nacional de TV, a primeira manchete negativa para causar estupor no berço esplêndido onde parecem dormir aqueles que possuem o dever constitucional de proteger a sociedade e impor o Estado de Direito.
Pergunta-se: o que se espera para agir diante do flagrante desrespeito aos direitos de criança e adolescentes nesse movimentado porto estadual? Certamente que não seja a próxima tragédia.
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